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segunda-feira, 22 de junho de 2020

JÁ ESTÁ CONSTRANGEDOR...

★★★★
Título: O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio (Terminator: Dark Fate)
Ano: 2019
Gênero: Ação
Classificação: 14 anos
Direção: Tim Miller
Elenco: Arnold Schwarzenegger, Mackenzie Davis, Linda Hamilton
País: China, Espanha, Hungria, Estados Unidos
Duração: 128 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Após os eventos do segundo filme, mais de 20 anos se passaram e a história volta a se repetir para Sarah Connor.

O QUE TENHO A DIZER...
O sexto filme da franquia, mas o terceiro na ordem cronológica de sua história, como o diretor James Cameron o categoriza, é sem dúvida uma piada suja e sem graça.

Em primeiro lugar porque, embora Cameron tenha apoiado os demais filmes que ele não dirigiu, ele nunca participou deles de outra forma, e sempre esteve insatisfeito com todos. Ao mesmo tempo, relutante em dirigir um terceiro filme, alegando que poderia cair na sua própria repetitividade por falta de idéias melhores (e vejam só o que deu a franquia, ou no que dará Avatar e suas infinitas continuações já agendadas até 2027).

De fato, era difícil existir alguma história que superasse Julgamento Final (1991), uma sequência que conseguiu ofuscar até mesmo seu antecessor de tal forma que hoje é considerado um clássico dos clássicos do cinema de ação. Ao mesmo tempo, era difícil também superar o plot twist que conseguiu transformar T-800 de um implacável ciborgue caçador de humanos para um defensor deles, tirando a consagrada imagem de vilão que Schwarzenegger conquistou no primeiro filme e recolocando-o na imagem de herói por excelência que construiu ao longo de toda a carreira sem cair em bobagens narrativas que fizessem isso gratuitamente para manter a imagem positiva de um astro. Um marketing muito bem jogado ao ponto de fazer tanto o ator, como o icônico personagem, catapultarem extratosfericamente na lista dos mais idolatrados e carismáticos da história do cinema com bordões inesquecíveis para qual seja a geração.

A Revolução das Máquinas (2003) não chega a ser um filme ruim, mas foi naturalmente inferior desde sua concepção por terem riscado Sarah Connor da história e de qualquer possibilidade de retorno, personagem que foi a verdadeira manivela e o epicentro de existência de toda a série. Foi imperdoável. Mas perto de Destino Sombrio (2019), o terceiro filme, o de 2003, chega a parecer até uma obra prima.

Mesmo se, de fato, ignorássemos a existência das sequências anteriores, como assim James Cameron quer (ou praticamente obriga), o atual filme não traz nenhum elemento que possa ser considerado de grande importância para a história, muito menos para sua existência.

A sequência inicial consegue até enganar ao reutilizar cenas do segundo filme, de uma Sarah Connor aparentemente fora de si, no ápice de uma suposta esquizofrenia durante um interrogatório no manicômio em que estava internada. Sua narrativa então leva a outro espaço temporal, naquele em que um flashback mostra o que realmente aconteceu após o segundo filme: John Connor finalmente é executado por um exterminador (e isso não é um spoiller). O efeito "deaging" que usaram tanto em Linda Hamilton quanto em Schwarzenegger para rejuvenecê-los são de cair o queixo, e mais realistas que qualquer outro filme que já tenha utilizado essa tecnologia. Nem O Irlandês (2019), de Scorcese, conseguiu isso. E essa cena talvez seja a única a ser levada com seriedade.

É nesse momento que bate aquela nostalgia do perene conflito entre Sarah e T-800 no primeiro filme, ou o reencontro assustador que ambos tiveram nos corredores do manicômio, no auge do trauma de Sarah sobre os eventos do primeiro filme. Paralelamente bate também um sentimento entristecedor de como o tempo é injusto com nossos corpos, de como nossas referências no cinema também envelhecem. Essa tristeza aumenta com o decorrer do filme, quando percebemos quantas boas idéias foram tão desperdiçadas aqui, desrespeitando aqueles que assistem, e também a carreira e o tempo dos atores que contribuíram para essa mágica do cinema de criar universos e personagens que marcaram nossas lembranças e experiências.

