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domingo, 8 de outubro de 2017

TENSO...

★★★★★★★★☆☆
Título: O Convite (The Invitation)
Ano: 2015
Gênero: Suspense, Horror, Drama
Classificação: 14 anos
Direção: Karyn Kusama
Elenco: Logan Marshall-Green, Tammy Blanchard, Michiel Huisman, Emayatzi Corinealdi, Michelle Krusiec, Mike Doyle, Jordi Vilasuso,
País: Estados Unidos
Duração: 100 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Um homem acredita que sua ex-mulher e seu novo marido tenham outras intenções com seus convidados além de simplesmente celebrar um encontro no qual foi convidado.

O QUE TENHO A DIZER...
Conversando com um amigo, chegamos à óbvia conclusão de como extremistas são perigosos à sociedade, e como o poder de influência deles sobre outras pessoas é preocupante.

Pessoas sofrem de perdas, faltas, dores e ausências. De compreenderem e serem compreendidas. Sofrem de descrença também, e não falo de religião, mas da descrença de si e de suas capacidades.

Sentem sintomas de um vazio que não se sabe onde está e como preenchê-lo, substituindo a racionalidade por coisas mais fáceis e simples, que possam, de alguma forma, darem explicações a seus sofrimentos de maneira instantânea, principalmente numa sociedade moderna e escrava da tecnologia, dos retwites, das curtidas no Facebook, das correntes de Whatsapp, etc. Todas geralmente mal informadas, absolutamente ausentes de fontes seguras. Mas o fato é que, desde que se conecte de imediato com aquilo que é esperado, ou explique banalmente aquilo que desconhecem, não importando a veracidade, o falso se torna verdadeiro em um estalar de dedos para quem quer acreditar em qualquer coisa.

É a constante busca da compensação de frustrações, e são pessoas assim os grandes alvos daqueles que necessitam da fragilidade alheia para fortalecerem idéias distorcidas de um mundo que demanda tempo, paciência e determinação para ser compreendido, elementos há muito abandonados por uma sociedade que tem se construído simplória demais para pensar com sua própria cabeça e andar com suas próprias pernas.

E é exatamente sobre isso que esse filme tenta argumentar dentro de seu roteiro que constrói uma atmosfera densa e difícil desde seu início. A construção dúbia das situações coloca em teste alguns personagens, além de brincar com o psicológico do espectador, que ora se sente desafiado, ora apreensivo, ora aterrorizado, e quando acreditamos que o clímax é atingido, o final aparentemente simples, direcionado propositalmente a uma resolução cliché do gênero, acaba se estendendo um pouquinho mais para concluir todo o filme de maneira inesperada e, quiçá, chocante.

É impossível não associar este filme a outros que fazem uso do mesmo enredo: um jantar como ponto de partida para as tramas se desenvolverem, como no clássico Festim Diabólico (Rope, 1948), de Hitchcock; na releitura do mesmo em Cova Rasa (Shallow Grave, 1994), de Danny Boyle; no cinema mais alternativo do movimento Dogma 95 do Velho Mundo, como Festa de Família (Festen, 1998), de Thomas Vinterberg; ou até mesmo na literatura, no clássico dos clássicos do estilo "jantar infernal" em O Caso dos 10 Negrinhos (And Then There Were None, 1939), de Agatha Christie.

Nota-se que aqui a diretora Karyn Kusama, juntamente com os roteiristas Phil Hay e Matt Manfredi, fazem uma junção inteligente dos diferentes elementos presentes nesses filmes individualmente. Propositalmente ou não, tudo funciona como se deve, e o impacto dos diferentes momentos de tensão, e de momentos emocionalmente densos, consegue atingir em cheio tal qual os títulos mencionados, mas à sua própria maneira.

O drama aqui não chega a ser tão abrangente e realista como em Festa de Família, tampouco tem as boas doses de humor negro do filme de Hitchcock ou de Boyle, mas possui um arco, uma construção, bastante forte, que se torna convincente pela competência dos atores, principalmente de Logan Marshal-Green e seu "quê" Tom Hardy de ser, e Tammy Blanchard, que constrói uma personagem enigmática e fria, bizarra e comedida, propositalmente incômoda em todas as cenas. Um elenco de personagens bem construídos, desde aquele que aparenta ser menos relevante até aqueles que são as verdadeiras engrenagens de todas as desastrosas consequências. Personagens estes que, como dito, tentam preencher seus vazios e compensar suas frustrações através de extremos ditados pelo desespero de não conseguirem lidar com seus fardos particulares, deixando expostas suas vulnerabilidades para aqueles que querem se apropriar delas.

Claro que revelar diretamente qualquer detalhe da história seja como abrir um forno fora de hora. Ela não se aprofunda em detalhes da dor comum dos personagens de Marshal-Green e Blanchard, e nem de como tudo aconteceu de fato. Mas o fato em si já se justifica como um grande motivo para demonstrar que, apesar das dificuldades de superarem o ocorrido, ambos lidam com as situações de maneiras bastante diferentes, e é isso que será explorado ao longo de todo o desenvolvimento.

Kusama, que até este longa não tinha lá um currículo muito interessante, sem dúvida conseguiu se redimir de desastres como Æon Flux (2005) e Garota Infernal (Jennifer's Body, 2009), ambos ruins não por incompetência, mas por roteiros sofríveis, o que não é o caso dessa vez. Pelo contrário, ela consegue fazer desse suspense algo intenso e assustador, tanto em seu tema, como também nas reviravoltas que o filme oferece, pegando o espectador desprevenido até mesmo quando já se espera alguma coisa.

Um filme independente que mostra como o total controle criativo da diretora e dos roteiristas fez absoluta diferença em seu resultado, e mesmo dentro de um gênero um tanto fictício, nos faz pensar que não há ninguém capaz de nos fazer encontrar soluções para nossos dilemas além de nós mesmos.

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