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quinta-feira, 25 de outubro de 2012

HORROR SEM LÓGICA, MAS SATISFAZ COMO SE TIVESSE...

★★★★★★★
Título: V/H/S
Ano: 2012
Gênero: Horror
Classificação: 16 anos
Direção: David Brukner, Glenn McQuaid, Radio Silence, Joe Swanberg, Ti West, Adam Wingard
Elenco: Vários
País: Estados Unidos
Duração: 96 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Sobre uma fita VHS encontrada com diversas gravações estranhas de pessoas diferentes, em situações bizarras e distintas.

O QUE TENHO A DIZER...
Por alguma razão existe uma pessoa que, ainda no século XXI, insiste em passar vídeos para fitas de VHS e não do VHS pro digital. Isso até soaria bacana se no começo do filme um personagem não citasse o YouTube e estragasse com toda essa nostalgia. Mas tudo bem, não há razões para se preocupar.

V/H/S é mais um daqueles filmes de horror modernos de documentários amadores gravados em primeira pessoa, os chamados "found footages" (documentários perdidos, numa tradução coerente), um subgênero de horror que está comum e chato. O filme vem sendo classificado como uma "antologia de horror", justamente por ser uma coleção de vídeos amadores. Ele não tem qualquer senso, não tem história até quando tenta ter, não tem lógica e muito menos coerência. É simplesmente 90 minutos de sequências sem argumentos ou qualquer outra coisa, e talvez isso é o que o salva de qualquer defeito.

Ele foi lançado no Festival de Sundance deste ano nas sessões que ocorrem a partir da meia-noite, sendo muito comentado por quem assistiu e ganhando opiniões mistas, mas positivas em sua maioria.

Os direitos de distribuição nos Estados Unidos foram comprados por quase US$1 milhão, o que fez o filme ser lançado comercialmente em circuito limitado, e agora, com seu lançamento em home video, ele se tornou uma febre. Ainda é inédito no Brasil, mas é fácil encontra-lo em websites de compartilhamento.

A "linha mestre" do filme é a de que o espectador tenha a ilusão de estar  assistindo uma fita VHS contendo diversas gravações, igual quando fazíamos gravando no vídeo-cassete trechos de vários programas e filmes, sem lógica ou ordem alguma, apenas para poder rever aquela cena que gostamos ou aquela parte legal de um programa. Mas, no caso do filme, esta "fita" que assistimos são de seis outras gravações amadoras encontradas que mostram fatos bizarros que aconteceram com pessoas comuns. A seis histórias são:

1. Fita 56: É a história principal, de um grupo de criminosos que são enviados para recuperar uma fita dentro de uma casa aparentemente vazia. É no meio dessa história que as outras também serão mostradas.
2. Noite Amadora: Três amigos alugam um quarto de hotel para levarem garotas, fazerem muito sexo e gravarem tudo, mas uma das garotas que eles acabam levando não parece ser muito normal.
3. Segunda Lua de Mel: Um casal resolve fazer uma viagem sem destino para o Oeste, e passam a ser perseguidos por uma figura estranha.
4. Terça, Dia 17: Quatro amigos vão para o meio da floresta passar o dia e, enquanto filmam, figuras de pessoas mortas começam a aparecer no meio de interferências na gravação.
5. O Triste Fato Que Aconteceu Com Emily Quando Ela Era Jovem: Uma garota acredita que o apartamento onde mora é mal assombrado e todas as noites ela conversa com seu namorado pelo computador, mostrando as coisas que acontecem e que estão a deixando insana.
6. 31/10/1998: É, na verdade, o vídeo que o grupo de criminosos está atrás, que mostra quatro amigos indo para uma festa de Halloween de um estranho e ao chegarem na mansão eles não encontram nada além de um culto obscuro envolvendo o sacrifício de uma jovem no sótão.

A idéia desta "antologia de horror" com certeza é condensar tudo aquilo que os filmes de horror tem de melhor, mas que os diretores e roteiristas extendem tanto para virar um longa metragem, deixando o interessante ficar chato. Portanto a idéia foi basicamente juntar algumas histórias curtas e mostrar apenas aquilo que deve ser mostrado. Seria como ler um livro de contos de Stephen King, ou assistir novamente algum episódio de Contos da Cripta (Tales From The Cryptkeeper) ou Faces da Morte (Faces Of Death, 1978/1981/1985/1990/1995/1996), já que tudo é mostrado sem lenga-lenga, sem blá-blá-blá, sem verborragia ou teoria que justifique alguma coisa. Foi simplesmente ir direto e reto ao ponto, exatamente naquilo que o povo quer ver.

A violência é muitas vezes explícita que o sangue chega a escorrer pela tela, e há muito tempo um filme de horror não me impressionava tanto. A última história talvez seja uma das melhores e sem dúvida sua sequencia final é melhor que muito filme de mansão mal assombrada.

CONCLUSÃO...
Não tem lógica, e nem pode satisfazer como um todo, mas todo mundo vai ter opções suficientes para gostar de ao menos uma história sangrenta. É uma boa coleção de horror que vai pegar muita gente de surpresa, principalmente aquelas que forem assistir achando que é mais uma mesmice. Oferece exatamente tudo aquilo que o público sedento por sangue, tensão e paranormalidade quer ver, sem lógica alguma, mas quem disse que precisa?

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

PARA SACIAR A VONTADE DE QUEM QUER VER...

★★★★★★★
Título: Magic Mike
Ano: 2012
Gênero: Comédia, Drama
Classificação: 14 anos
Direção: Steven Soderbergh
Elenco: Matthew McConaughey, Channing Tatum, Olivia Munn, Alex Pettyfer, Joe Manganiello
País: Estados Unidos
Duração: 110 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Mike é um homem honesto, trabalhador e que gosta de ajudar o próximo. Durante o dia ele trabalha fazendo bicos, e durante a noite ele veste o uniforme de sua verdadeira profissão. Ou melhor, tira o uniforme.

O QUE TENHO A DIZER...
Que Steven Soderbergh é um dos melhores diretores de sua geração, isso é incontestável. Que ele também é arrogante e pretencioso, também.

Faz tempo que ele tenta agradar Hollywood assim como Hollywood agradava ele antigamente, numa época em que Soderbergh podia até sambar numa mesa que seria sucesso de público e crítica. Uma época em que a infame continuação Doze Homens E Outro Segredo (Ocean's 12, 2004) poderia ser só uma reunião de uma seleta panelinha de amigos que queria engordar suas contas bancárias e que todo mundo ia pagar pra ver, mesmo sem roteiro ou história alguma. Já se foi o tempo que todo mundo engolia Soderbergh mesmo assim.

Era o senso comum, e hoje em dia as pessoas parecem estar cansadas dele e escolhendo outros diretores para serem os preferidos da vez.

Faz anos que ele não movimenta para os cinemas nada mais que sua base de fãs e alguns poucos outros que gostam de seu estilo eclético e às vezes redundante. Seus seis últimos filmes, somados, não fecham nem uma média de US$28 milhões de bilheteria, o que é um fracasso perto dos US$100 milhões que ele atingia fácil com títulos como Erin Brockovich (2000) ou Traffic (2000), apenas como alguns exemplos da sua época de ouro. Mas dessa vez ele conseguiu... Com um orçamento de apenas US$7 milhões, o filme arrecadou mais de US$110 milhões no mundo, o que deixou muito marido e namorado ciumento com os nervos à flor da pele.

É do estilo de Soderbergh também surgir cada hora tentando abocanhar um tipo de público, e com Magic Mike ele tenta satisfazer os públicos femino e gay, públicos que ele nunca deu cuidado ou atenção, e que finalmente viraram grandes sifrões em seus olhos para sua salvação.

Seu filme anterior de ação "bate-e-arrebenta", feito especialmente para a lutadora de MMA, Gina Carano, também estrelava Chaning Tatum, e foi durante o período de filmagem de Haywire que o ator já havia demonstrado interesse em levar para as telas uma história envolvendo suas experiências de stripper, já que o ator trabalhou como um no final dos anos 90, em Tampa, na Florida, quando ainda tinha 19 aninhos.