O roteiro tenta fazer uma releitura da história do primeiro filme sem trazer nada novo ou agregador, transformando-se num cliche de si mesmo o tempo todo. Há um excesso de coisas que não se conversam entre si. Muita gente do futuro agregada, muita gente aparecendo em cena sem propósito, muitos personagens querendo ser heróis de algo ou alguma coisa ao mesmo tempo, e muitas, mas muitas cenas de ação que extrapolam os absurdos além de qualquer Indiana Jones sobrevivendo a uma explosão nuclear dentro de uma geladeira. A sequência do avião, que supostamente deveria ser o ápice do filme, é um tédio sem fim, e nem no filme de ação mais absurdo um cargueiro daquele demoraria tanto para cair como demora esse, para citar o mais básico dos absurdos que nem o cinema do absurdo suportaria.

Não há química entre os personagens, e Linda Hamilton assustadoramente parece mais robótica que Schwarzie no primeiro filme, e Schwarzie nesse filme aparenta mais humano e expressivo que ela. Poderia ser um contraste metafórico interessante se tudo em volta não fosse tão reciclado e feito sem qualquer coesão pois, pior do que esses defeitos, é o roteiro não ter uma história descente, já que é apenas a tecla de preservar o presente para não se alterar o futuro sendo batida incessantemente. Um enredo outrora explorado das mais diversas formas em todas as sequências que James Cameron hoje considera "não oficiais", ou de uma "realidade paralela".

Poderíamos facilmente culpar o diretor Tim Miller se ele não tivesse exposto os conflitos que surgiram entre ele e James Cameron durante a produção. Miller assim bem fez para preservar-se do desastre anunciado que Destino Sombrio estava fadado, ao ponto de afirmar que nunca voltaria a trabalhar com Cameron novamente. Segundo ele, Cameron tolhou qualquer liberdade ou exploração criativa que tentasse atualizar a história, ou dar a ela elementos que a diferenciasse sem descaracterizá-la do universo que faz parte.

A intenção do diretor era desenvolver a idéia de que os esforços foram em vão, e a humanidade realmente havia perdido a guerra para as máquinas, sendo a solução enviar humanos ao passado para tentarem descobrir o que é que deu errado no caminho e construir-se a ação a partir disso. Cameron rejeitou por completo um enredo que rinha tudo para funcionar até mesmo para filmes posteriores, embora tenha gostado da idéia de uma personagem humana, mas aprimorada tecnologicamente, de ser incluída, resultando na inclusão de Grace (Mackenzie Davis), talvez a única que leve tudo a sério do começo ao fim. As constantes interferências de Cameron foram tantas que ele mesmo chegou a pessoalmente editar boa parte do filme, razão que intensificou a animozidade de ambos porque ele estava indiretamente interferindo no roteiro ao excluir ou alterar a ordem de cenas que, para Miller, eram de grande importância narrativa.

O resultado dessa discordância entre direção e produção é evidente, num filme vazio que tenta compensar sua falta de identidade apelando nos absurdos óbvios, de elementos já usados em todos os filmes anteriores, da ação por obrigação e na força de personagens que perderam suas relevâncias pelo mal uso, sendo agora nada além do que figuras inexpressivas.

Eu mesmo já ouvi a teoria de que John Connor nunca foi o revolucionário do futuro, mas um grande laranja na história, manipulado para não apenas enganar os exterminadores como também motivar Sarah Connor a permanecer viva através de seus instintos maternais, já que ela mesma seria a grande responsável por toda a transformação do futuro sem saber disso, e por isso a humanidade conseguiu ser salva. E seu filho, apenas um reles mortal que herdou seus feitos.

Enfim, qualquer enredo poderia ter sido melhor do que fusquinhas que tem que empurrar sendo perseguidos por caminhões conduzidos por um exterminador invencível. Quem já não está cansado de ver e rever essas cenas na franquia? E James Cameron, que nunca pisou no set de filmagem, dando pitacos e interferindo de maneira inapropriada para manter a história no mesmo platô que todas as sequências se mantiveram.

Melhor teria sido se ele nunca tivesse se dado a esse trabalho. Um diretor que coleciona sucessos, mas nem por isso deveria ser superestimado como é.

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