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segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

LOIRA ATÔMICA...

★★★★★★☆☆☆☆
Título: Atômica (Atomic Blonde)
Ano: 2017
Gênero: Ação
Classificação: 14 anos
Direção: David Leitch
Elenco: Charlize Theron, James McAvoy, John Goodman, Toby Jones
País: Alemanha, Suécia, Estados Unidos
Duração: 115 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Após o assassinato de um agente secreto, uma lista contendo nomes de agentes duplos da MI6 é exposta, colocando em risco a vida de todos, incluindo a da agente enviada especialmente para descobrir os motivos do crime.

O QUE TENHO A DIZER...
Atômica foi lançado e divulgado na premissa de trazer as mulheres novamente no primeiro plano da ação bate-e-arrebenta, com protagonistas que não são abaladas pelo sexismo ou pela esterotipação masculina, e que possam ter personagens tão fortes quanto eles, em cenários tão violentos quanto os deles.

Mas vale dizer que, apesar desse mérito, ele não é um carro chefe, sequer uma revolução. Nos últimos anos tivemos filmes de ação com protagonistas femininas muito fortes. Só Charlize Theron estreou dois antes desse: na adaptação da famosa série animada da MTV, Æon Flux (2005), e no estrondoso sucesso de crítica e público de Mad Max: Estrada da Fúria (2015), de longe um dos melhores do currículo da atriz por todo o significado de sua personagem no filme e a mudança de rumos que isso trouxe para a clássica franquia de George Miller.

Quando lembramos das mulheres no cenário de pancada, não podemos esquecer de Uma Thurman em Kill Bill (2003/2004), talvez a memória máxima do estilo no cinema desde século, que não apenas colocou Beatrix Kiddo com uma das protagonistas femininas mais fortes e empoderadas do gênero como também diversas outras antagonistas numa reunião exuberante que movimenta toda a história mais do que o próprio Bill (David Carradine), como: O-Ren Ishi (Lucy Liu); Vernita Green (Vivica A. Fox); Elle Driver (Daryl Hannah); Sofie Fatale (Julie Dreyfus) e Gogo Yubari (Chiaki Kuriyama).

Também menos interessante, mas nem por isso menos importante, a tentativa de Steven Soderbergh de revitalizar o estilo com Haywire (2011), trazendo Gina Carano, a famosa ex-lutadora de MMA, como protagonista, relembrando muito daquilo que Cynthia Rothrock fez nos filmes de pancadaria para a TV nas décadas de 80 a 90. Houve tentativas esdrúxulas, como Angelina Jolie numa cópia barata de Jason Bourne em Salt, Milla Jovovich na tenebrosa franquia Resident Evil, ou Jennifer Garner na abominável adaptação de Elektra (2005).

Não importa. Seja de Pam Grier a Michelle Yeoh, de Lucy Lawless a Rhona Mitra, de Carrie-Anne Moss a Kate Backinsale... as mulheres conseguem ser bem representadas no cinema estrogênio, já que o termo "testosterona" deixou de ser representação singular de força e empoderamento há muito tempo.

O grande problema é que a frequência com que isso acontece ainda é baixa, havendo uma relutância do público quando as intenções do cinema de ação dar mais espaço às mulheres ficam exageradamente expostas, ao invés de ser promovido sem essa intenção impositora, como aconteceram com os filmes de Tarantino ou Miller. E assim como ocorreu com As Caça Fantasmas (Ghostbusters, 2016), Atômica também sofreu da fúria conservadora quando utilizou esses princípios, não arrecadando nem US$100 milhões no mundo, nada mal para uma produção de US$30 milhões, mas nada que o considere um grande sucesso.

O que é uma grande pena, principalmente em um ano dominado pela Mulher Maravilha, pois é um interessante filme de espionagem de David Leitch, estréia do ex-dublê que agora se tornou diretor, trazendo Lorraine Broughton (Charlize Theron) como uma espiã da MI6 exposta por um traidor durante uma missão em Berlim.

Quer dizer... nem tão bem estréia assim, já que Leitch foi co-diretor de John Wick (2014), mas sem ser creditado.