Mas depois da desistência do diretor holandês Nicolas Refn, do filme Drive (2011), o projeto de Tatum parecia não sair tão cedo do papel, até Soderbergh abordá-lo com a ideia de dirigi-lo, com roteiro de Reid Carolin. Prontamente Tatum aceitou ser o produtor, e por isso o filme é uma ficção levemente baseada nas experiências do ator, e não uma biografia, como muita gente acredita. Tanto que o nome artístico que o ator usava como dançarino era Chan Crawford, e Magic Mike é apenas um personagem fictício que nada tem a ver com o ator naquela época, e qualquer outra semelhança será apenas uma leve referência e uma mera coincidência.

É o primeiro roteiro de Reid Carolin, que também faz uma ponta no filme como Paul, o namorado de Brooke (Cody Horn), atriz que por sinal rouba várias das cenas com um misto de Michelle Rodriguez e Eva Mendes. O filme segue muitas das mesmas características que fizeram de outro título um grande sucesso dos anos 90, o independente inglês Ou Tudo Ou Nada (The Full Monty, 1997). Mas claro que, ao contrário do filme dos desempregados que resolvem fazer strip, o maior atrativo de Magic Mike é o jorro de testosterona e os corpos esculturais de Chaning Tatum, Matthew McConauguey, Joe Manganiello e outros dos quais o nome nem importa, atrativos que não existiam no outro título. Também pode relembrar vagamente e de forma muito mais branda as peripécias de Boogie Nights (1997), mas apenas como um tapinha nas costas.

A verdade é que o filme não tem uma grande história, até porque ninguém prestaria atenção nela. Sabendo disso, Soderbergh enche o filme com dezenas de apresentações dos atores em palco, de tudo quanto é forma possível, com cenas de striptease, barrigas trincadas, sexualidade evaporando pelo suor e bundas à mostra para saciar a vontade de quem assiste só por isso (até porque não há outra razão). Tudo isso faz de Magic Mike um filme bacana, sexy e algumas vezes engraçado.

Sem dúvida também é um filme fetichista, sexista e que explora o homem tanto quanto qualquer outro exploraria as mulheres, mas mesmo assim ele não deixa de impor o lado machista e dominador, como que para amenizar a questão de que o homem, apesar de tudo que é mostrado, não é um objeto como são as mulheres. Tudo é mostrado de forma muito glamurosa e fácil, e a luxúria come solta sem qualquer pecado, como se esse mundo fosse sempre muito limpo, organizado, de pessoas muito belas e camaradas, com boa índole e capazes de até pagarem uma dívida de US$10 mil a qualquer estranho que se conheça há 3 meses, esquecendo-se de que este ramo de negócio, em muitos lugares, é uma máfia como qualquer outra. Uma visão bastante idealizada e deturpada de todos aqueles que realmente trabalham no ramo, e não duvido que muito homem terminou o filme pensando que essa fantasia toda seja verdade.

Há um draminha mediano aqui e ali, uma briguinha acá e acola, apenas para dar atenção aos poucos homens heterossexuais que forem obrigados pelas namoradas a assistirem, e também porque quem já conhece o estilo do diretor sabe que ele adora fazer uns rodeios para fingir que seus filmes não são vazios. Mas é aquilo que foi dito, não há qualquer outra intenção de Soderbergh além de uma excelente oportunidade para recolocar seu nome no spot e entregar ao público aquilo que querem ver. O filme estréia dia 2 de Novembro no Brasil, com quase cinco meses de atraso.

CONCLUSÃO...
É um filme divertido e que carrega quem assiste como boa parte dos filmes do diretor, e consegue se salvar de ser um fracasso tal qual foi Striptease (1996), com Demi Moore, porque em nenhum momento o roteiro tenta ser outra coisa. E assim como a melhor interpretação de Gina Carano é nas suas cenas de luta em Haywire, a melhor interpretação de Chaning Tatum é quando ele está no palco, e funciona tanto quanto a de qualquer outro porque ninguém está preocupado em dar uma interpretação melhor que o rebolado.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

OLÁ, AMOR PLATÔNICO...

★★★★★★★
Título: Ruby Sparks: A Namorada Perfeita (Ruby Sparks)
Ano: 2012
Gênero: Comédia, Romance, Drama
Classificação: Livre
Direção: Jonathan Dayton, Valerie Faris
Elenco: Paul Dano, Zoe Kazan, Chris Messina, Elliott Gould, Annete Bening, Antonio Banderas
País: Estados Unidos
Duração: 104 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Um escritor em um bloqueio criativo, depois de ter sonhos com uma personagem, passa a escrever sobre ela com tanto entusiasmo que, apaixonado por sua própria criação, acreditando que ela pudesse amá-lo como ele imagina, se torna real.

O QUE TENHO A DIZER...
Ruby Sparks é dirigido por Jonathan Dayton e Valerie Faris, os mesmos diretores de Pequena Miss Sunshine (Little Miss Sunshine, 2006), e o roteiro é da própria atriz principal, Zoe Kazan, a qual vem de uma família importante na história do cinema de Hollywood. Seu avô era ninguém mais que Elia Kazan, diretor de títulos importantíssimos como A Luz É Para Todos (Gentleman's Agreement, 1947), Um Bonde Chamado Desejo (A Streetcar Named Desire, 1951), Viva Zapata! (1952) e Sindicato de Ladrões (On The Waterfront, 1954), para citar apenas alguns. Seus pais, Nicholas Kazan e Robin Swicord são roteiristas. Por acaso Zoe também é casada na vida real com o ator principal, Paul Dano, com o qual também tem um filho.

O filme começa com um jovem escritor renomado e genial, Calvin (Paul Dano), em um bloqueio criativo. Entre sessões com seu terapeuta, conversas com seu irmão e sonhos com uma estranha garota, sua criatividade volta à tona, criando o seu exemplo de mulher ideal e um amor platônico pela própria personagem. Aos poucos essa imaginação do escritor começa a materializar seus desejos e vontades, e Ruby (Zoe Kazan) se torna real. Porém, Ruby ainda é escrava daquilo que Calvin cria, e Calvin é escravo de seus próprios desejos, e ambos se encontram em uma confusão de vontades onde Ruby não saberá mais quem é, e Calvin não saberá mais qual será o fim da história.

O roteiro embora não seja adaptado e nem biográfico, carrega um pouco do mito de Pigmaleão, criado por Ovídio, em que Pigmaleão era um escultor que se apaixonou por uma de suas estátuas, e o amor se torna real porque a deusa Afrodite, sensibilizada, acaba dando vida a ela. Mas o filme fala mesmo de maneira bastante delicada a respeito de como não estamos prontos para lidar com os outros e, principalmente com o amor, sendo bastante sincero a respeito das pretensões que as pessoas acabam tendo com os sentimentos e as relações. Há um momento no filme em que Ruby diz que um casal deve ter suas vidas individuais, senão viram uma pessoa só. E é o que muitas vezes esquecemos, que o outro não nos pertence, e que o outro não deve existir apenas para nos satisfazer e realizar nossos desejos e fantasias, mas ser um complemento daquilo que não somos sem deixarmos de ser o que somos.

Essa mistura de ficção e realidade e do bloqueio criativo não é um assunto novo. Woody Allen já fez essa mistura de ficção e realidade no filme A Rosa Púrpura do Cairo (The Purple Rose Of Cairo, 1985), em que uma mulher se apaixona pelo personagem de um filme que se torna real. Woody voltou a misturar a ficção com realidade em Meia Noite Em Paris (Midgnight In Paris, 2011), quando um escritor em crise acaba reencontrando personagens reais e fictícios da história. Em 2006 o diretor Marc Forster e o roteirista Zach Helm também trabalharam com o mesmo tema na excelente comédia Mais Estranho Que A Ficção (Stranger Than Fiction, 2006), sobre um homem que descobre ser o personagem de um livro de uma escritora que tem como estilo matar seus personagens principais no fim.

Este filme se enquadra na pequena lista de ótimos filmes que trabalham nessa linha tênue entre a realidade e a fantasia, claro que de uma forma mais despretenciosa e em uma linguagem mais acessível, mas mesmo assim os méritos existem. Zoe Kazan consegue dar equilíbrio entre a comédia, o romance e o drama não apenas no roteiro como também na interpretação, e o mesmo pode ser dito sobre Paul Dano. A direção segue fiel aos elementos que fizeram de Miss Sunshine uma delicadeza de filme, o que novamente se encaixa perfeitamente nesta história simples, mas reflexiva sobre aquilo que queremos e esperamos das pessoas.

CONCLUSÃO...
Não é um filme genial e nem tão original, mas mesmo assim é bem feito e delicado, ponderado na sensibilidade ao refletir sobre nossas espectativas frente às outras pessoas, nossos egoísmos e pretensões.

"JOGOS VORAZES" É UMA FARSA REVOLTANTE!

★★★★★★★
Título: Batalha Real (Batoru Rowaiaru)
Ano: 2000
Gênero: Ação, Aventura, Drama, Horror
Classificação: 16 anos.
Direção: Kinji Fukasaku
Elenco: Tatsuya Fujiwara, Aki Maeda, Taro Yamamoto, Takeshi Kitano, Chiaki Kuriyama
País: Japão
Duração: 114 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Um grupo de alunos de uma sala são escolhidos para enfrentarem uma batalha em uma ilha deserta onde apenas um deverá sobreviver, numa guerra onde os amigos se tornam inimigos e os inimigos não são perdoados.

O QUE TENHO A DIZER...
É muito engraçado comentar sobre esse filme depois de já ter comentado sobre Jogos Vorazes (The Hunger Games, 2012), porque no comentário que fiz sobre o filme americano, lembro que ainda achei interessante certa originalidade em trazer para a modernidade essa batalha similar à de gladiadores na Roma antiga.

Se eu tivesse assistido este filme japonês primeiro, hoje em dia meu comentário sobre Jogos Vorazes seria diferente, e eu diria simplesmente que o livro de Suzanne Collins (cujo roteiro adaptado também é dela) nada mais é que uma cópia descarada e mal feita de Batalha Real, uma encomenda arranjada.

É nessas horas que nós, pobres mortais ignorantes, nos damos conta do quanto somos sucetíveis a qualquer coisa, principalmente no que é produzido por norteamericanos. Pelo nosso contato com a cultura oriental ser praticamente nula, isso facilita sermos enganados por qualquer um que literalmente importe alguma idéia do outro lado do mundo, o que prova que podemos ser enganados por qualquer tolice. Já se diz há algum tempo que não existe mais originalidade, bem como nada se cria, tudo se copia. O grande valor se dá em quão capaz você é de fazer um cópia suficientemente boa para se dizer "parecida", porém diferente o bastante para não ter que pagar direitos da obra ou não ser processado por plágio.

Assim como Jogos Vorazes, Batalha Real também é baseado em um livro homônimo escrito pelo japonês Kaushun Takami. O livro ficou pronto em 1996, mas ele só foi originalmente publicado em 1999, diferente da "obra" de Collins, que foi publicada oito anos depois, ou seja, tempo suficiente que ela teve para estudar a obra de Takami e repaginá-la para dizer que é sua. Até o ano de 2000 o livro de Takami já havia vendido mais de 1 milhão de cópias apenas no Japão, sendo posteriormente traduzido em outras línguas, inclusive o inglês. No mesmo ano de seu lançamento, ele também recebeu uma adaptação em mangá e posteriormente para o cinema, se tornando também uma das maiores bilheterias do país, ficando entre os 10 filmes de maior arrecadação. O filme ganhou uma continuação, Batalha Real: Requiem (Battle Royale II: Requiem, 2003), porém o diretor Kinji Fukasaku morreu pouco tempo depois de iniciar as filmages, e o filme foi terminado por seu filho, Kenta Fukasaku.

Recebido com críticas mistas e muita controversa pelo público justamente por conta do seu tema e da violência explícita com menores de idade, por muito tempo correu o boato de que o filme havia sido banido dos Estados Unidos, o que é mentira. Sua distribuição foi constantemente adiada nos EUA por questões burocráticas da produtora japonesa detentora dos direitos e também por conta do mercado. Há também o boato de que houve um adiamento por conta do massacre de Columbine, já que o tema do filme relembrava bastante este episódio. A distribuição só foi ocorrer porque o filme esporadicamente aparecia nos circuitos de festivais norteamericanos, o que impulsionou a produtora Toei a vender os direitos de distribuição à Anchor Bay, a qual lançou oficialmente o filme em DVD e Blu-Ray em Março deste ano.

Para quem já assistiu  ou leu Jogos Vorazes infelizmente (ou muito felizmente) irá encontrar inúmeras similaridades que irão deixar os novos fãs dessa série de livros de Suzanne Collins um tanto decepcionados. E com razão, pois irão desmascarar que não há uma gota de originalidade em uma obra já tão pobre. A impressão que se tem é que Suzanne apenas traduziu para o ocidente a obra de Kaushun Takami, adicionando elementos mais popopulares e atuais da indústria midiática ocidental numa linguagem acessível e reduzida o suficiente para melhor assimilação do seu público alvo, os adolescentes e adultos jovens.

Mas ao contrário da fraca adaptação cinematográfica da pobre obra de Suzanne Collins, a adaptação de Batalha Real é muito mais madura e crua, como só os japoneses conseguem ser. Além de ser uma forte crítica ao estado totalitário, também critica as demais mudanças do comportamento social que vem acontecendo no Japão nas últimas décadas, um país o qual sua origem cultural é bastante rígida, baseada em preceitos milenares que colocam no topo da hierarquia social os mais velhos, grandes mentores da educação, da moral, dos costumes e da perpetuação da história. Há uma grande preocupação de que a cultura japonesa esteja sendo esquecida e cada vez mais banalizada por conta da facilidade de consumo da cultura descartável ocidental, além da inversão da pirâmide etária, na qual a população idosa está em uma queda inédita na história do país, dando lugar a uma população jovem mais atualizada e menos presa às correntes históricas.

O filme se passa em 1997, e começa com uma turma de estudantes do último ano do segundo grau sendo levados a uma ilha. Eles foram escolhidos dentre 50 turmas iguais de várias escolas, e todo ano uma dessas turmas é escolhida aleatoriamente. Nessa ilha isolada esses jovens são postos em um campo de batalha com uma mochila cada um, contendo suprimentos e uma arma qualquer para a sobrevivência básica. Dentre várias regras e penalidades eles são obrigados a duelarem entre si até apenas um sobreviver. Este "Programa", como é chamado, vem acontecendo desde 1947, sendo um projeto militar para aterrorizar a população e criar uma paranóia coletiva efetiva o bastante para que a população tenha suas atitudes e pensamentos contrários ao governo e a sociedade contidos de todas as formas, sendo uma maneira de também puní-la publicamente sobre seus atos. Este acontecimento anual se torna um evento explorado incansavelmente pela mídia, transformando o sobrevivente de cada ano em uma celebridade instantânea.

O filme é de uma brutalidade chocante, que consegue ser amenizado algumas vezes por conta do exagero clássico dos filmes japoneses nessa engraçada insanidade que eles desenvolvem. Algumas sequências são construídas numa linguagem de mangá, com personagens soltando frases de efeito em situações estáticas. O sangue jorra como água em mangueiras de jardim, tal qual Tarantino reproduziu e homenageou com exaustão em Kill Bill (2003/2004). Mas o clima tenso e desesperador é constante, e mesmo sem ler o livro é possível observar o nível de fidedignidade que o roteirista Kenta Fukasaku tenta manter na adaptação. Talvez o mais chocante do filme seja os dramas reais de cada personagem e como isso influencia suas escolhas, além de perder bastante tempo em mostrar o caos entre cada um deles. O filme peca um pouco na fotografia e numa trilha sonoroa que evidentemente aparece para tornar cenas mais apelativas, o que deixa mais constrangedor do que qualquer outra coisa, mas nem por isso os créditos são diminuídos, principalmente porque agora é possível saber que Jogos Vorazes é uma farsa.

Claro que sempre vai ter alguém que tentará provar o contrário, e mostrar até cinco grandes razões para haver diferença entre as duas obras, mas a realidade é que a essência é a mesma, e as similaridades superam as diferenças que deveriam existir. Além de que, eu também sou da seguinte opinião de que quanto mais você tenta provar o contrário para alguém, mais ela vai querer recusar o que você diz.

CONCLUSÃO...
Para quem ler a sinopse do filme, pode achar que copiei a sinopse do livro de Suzanne Collins por tanta similaridade com Jogos Vorazes. As similaridades são tantas que até o fim surpreende por ser tão parecido, e o engraçado é que grande parte das pessoas (assim como eu) ignoravam o fato de que, ao contrário do que pode parecia, Jogos Vorazes é uma obra com zero originalidade, o que transforma Batalha Real em uma grande obra cruel e adulta, tudo aquilo que Suzanne Collins fez questão de dimiuir pelo bem da cultura ocidental ditada pela mentalidade norteamericana.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

NINGUÉM SABE O QUE FAZER COM ELA, NEM O ROTEIRISTA...