Atômica é uma adaptação da novela gráfica The Coldest City (2012), de Anthony Johnston (autor) e Sam Hart (ilustrador), e assim como a obra original, o filme irá se desenvolver em meio aos acontecimentos que precederam o colapso do Comunismo na Alemanha com a Queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria. A história se mantém fiel ao material original, e por muitas vezes a fotografia de Jonathan Sela e os enquadramentos de Leitch utilizam das mesmas perspectivas dos desenhos que, embora sejam em preto e branco, são belissimamente adaptados ao colorido do filme. Cores sempre muito frias para causar a sensação de desconforto, isolamento e distância, com um ou outro choque, principalmente nos momentos mais densos da história, ou quando a protagonista parte diretamente para sua violência de sobrevivência.

Para quem é fã de James Bond e delirou com Skyfall (2012), lançado no mesmo ano da novela gráfica, irá encontrar muitas semelhanças entre as duas histórias, principalmente por ambos serem agentes secretos da MI6, e também porque a exposição de uma lista secreta de agentes duplos que passam a ser caçados um a um, sobrando à heroína tentar sobreviver e impedir o avanço da operação porque ela mesma está incluída nesta lista, também é um enredo similar ao de James Bond no filme mencionado. Também será impossível não relacionar os momentos de ação com as cenas antológicas da franquia Bourne, que incluem consistentes brigas corpo a corpo, o uso improvisado de objetos comuns como instrumentos de ataque e defesa, tiroteio comedido e uma perseguição de carro bastante interessante. A sensação da câmera na mão é presente o tempo todo, mas não tão delirante e labiríntica como os filmes de Paul Greengrass popularizaram. E ao invés da edição picotada, utilizada em demasia na Trilogia Bourne e que igualmente virou febre em todos os filmes de ação posteriores, aqui Leitch prefere abusar de planos sequência para que as coreografias de luta fossem amplamente registradas e mais convincentes, deixando de lado técnicas de edição para intensificar as técnicas de batalha. O que é sempre muito interessante em um cinema que tem deixado cada vez mais a atenção a mínimos detalhes de lado.

Mas enquanto o filme prefere impressionar em alguns pontos com a preferência de técnicas mais vibrantes e interessantes, ele peca no excesso de outros, como na trilha sonora recheada de clássicos 80tistas, usada de maneira tão intensa que chega a ser invasiva. Ou sempre mais alta que os diálogos ou sempre entrando em momentos desnecessários, a intenção é claramente de compensar as sequências mais monótonas de desenvolvimento da história, como na primeira metade do filme, e assim o espectador ter a falsa impressão de que tudo é empolgante do início ao fim. O que não é. Apenas na segunda metade que a ação vai tomar conta de tudo e o dinamismo da história acelera. Nem por isso o roteiro deixa de ir e vir várias vezes de e para lugar algum, tornando-se redundante para uma história que, inclusive, pode parecer confusa demais, naquela velha técnica narrativa de desconstruir fatos para causar a impressão de complexidade. E mesmo assim continuar previsível.

Charlize, deslumbrante como sempre, não precisa mais do que ela mesma em frente a câmera para chamar atenção até em filmes bem porcarias como Branca de Neve e o Caçador (2012) e sua sequência O Caçador e a Rainha de Gelo (2016), e mesmo numa personagem sem grandes variações emocionais, ela dá conta do recado, trazendo ao filme um refinamento que dificilmente qualquer outra atriz teria em seu lugar. Até porque o grande e único atrativo é ela e apenas ela, realizando movimentos numa coordenação que impressiona, imprimindo um estilo próprio assim como outras grandes estrelas de ação já fizeram em seus respectivos filmes. Irritante mesmo é James McAvoy, que se acomodou nos cacoetes com sua boca e acredita que fazer careta é atuar. Entorta a boca aqui, arreganha os dentes ali, morde ou bota a língua pra fora acolá... é tão irritante quanto a altura da trilha sonora. Inconveniente, propriamente dizendo.

E mesmo com esses defeitos que podem ter tido destaque justamente por ser um diretor estreante e mais preocupado com elementos visuais e sonoros, novamente não é um filme memorável, mas traz consigo idéias interessantes e cenas bem empolgantes e realistas. Não tem o excesso de ação como o trailer prometia, mas ainda sim empolga em sua segunda metade, acordando o espectador que bocejava nos primeiros 30 minutos.

Sem falar que é impagável uma das cenas finais de Charlize, quando pergunta o que ela deveria vestir para o chá com a Rainha. Cena simples e que mostra como a atriz tem um poder único e quase hipnotizante na tela, sendo esta a razão do filme funcionar e, de certa forma, oferecer o que propõe. Poderia ter acabado alí, mas infelizmente nem sempre os filmes são como esperamos.

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