★★★★
Título: Excision
Ano: 2012
Gênero: Drama, Comédia, Horror
Classificação: 16 anos
Direção: Richard Bates Jr.
Elenco: AnnaLynne McCord, Traci Lords, Roger Bart
País: Estados Unidos
Duração: 81 minutos

SOBRE O QUE É O FILME?
Sobre uma adolescente problemática que sofre de delírios e alucinações, e tem a obsessão de se tornar médica.

O QUE TENHO A DIZER...
Excision é o primeiro filme escrito e dirigido por Richard Bates Jr., estrelado por AnnaLynne McCord (a patricinha Naomi Clark, na nova versão do seriado 90210), Tracy Lords e Robert Bart (o George, de Desperate Housewives). Claro que o filme fez parte da seleção especial do Festival de Sundance desse ano, já que é aquele típico filme contraditório que o público desse festival adora, tal qual o filme Sound Of My Voice no ano passado, do qual comentei dois posts atrás. Então quem já conhece esse público que adora cultuar um filme vago sem muitas razões, já poderá imaginar como é este filme.

Ainda é inédito no país e está um pouco popular pela internet. Ao contrário de como o filme vem sendo promovido ou mostrado em websites de compartilhamento de vídeos ou que falam de cinema, o filme não é de terror. Ele é um horror psicodramático com pitadas de humor negro. Complexo, não? Pois você ainda não viu como é a personagem principal...

Pauline é uma adolescente problemática que sofre de delírios e alucinações bizarras e necrófilas, com uma inteligência acima da média. Ela tem comportamentos antissociais e fortes desvios de conduta, o que a faz agir com ofensa, descaso, agressividade e desobediência com outras pessoas, incluindo familiares, exceto sua irmã mais nova e seu pai, já que eles não apresentam nenhuma ameaça. O contrário do que acontece com a mãe, com a qual tem um relacionamento difícil, já que a todo momento tenta podar ou punir Pauline por conta de seus comportamentos subversivos. Por ter sonhos bizarros e frequentes, Pauline desenvolve um quadro perverso e psicótico do qual ela não tem mais controle, além de sua crescente obsessão em se tornar médica para transformar esses sonhos em realidade. A garota não se enquadra em nenhum grupo social, sendo excluída e taxada de "estranha" e "esquisita", mas ela não liga por ser egocêntrica e considerar todas as demais pessoas inferiores. Sua mãe sabe que ela sofre de problemas que podem ser uma ameaça, mas não sabe lidar com a situação, tentando trazer Pauline mais próxima à família e a sociedade de acordo com aquilo que ela vivencia no dia a dia da sociedade, matriculando-a em um curso de etiqueta e levando-a regularmente a um padre conselheiro. Todas essas obrigações e regras faz Pauline detestar sua mãe cada vez mais, e a distância entre elas aumenta.

É um filme tenso, desconfortável, lento e com um final que choca, mas que não deixa esclarecido os motivos da personagem sofrer de tantos problemas psiquiátricos. AnnaLynne McCord desempenha um bom pape e é convincente, embora muitas vezes caricata. Mas quando essa caricatura é deixada de lado, chega a representar uma figura até assustadora, completamente diferente da patricinha manipuladora que ela interpreta em 90210.

O grande problema mesmo é o roteiro, que peca no excesso de embasamento clínico e na falta de objetividade. O roteirista e diretor utiliza inúmeras características de diversas condições psiquiátricas apenas para dar uma exagerada complexidade na personagem e fazer o espectador mais leigo se impressionar fácil, fugindo bastante de uma realidade clínica para aqueles que tem uma visão mais conscientizada dos diversos disturbios existentes. É fato que um doente psiquiátrico normalmente tem um distúrbio principal e que pode desencadear outros, mas no caso dela tudo acontece ao mesmo tempo, num exagero absurdo apenas para justificar o comportamento e a atitude final da personagem, e concluir que ela é uma vítima dela mesma. Tudo acontece de forma gratuita porque não há um aprofundamento a uma condição específica ou a fatores sociais que justificassem a personagem ser tão perturbada em níveis tão graves, ou seja, dá a sensação de que ela nasceu assim, cresceu assim e é assim por que é o que tem que ser.

Durante o filme a personagem diz que sofre de personalidade limítrofe (ou borderline), mas das duas uma: ou ela tirou um sarro (porque perto de tudo que ela sofre um transtorno borderline se torna simples), ou o próprio roteirista não sabia o que estava falando (o que eu acho mais provável).

De qualquer forma, algumas das características de um socipata, um psicótico, um perverso e até mesmo um esquizofrênico estão no filme, fora outras condições. As cenas que representam seus delírios chegam até a ter a intenção de uma beleza surreal, mas não acrescentam muita coisa na história. Coitada da personagem que sofre de tudo o que sofre. Não é à toa que ela é toda errada na história e ninguém sabe o que fazer com ela, nem o roteirista.

CONCLUSÃO...
Podia ter sido um filme bom se tivesse se limitado a uma condição psiquiátrica específica, mas ao invés disso o roteirista e diretor preferiu encher a personagem de problemas e dar pouco fundamento para a existência deles. Embora as cenas de delírio da personagem sejam carregadas em sangue, não é um filme de horror como aparenta, embora o final acabe sendo chocante. Pontos para a atriz, que no meio de uma personagem carregada de problemas e contradições, conseguiu dar conta do recado. Um filme feito mais pra impressionar do que qualquer outra coisa. Esquecível, e até mesmo dispensável.

sábado, 13 de outubro de 2012

LINCOLN SALVANDO A NAÇÃO DA ESCURIDÃO...

★★★★★★★
Título: Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros (Abraham Lincoln: Vampire Hunter)
Ano: 2012
Gênero: Ação, Suspense, Terror
Classificação: 14 anos
Direção: Timur Bekmambetov
Elenco: Benjamim Walker, Dominic Cooper, Mary Elizabeth Winstead, Rufus Sewell, Simmi Simpson.
País: Estados Unidos
Duração: 105 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Abrahan Lincoln foi muito mais do que um presidente dos Estados Unidos, e a história deixou de contar que ele também foi um caçador de vampiros e livrou o país e o mundo da escuridão.
O QUE TENHO A DIZER...
Abraham Lincoln pode ter passado despercebido nos cinemas. Com um orçamento de mais de US$69 milhões, não arrecadou nem a metade nos EUA, mas felizmente arrecadou um total de mais de US$100 milhões no mundo, salvando o filme de um completo fracasso. O interessante é que ele consegue ser melhor do que muitos filmes de ação sangrentos que pipocaram em 2011 e 2012, mas talvez o excesso de produções esquecíveis com protagonistas vampiros tem deixado o público mais atual desinsteressado.
Lincoln é um dos mais importantes presidentes dos Estados Unidos, se não for o mais importante e o mais relembrado, sendo citado incansavelmente em músicas, filmes, desenhos animados e até histórias em quadrinhos. Agora resolveram transformá-lo em um personagem de ficção num mash-up entre realidade e fantasia que pode não ser muito convincente, mas que de certa forma ajuda relembrar a importância desta figura na cultura norteamericana e a promover sua imagem de grande herói nacional numa época em que os Estados Unidos apenas exporta personagens patéticos, sejam eles reais ou fictícios, sofrendo amargamente com a falta de um grande representante da nação que possa promover o país e sua falsa hegemonia com a efetividade que faziam antigamente.
A história começa com Abraham Lincoln ainda criança, vendo sua mãe, Nancy Lincoln, morrer em delírio após ser mordida por um vampiro. Lincoln (Benjamin Walker) cresce fissurado na idéia de se vingar do vampiro assassino, até encontrar a oportunidade de matá-lo. Numa tentativa frustrada, Abraham é quase morto, sendo salvo pelo misterioso Henry Sturges (Dominic Cooper). Henry se propõe a ensinar Abraham a lutar e a matar vampiros, desde que ele siga determinadas regras como: não ter amigos, não se apaixonar, não fazer tudo por vingança, e apenas matar as pessoas que Henry designar. Claro que Abraham aceita as condições, mas não segue nenhuma regra, e acaba se apaixonando por Mary Todd (Mary Elizabeth Winstead), a grande companheira da vida do herói e presidente. E assim ele segue sua saga de caçador.
Claro que o filme não vai se atentar a detalhes históricos, mas até que o roteirista Seth Grahame-Smith (e também autor do livro em que o filme é baseado), dá boas pinceladas em alguns fatos como o auto-didatismo de Lincoln, a importância de sua formação em direito na carreira política, a amizade real com Joshua Speed, o debate entre ele e seu rival Stephen Douglas, o movimento social de Lincoln contra a escravatura, a Guerra Civil e sua ascenção à presidência.
Como um filme de ação e horror, ele funciona muitas vezes. A trilha sonora e a fotografia são sombrias e sujas. Os vampiros tem uma caricatura mais assustadora e bizarra, diferente de apenas aquela palidez cadavérica e olhos vermelhos de True Blood ou Saga Crepúsculo. Eles assustam como vampiros costumavam a assustar antigamente, agindo como monstros esfomiados, sugadores de sangue que pulam prontos para cravar as unhas e os dentes como predadores primatas.
Lembro que quando era criança fiquei noites sem dormir depois de ver a transformação da personagem Amy Peterson em vampira no filme A Hora do Espanto (Fright Night, 1985), e isso ficou marcado na minha memória como uma marca de gado. Os vampiros do filme são parecidos com essa imagem de Amy na minha memória, então toda vez que eles apareciam era como se um gatilho fosse apertado no meu cérebro, e talvez por isso eu tenha ficado surpreendido com eles.
Aqui os vampiros podem andar no sol, porque eles usam protetores solares. Tudo bem que os protetores solares surgiram no século XX, e não no final do século XIX, período em que a história do filme se passa, mas se Abraham Lincoln virou caçador de vampiros, porque não protetores solares já existirem em 1800, não é? Mas uma coisa que me irrita profundamente é essa constante mania de filmes que se passam em períodos muito anteriores mostrarem cenas de ação com técnicas de lutas modernas, como acontecem nesse filme. Que Abraham Lincoln era um lenhador, isso é fato e não ficção, e foi muito interessante ter mantido o machado como uma arma de caça porque eram instrumentos improvisados assim que eles usavam em revoltas armadas além das armas de fogo, principalmente o povo de classes mais pobres. E deveriam ter parado por aí porque nessa época, nos Estados Unidos, ninguém sabia outras formas de luta além de murro, paulada, ponta pé e tiro ao alvo, principalmente na região mais central e sul do país. As cenas de ação são bem feitas, num jogo entre câmera lenta e rápida que ficam bem ágeis no contexto, mas se eles perderam tanto tempo realizando coreografias modernas de luta, podiam ter elaborado algo mais mais rústico e ainda interessante ao invés de voadoras e pulos de ginasta só pra impressionar.
O melhor do filme é que não tem muita encheção de lingüiça e aquela coisa de "temos que nos armar até os dentes para matar o chefe dos vampiros". Todo mundo morre na hora que tem que morrer e também não tem cena de sentimentalismo barato com trilha sonora chorosa só pra insistir na idéia de que Abraham Lincoln era um homem louvável. Tim Burton assina a produção, o que eleva um pouco o nível e acrescenta aquela pitada de sarcasmo que todo mundo gosta. Dá umas escorregadas quando Lincoln envelhece, porque no livro a história se extende até sua morte, mas no filme não funciona muito bem.
CONCLUSÃO...
Merece ser assistido porque tem tudo aquilo que alguém espera em um filme de ação, entretém, assusta e prende atenção, mesmo tendo mantido muitos dos clichés que o impedem de ser um diferencial tal qual enfiar uma figura historica norteamericana em uma situação bastante fictícia. Mesmo assim é muito melhor que muitas produções do gênero, mas parece que as pessoas ultimamente tem preferido o que é pior.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

É VERDADE... É MENTIRA...

★★★★★
Título: Sound Of My Voice
Ano: 2011
Gênero: Drama, Suspense, Ficção
Classificação: 14 anos
Direção: Zal Batmanglij
Elenco: Christopher Denham, Nicole Vicius, Brit Marling
País: Estados Unidos
Duração: 85 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Um casal de jornalistas resolve se infiltrar em um culto onde a líder afirma ter vindo do futuro, e coletar material suficiente para a produção de um documentário.
O QUE TENHO A DIZER...
É o primeiro filme dirigido por Zal Batmanglij, e também um dos dois primeiros escritos pela atriz/roteirista/produtora e amiga pessoal, Brit Marling. O filme ainda permanece inédito no Brasil (tanto em cinema quanto em home video), mas como sempre, isso hoje em dia não é mais um fator limitante pra quem se interessa por títulos que fogem do convencional, mas não encontram distribuidoras no país.
A biografia de Brit Marling é interessante. Ela é formada em economia e chegou a receber uma proposta de emprego na Goldman Sachs, uma grande firma de investimentos e seguros norteamericana, mas resolveu se dedicar a arte. Mudou-se para Los Angeles para investir na carreira de atriz e enquanto explorava e estudava a indústria cinematográfica acabou recebendo inúmeras propostas para ser estrela de filmes de terror adolescente. Cansada disso, resolveu fazer tudo a sua própria maneira e segurar as rédeas com as próprias mãos, escrevendo seus próprios filmes para que ela tivesse oportunidade de interpretar papéis melhores. Isso resultou em dois filmes: Sound Of My Voice e A Outra Terra (Another Earth, 2011), ambos filmados ao mesmo tempo. Durante o dia ela filmava A Outra Terra, e  a noite filmava Sound Of My Voice. Hoje, aos 29 anos, Brit Marling é um nome promissor, e o terceiro filme em que assina o roteiro, produz e atua (novamente em parceria com Zal Bamanglij na direção), chamado The East, está em fase de pósprodução, com um elenco que inclui nomes de peso como Alexander Sakrsgard (o Eric, de True Blood), Ellen Page (de Juno, 2007) e Julia Ormond (de Sete Dias Com Marilyn, 2011).
Seus dois primeiros filmes foram lançados simultaneamente no Festival de Sundance de 2011, o que gerou bastante comentário e ajudou Sound Of My Voice ser um hit no festival. Como de praxe, todo ano o público de Sundance elege sem muitos parâmetros um filme para ser cult, gerando comentários sobre algum título que nem precisa ser bom, mas que acaba despertando o interesse de muita gente. Igual acidente de carro: nunca é bom, mas o barulho faz todo mundo parar pra ver. E é exatamente o que acontece com este filme, que vem colhendo um sucesso de crítica discreto por conta dessa poeira erguida por este festival do ano passado e por outros como South by Southwest e Festival Internacional de Palm Springs.
Conta a história de um casal de jornalistas Lorna (Nicole Vicius) e Peter (Christopher Denham) que se infiltram em um culto para desmistificá-lo e usar isso como material para um documentário. O grupo se encontra secretamente em um porão para seguir uma líder, Maggie (Brit Marling), que afirma ter vindo do futuro para alertar os homens de seus próprios perigos e fracassos. Essa líder, que aparentemente sofre de algum tipo de doença, vive em um porão porque deve evitar o contato direto com o mundo externo e atual, diferente da época em que veio, o que a deixa mais vulnerável a contágios e infecções. Isso é o que ela diz. Por isso, a cada encontro, os membros do culto devem se higienizar por completo e usar roupas que um ajudante pessoal da líder dispõe. Para não ser encontrada facilmente e questionada pelas suas ações, esses membros também são levados até ela de mãos atadas e olhos vendados num processo que os impeçam saber o caminho. Maggie utiliza seus dons de persuasão para adquirir a confiança de todos e fazê-los acreditar que tudo que ela diz é verdadeiro e deve ser aceito sem questionamento. No decorrer dos dias Lorna desconfia que a líder seja perigosa, já que ela obriga Peter a levar uma criança até ela, afirmando que essa criança seja sua mãe. Lorna, então, é abordada por uma mulher que se apresenta como uma agente da CIA que investiga o paradeiro da "falsa" guru procurada por encabeçar um grupo criminoso, e que o que ela está fazendo é recrutando um novo grupo para um futuro golpe.

Tudo começa de maneira interessante e naquele estilo de filmagem já comum nos filmes independentes da construção de uma experiência próxima e pessoal, revelando aos poucos fatos e situações para que essa dúvida seja transformada em mistério e mantida até o final. Apesar de deixar a história suspensa por todo o tempo, é difícil classificá-lo em um gênero. Pode ser um drama, já que lida com relações pessoais, questionando o tempo todo o poder de persuasão, a confiança e a esperança que as pessoas alimentam e desenvolvem, além da necessidade que algumas sentem em serem lideradas e guiadas para amenizarem suas confusões e falta de perspectivas. Brit Marling e Zal Batmanglij também disseram que o filme é uma ficção científica, já que ele lida com a possibilidade da viagem no tempo e o confronto entre fé e ciência, mas ao mesmo tempo ele também é um suspense, já que tudo que é mostrado também é duvidoso.
É dividido em partes sem lógica alguma. Parece que, a princípio, ele foi rodado para ser veiculado na internet em pequenos episódios, mas a Fox Searchlight resolveu juntar tudo em uma coisa só ao comprar os direitos. É bem atuado e algumas vezes consegue ser convincente. O grande trunfo do filme é dar a possibilidade da livre interpretação, seja vendo pelo lado de que tudo é uma fraude, seja vendo pelo lado de que tudo seja real. Mas para quem prestar bastante atenção perceberá que tudo tende a converger para uma farsa, e que a guru realmente é uma criminosa que meticulosamente pretende recrutar pessoas através da confiança e da persuação para um provavel golpe criminoso. Por isso que algumas cenas que podem parecer não fazer sentido no começo, mas farão no final.

O grande problema que acaba atrapalhando bastante é a quantidade de informações que levam a lugar nenhum, deixando muitas perguntas sem respostas por conta de pistas falsas e situações sem contexto. Poderia ter sido um excelente episódio piloto de um seriado se ele não fosse um filme, e poderia ter sido um excelente filme se não fosse tão redundante. De qualquer forma é um trabalho independente e interessante para ser assistido dessa forma e pelos esforços dos roteiristas de manter tudo numa linha segura entre a dúvida e a certeza, mas não é algo digno de ter recebido tanta atenção em um festival como o de Sundance, e não é um filme que sobreviverá sozinho por muito tempo até mesmo entre o público mais alternativo.
CONCLUSÃO...
É um filme independente, estranho e interessante, mas nada que surpreenda. Apenas ergue alguns questionamentos e inúmeras dúvidas que dão liberdade de interpretação, mas que no fim não concluem nada e nem ajudam a concluir coisa alguma. Por ser um filme relativamente curto, não cansa, terminando na hora certa.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

TODO RELACIONAMENTO É IGUAL...

★★★★★★★
Título: Entre O Amor E A Paixão (Take This Waltz)
Ano: 2011
Gênero: Comédia, Romance, Drama
Classificação: 14 anos
Direção: Sarah Polley
Elenco: Michelle Williams, Seth Rogen, Luke Kirby, Sarah Silverman
País: Canadá, Espanha, Japão
Duração: 116 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Sobre uma mulher conturbada entre satisfazer suas vontades dentro de um casamento estagnado e até feliz, mas que sobrevive apenas pelo companheirismo e amizade. Tudo muda quando ela conhece e se apaixona pelo seu vizinho, mas por respeito ao seu marido e ao casamento de 5 anos, ela opta por limitar e adiar essa relação até as últimas conseqüencias.

O QUE TENHO A DIZER...
É o segundo filme dirigido, escrito e produzido pela também atriz canadense Sarah Polley. Seu filme anterior, Longe Dela (Away From Her, 2006), foi uma história delicada e extremamente esclarecedora a respeito de um homem que todo dia tenta manter viva as lembranças de sua mulher com Alzheimer e se encontra na difícil situação de reconquistá-la novamente quando a doença avança ao ponto dela não reconhecer mais quem é ele. O filme merecidamente recebeu duas indicações ao Oscar, de Melhor Roteiro Adaptado para Sarah Polley, e Melhor Atriz para Julie Christie. De lá pra cá Sarah trabalhou mais como atriz em filmes pequenos e seriados de televisão. Sarah é um tipo de artista que prefere esses tipos de trabalhos mais modestos e parece não se importar muito com fama e sucesso, talvez essa seja a razão dela ser tão respeitada e ter conquistado uma grande legião de fãs.

Entre O Amor e a Paixão é uma comédia romântica e dramática bastante sincera e honesta que discute com leveza as dificuldades da rotina de um casamento, além das transformações e consequências que essa relação sofre ao longo do tempo. Sarah coloca o sexo como a situação limítrofe dessa discussão e a perda da atração física e sexual que é substituída pelo companheirismo e amizade ao longo do tempo, onde pouco a pouco a relação intensa, de extrema intimidade e conexão, passa a ser ocupada por uma conveniência do dia a dia, como um costume e dependência.

Assim como seu filme anterior, a narrativa novamente é linear e lenta, nos dando uma noção bastante real de passagem de tempo e da condição rotineira dos personagens Margot (Michelle Williams) e Lou (Seth Rogen). Tudo muda quando Daniel (Luke Kirby) a conhece em um avião e ambos ficam encantados com a habilidade de satisfazer um ao outro com tão pouco. A vida de Margot estava tão comum que ela nunca percebeu que Daniel, por coincidência, também é seu novo vizinho que mora do outro lado da rua.

Os encontros entre ela e o vizinho, que a princípio ocorrem por coincidências da rotina de ambos, passa a ser algo proposital e regular. Sem querer os dois se veem apaixonados um pelo outro, numa relação amorosa baseada apenas em desejos e expectativas criadas pelas conversas, passeios e contatos sexuais imaginários, já que, para Margot, a traição só existiria a partir do momento que esse limite fosse ultrapassado. Até então, para ela, a situação platônica de ambos era apenas uma coisa nova em sua vida e que lhe desse novos estímulos em seu casamento. Para Daniel o sofrimento é maior, pois ele respeita a vontade de Margot, e a impossibilidade de tê-la da maneira como ele quer e imagina o deixa cada vez mais frustrado e deprimido.

Margot não consegue tirar o seu casamento da zona de conforto que se estagnou e quer desesperadamente novas sensações que reacendam a empolgação de uma paixão que nela se apagou há muito tempo. Em uma situação extrema e desesperada ela finalmente vê em Daniel a oportunidade de se satisfazer por completo com novas experiências amorosas e sexuais, cheia de amizade e companheirismo, e tudo aquilo q ela não tem mais com seu marido, mas não consegue se entregar por estar presa a uma conveniência chamada casamento, o que a bloqueia e a deixa em um meio termo que a apavora. Daniel, cansado da obsessão de querer algo que nunca poderá ter, faz uma escolha necessária para que ele consiga tocar sua vida pra frente. Margot se desespera com a perda de Daniel e Lou descobre os desejos ocultos de sua mulher e compreende tudo aquilo como uma verdadeira traição e o fim da relação é inevitável para os dois.

A maneira como a diretora e roteirista mostra a diferente situação de Margot com cada um deles talvez seja o ponto mais alto do roteiro, pois ela questiona o tempo todo o que é de fato a infidelidade. É o contato ou a presença? O sexo ou o pensamento? A realização ou a vontade? Portanto esse conflito real é discutido o tempo todo através das atitudes da personagem principal, e o roteiro pontua com bastante exatidão esse paradoxo da sexualidade e do sentimento, da emoção e da racionalidade. Para Sarah Polley a infidelidade se caracteriza muito mais pelo sentimento do que por uma simples satisfação sexual e isso fica evidente quando Lou finalmente descobre o desejo alimentado por sua mulher, os sonhos, as vontades e o pensamento constante de Margot em Daniel, significando uma situação muito mais frustrante para ele do que se tivesse sido uma mera realização sexual, o contrário do que Margot pensava.

É um filme que poderia ser denso se não tivesse alguns fatores que aliviassem isso, como os núcleos cômicos, o figurino e fotografia que exageram nas estampas, nas cores quentes e alegres, e na leveza com que a temática é conduzida. Michelle Williams tem se especializado em personagens que sofrem de depressões amorosas crônicas desde o seriado Dawson's Creek, e para quem também já está familiarizado com esses tipos em seus filmes anteriores, como em O Segredo de Brokeback Mountain (Brokeback Mountain, 2005) e Namorados Para Sempre (Blue Valentine, 2010), não vai encontrar nesse filme uma interpretação muito diferente. Existe aqui uma tentativa da personagem ser um pouco mais cômica, mas a atriz não consegue variar muito bem entre esses dois estilos conforme o roteiro exige, o que muitas vezes passa a ligeira impressão de uma mera reprise dos papéis anteriores que ela já interpretou, já que aquele semblante depressivo, inchado e corado de quem vai cair no choro a qualquer momento é o mesmo. Michelle é uma atriz carismática, mas está longe de conseguir ser engraçada, mas nada disso diminui sua competência, só aparenta estar deslocada. Seth Rogen, que é muito mais um comediante do que um ator dramático (e muitas vezes irritante em alguns papéis por exagerar no pastelão) consegue dar variações muito melhores e mais eficientes do que ela dentro do contexto do filme.

Algumas sequencias banais e desnecessárias, como o exagero de cenas de nudez, de intimidade das personagens e algumas de sexo, acabam não tendo muito valor além da tentativa da diretora de soar realista e rotineira de uma forma que não se encaixa. As cenas chocam sem motivo, e também assustam porque aparece em momentos inesperados. Por ser mais um filme de desenvolvimento lento, muita gente pode não gostar ou não entender, mas por outro lado deveria estar na lista de filmes obrigatórios para casais que não sabem por onde começar uma discussão sobre o tema que ele propõe, e também para os casais seguros que já sabem que o amor, o companheirismo e a amizade são muito mais importantes do que qualquer nova aventura que não leva a lugar algum além da satisfação de vontades e prazeres que acabam com o tempo. O fato é que a acomodação e a rotina são inevitáveis, e todo relacionamento tende a esfriar com o tempo e se manter num platô seguro. A sequencia final do filme mostra exatamente isso, e por sinal é uma das sequências mais belas, poéticas e certeiras do filme, que mostra como o amor é bonito, mas confuso.

CONCLUSÃO...
Um filme tipicamente feminino, que lida muito mais com as emoções do que os prazeres imediatos, questionando muito o significado da infidelidade. Ele se perde um pouco com algumas sequencias desnecessárias, e o desenvolvimento lento pode deixar a desejar para alguns, mas a importância do tema se encaixa para qualquer pessoa que goste de filmes que se embasam em discussões simples e contraditórias. De qualquer forma, querendo ou não é um filme fácil de se identificar porque são situações que se repetem com todos porque todo relacionamento é igual, a diferença está na maneira como as pessoas conduzem.

sábado, 6 de outubro de 2012

SÓ DEUS PRA SABER O QUE SE PASSA NA CABEÇA DELE...

★★★★★★★★
Título: Cosmopolis
Ano: 2012
Gênero: Drama, Suspense
Classificação: 16 anos
Direção: David Cronemberg
Elenco: Robert Pattinson, Sarah Gadon, Kevin Durand, Juliette Binoche, Samantha Morton, Paul Giamatti
País: França, Canadá, Portugual, Itália
Duração: 109 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Eric Packer é um multimilhonário que, através da sua limosine luxuosa e tecnológica, atravessa Manhattan para cortar o cabelo. Mas vários acontecimentos interceptam sua tragetória, como a visita do presidente dos EUA em Nova York, uma revolta anti-capitalista que toma conta das principais ruas, o assassinato de uma figura pública em rede nacional, e vários outras pessoas que aos poucos revelam que seu mundo magnífico de poder se transforma em ruínas a cada novo segundo.

O QUE TENHO A DIZER...
David Cronemberg sempre foi considerado um diretor controverso e que já explorou diversos gêneros cinematográficos (ele começou com o horror e depois foi mesclando esse gênero com a ficção, o suspense psicológico e o drama até alcançar um estilo próprio e irreprodutível), mas sua especialidade é chegar no limite do bizarro e colocar seus personagens como cobaias de experimentos frente a diferentes níveis de perversão. E quando falo de perversão digo no seu mais profundo sentido sexual e patológico, já que seus filmes sempre foram recheados de filosofias psicoterapeuticas, analíticas e até freudianas, como nos títulos Videodrome (1983), A Mosca (The Fly, 1986), Gêmeos (Dead Ringers, 1988), M. Butterfly (1993), Crash (1996), eXistenZ (1999), dentre muitos outros (senão todos).

Cronemberg, nascido no Canadá, nunca se preocupou com a fama e sempre recusou grandes produções por acreditar que os grandes estúdios são responsáveis por destruir grandes idéias. Ele sempre foi fiel a este pensamento, sendo um tipo de pessoa que costuma transformar uma atualidade aparentemente banal em algo a ser observado de perto e que, no fim das contas, é mais importante do que imaginamos. Sem dúvida ele sempre foi tido como um diretor muitas vezes incompreendido e às vezes difícil, tanto é que a frase "só Deus sabe o que se passa na cabeça de Cronemberg" é uma das primeiras coisas que quem conhece o seu estilo pensa. Seu visionarismo é tão amplo que seus filmes conseguem ser únicos ao ponto dele ser, dentre os diretores vivos mais cultuados, o único com o maior número de títulos considerados clássicos, filmes que se tornaram referência e com temáticas que sobrevivem ao tempo e às discussões.

Nos últimos anos ele tem se dedicado a filmes com construção mais lenta e realista, ainda bastante metafóricos, mas mais acessíveis. Mesmo assim, não deixaram de ser aclamados pela crítica, como os violentos Marcas da Violência (A Story Of Violence, 2005) e Senhores do Crime (Eastern Promises, 2007), e o penúltimo Um Método Perigoso (A Dangerous Method, 2011). Cosmopolis é mais um produto dessa sua safra menos bizarra.

Claro que ele mantém todas as características que o resgistraram ao longo das décadas: a câmera estática com angulações diagonais e incômodas, que intensificam a perturbação de idéias, discussões, austeridade e imposição; a fotografia pálida e monocromática; a tecnologia mais uma vez atuando como uma extensão do corpo humano; o medo das pessoas frente às transformações e mudanças; as atuações sutis e mecânicas dos atores; maquiagem, figurinos e cabelos artificiais, numa beleza sempre vulgar, como se todos fossem bonecos de uma vitrine barata; e, claro, a dificuldade do ser humano de lidar com ele próprio. Tudo isso faz parte de um único conceito para Cronemberg, a de que o ser humano caminha sempre para sua autodestruição.

Uma das grandes sacadas do diretor foi ter colocado Robert Pattinson para viver o personagem principal, e aquilo que poderia ter sido um grande desastre se transformou, talvez, no grande trunfo.

Pattinson não é um ator, ele é um mero produto hollywoodiano fabricado para satisfazer o desejo sexual adolescente e ser um ícone de sua geração que será lembrado no futuro como um mero objeto e nada mais, por mais que ele se esforce para tentar o contrário. Quem já assistiu alguns de seus outros filmes sabe o quanto ele desperdiça as oportunidades com suas expressões limitadas, suas caretas fora de hora e um inútil balançar de pescoço e cabeça na tentativa de dar algum tom teatral na cena. Fora os diálogos sempre monotônicos, sem qualquer carga de improviso cênico, típicos de atores amadores de teatro escolar. Ele é um ator tão ruim que chega a ser constrangedor, e se torna evidente que a escolha de Cronemberg se dá por conta de todas essas limitações somatizadas à arrogância natural que o ator carrega em sua imagem de playboy contemporâneo, despertando uma antipatia quase que imediata e inevitável do espectador.

Os paralelos entre o ator e o personagem são vastos, e até mesmo quem não suporta Robert Pattinson (como eu) irá absorver melhor o filme e ter uma experiência muito mais interessante se assisti-lo com esse ponto de vista irônico e - muitas vezes - sarcástico que o diretor aparentemente propõe. Pode não ter sido a intenção de Cronemberg fazer isso, mas não consigo tirar da cabeça que um diretor tão inteligente e que sempre primou em trabalhar com atores experientes e ousados tivesse aceito um ator fraco e indiferente apenas pela popularidade, até porque Cronemberg também nunca se importou com isso. A princípio, era para Colin Farrel interpretar o personagem principal, outro ator que também consegue atingir altos níveis de antipatia com o público quando quer. A diferença é que Colin é um bom ator e que sabe articular muito bem dentro daquilo que um diretor visualiza e propõe. Mas para esse filme, Cronemberg parece ter se interessado mais em uma figura real do que em uma interpretada. E frente a esse detalhe é que minha teoria se conclui.

Portanto, Pattinson veste o personagem Eric Packer como uma luva. Não há esforços para ele ser o personagem, da mesma forma como também é evidente que não há esforços de Cronemberg em dirigí-lo. Cronemberg inteligentemente deixa Pattinson ser ele mesmo, pois os defeitos natos do ator são as características fundamentais do personagem. O apelo sexual vazio e insosso que Pattinson desperta são essenciais para a jornada de Eric Packer durante sua longa e lenta migração em Manhattan para um simples corte de cabelo e sua decadência. Essa inconveniência do ator e do personagem já causa desconforto logo na primeira cena, depois de uma abertura simples com a trilha sonora de Howard Shore (longo colaborador do diretor), que mexe com a sensibilidade humana logo de cara, num misto de motivação, medo e angústia. A imensa fortuna e austera arrogância de Eric são tão grandes que ele acredita ser um homem detentor do poder em suas mãos, tal qual a imagem de Pattinson depois da fama. Ele nem ao menos olha para seus empregados enquanto conversa com eles.

O filme é claramente uma crítica ao capitalismo, às grandes diferenças de classes e a dentenção do poder nas mãos de poucos, mas tudo isso é feito de maneira refinada e nada panfletária, apenas através dos exageros e exacerbações do personagem principal e dos demais que cruzam seu caminho. Sua limosine acaba sendo nada mais do que uma representação do alcançável e inalcançável. Para ele é fácil abrir a porta e caminhar entre as pessoas, mas apenas algumas pessoas podem chegar até ele. A facilidade com que ele pode se relacionar e conseguir o que quer e no momento que quiser por conta de sua inesgotável fonte de dinheiro e poder o torna obsessivo com aquilo que não consegue ou não tem controle, como uma capela que não está a venda, sua recém esposa que recusa ter relações sexuais com ele, sua saúde e o medo da morte prematura. Conforme o dia passa e ele atravessa Manhattan, a valorização do Yen faz com que ele perca grandes quantias de dinheiro que também será responsável por sua queda e destruição. Óbvio que conforme sua queda se mostra cada vez mais íngreme, mais forte ele pretende se chocar no fim.

Qualquer comparação do filme com a atual situação econômica norte-americana não será mera coincidência. O livro ao qual o filme foi baseado, escrito por Don DeLillo, foi originalmente publicado em 2003, época em que a economia norte-americana começou a apresentar "discretos" sinais de socorro. Por conta disso o filme também tem sido comparado a diversas situações atuais que incluem a desvalorização do dólar e a silenciosa contenção desse naufrágio econômico que é um desastre para alguns e uma fabulosa oportunidade para economias emergentes.

É um filme frio e insensível, inteiramente justificado na capacidade do ser humano de se coisificar e diminuir o seu valor tal qual uma nota de papel, e acreditar que isso faz deles soberanos de algo que foi criado e não existe, mas é constantemente alimentado por uma ilusão coletiva. O final do filme pode parecer frustrante, mas metaforicamente é uma dúvida real que respiramos.

É um Cronemberg diferente e mais linear, mas nem por isso deixa de ser Cronemberg. Não é algo comum que pode ser reduzido simplesmente a um gostar ou não gostar, portanto, se alguém disser que o filme é ruim é porque não o entendeu, e se disser que adorou é porque vai querer pagar de intelectual. A grande verdade é que Cosmopolis é um filme discutível, aquele para ser assistido, seriamente refletido e discutido porque ele tem material em abundância para isso. É lento e também testa a paciência de muita gente, sendo bastante chato e massante para aqueles que não conhecem o diretor, e pior ainda para aqueles que não entenderem do que o filme se trata. Tanto é assim que ele não foi muito bem aceito no Festival de Cannes, onde estreiou, e muita gente tem deixado o cinema no meio do filme. Mas isso é o Cronemberg provocativo de sempre, por isso que seus filmes são para poucas... bem poucas pessoas mesmo, porque só Deus pra saber o que se passa na cabeça dele.

CONCLUSÃO...
Um filme para poucos, com certeza, e também para uns poucos a mais que agora podem ter a oportunidade de apreciar um Cronemberg menos confuso e mais preocupado com o significado do que com os significantes.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

ESPECIAL: MISSING

★★★★★★
Título: Missing
Ano: 2012
Gênero: Drama, Ação
Classificação: 14 anos
Direção: Vários
Elenco: Ashley Judd, Sean Bean, Nick Eversman, Cliff Curtis, Adriano Giannini, Laura Donnelly, Tereza Vorísková
País: Estados Unidos
Duração: 50 min.

SOBRE O QUE É O SERIADO?
Sobre uma mulher que perde seu marido em um atentado a bomba no qual seu filho escapa, mas 10 anos depois ele desaparece após se mudar para Roma para estudar.

O QUE TENHO A DIZER...
Missing no final das contas pode até empolgar os menos atentos e críticos, mas mesmo assim demora bastante para convencer.

Estrelando Ashley Judd, atriz outrora famosa de Hollywood, mas que não emplaca um filme desde Divinos Segredos (Divine Secrets Of The Ya-Ya Sisterhood, 2002), mesmo tendo estrelado pequenos e muito bons filmes como Possuídos (Bug, 2006), um excelente triller psicológico dirigido por William Friedkin, mais conhecido por O Exorcista (The Exorcist, 1973), no qual ela oferece uma atuação brilhante, mas que passou despercebido.

Ashley agora resolveu investir em uma produção televisiva, fazendo o papel de Becca Winstone, uma mãe que perde o marido num atentado a bomba que seu filho sai ileso por um triz, mas 10 anos depois ele é sequestrado logo após ter ido cursar universidade em Roma. Não demora muito para descobrimos que Becca esconde mais segredos do que aparenta e que tanto ela, quanto seu marido, eram agentes da CIA aposentados, e que o assassinato de seu marido e o sequestro de seu filho podem estar relacionados a isso.

Depois de tantos seriados e filmes de espionagens e traição, esse enredo não soa nenhum pouco original, mesmo transformando a personagem principal em uma mãe aposentada. O seriado até que tem uma trama bem elaborada e consegue enganar com efetividade desenvolvendo a trama com surpresas e reviravoltas que realmente acabam pegando o espectador de calças curtas. Mas ele não foge de erros graves que o caracterizam definitivamente como uma produção barata para a televisão, além de pegar pesado em alguns argumentos e em atuações pouco inspiradas.

Produzido pelo canal ABC, o seriado não consegue convencer nem como um drama e nem como um gênero de ação, por mais que eles se esforcem. Equivalente ao que no Brasil conhecemos como padrão Globo de produção, não dá pra levar a sério uma produção que segue à risca a fórmula ABC de produzir, insistindo em utilizar características como: focalizar os atores em frases de efeito; exagerar na batida trilha sonora sintetizada e chorosa, incansavelmente reutilizada nas suas produções; uma direção amadora e uma edição fajuta, que retalha uma sequência inteira intercalando zooms e câmera tremendo para dar a falsa impressão de dinamismo. Durante todo o seriado não há uma cena sequer de ação que seja completa, sem cortes bruscos, principalmente nas cenas de luta, nas quais cada murro dado é um corte.

O primeiro episódio chega a ser constrangedor porque tudo acontece de forma tão rápida e sem qualquer explicação que absurdo chega a ser pouco. A história toma rumos aleatórios, personagens vão sendo jogados em cena sem qualquer explicação e Becca sempre tem uma sacada genial para tudo, numa tentativa forçada e atrapalhada de transformá-la em uma versão feminina, matriarcal e empobrecida de Jason Bourne, ou uma Sidney Bristow aos 45 anos.

As coisas melhoram um pouco no decorrer dos episódios, mas Ashley Judd está tão preocupada na técnica que sua atuação está mecânica e desconfortável, ao invés de levada na naturalidade que ela demonstra no cinema. Mesmo assim o papel conseguiu lhe render uma indicação ao Emmy na categoria Melhor Atriz Drama, que acabou perdendo, obviamente.

O seriado já foi cancelado logo na primeira temporada. A ABC alega que ele foi produzido para ter uma única temporada, sem expectativas de uma grande audiência, apenas para cobrir a grade de programação, mas seu último episódio ainda deixa algumas coisas no ar, como se a possibilidade para uma continuação da história pudesse existir. Ou seja... essa desculpa não cola muito bem e a verdade é que a trama pode até ser boa e interessante, mas é um seriado pobre em comparação com outros mais recentes e de um nível de produção muito mais sofisticado, como Damages, que levou para a televisão um nível cinematográfico altíssimo.

CONCLUSÃO...
Não foge dos clichés das demais produções da ABC. Seu enredo e trama são até interessantes, mas a produção pobre e formulada chega a ser constrangedora e muitas vezes forçada, quebrando a excelente experiência que poderia oferecer. Consegue convencer aqueles menos críticos, e realmente até entretém
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