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quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

MENOS SERIA MAIS...

★★★★★★☆
Título: Westworld
Ano: 2016
Gênero: Drama, Ação, Suspense, Ficção Científica
Classificação: 14 anos
Direção: Vários
Elenco: Evan Rachel Wood, Thandie Newton, James Marsden, Jeffrey Wright, Ed Harris, Anthony Hopkins
País: Estados Unidos
Duração: 60 min.

SOBRE O QUE É O SERIADO?
Um parque temático populado por androides constantemente recebe visitantes capazes de pagar os mais altos preços para satisfazerem suas fantasias sem limites ou consequências.

O QUE TENHO A DIZER...
Westworld pode soar uma grande novidade para o público atual, mas poucas pessoas sabem que o novo hit da HBO é baseado no filme homônimo escrito e dirigido por Michael Crichton, de 1973.

Crichton, para quem também não sabe, é o poderoso criador de outro parque, o Parque dos Dinossauros (Jurassic Park), adaptado para os cinemas por Spielberg em 1993 e que elevou mais ainda o status do autor. Na televisão também foi responsável por outro hit ao criar Plantão Médico (E.R., 1994-2009), mas no cinema nunca mais conseguiu o mesmo êxito. Faleceu em 2008, quando a quarta continuação da franquia dos dinossauros estava em discussão, o que levou a suspensão do projeto, retomado anos depois como Jurassic World (2015).

Não é à toa que o filme original de Crichton, onde os personagens de um parque são andróides que se rebelam e começam a matar seus visitantes humanos, tenha servido de inspiração para muitos filmes, incluindo os cult classics Blade Runner (1982), Exterminador do Futuro (1984), Matrix (1999), ou até o atual Ex-Machina (2015), quando partimos do contexto da evolução das máquinas e sua emancipação do poder humano. Todos esses filmes, obviamente, usam como referências as teorias de Alan Turing e as ficções de Isaac Asimov.

Óbvio que a série se inspira em tudo isso para tentar ir mais além, além de ter outros nomes de peso, como ter sido co-criada e escrita por Jonathan Nolan, irmão de Christopher Nolan. Só por isso já podemos imaginar que o enredo, antes simples, agora terá alguns níveis a mais de complexidade porque esse é seu estilo desde suas parcerias com seu irmão. E para ajudar nesse quesito, há co-produção de J.J. Abrams, que ficou famoso pelo seriado de absurdos e que testava a paciência do espectador, chamado Lost (2004-2010).

E o exagero é o que se percebe logo no primeiro capítulo, com uma das aberturas mais longas da HBO (aproximadamente 2 minutos), pois é ela quem resume o enredo do seriado sobre um mundo onde tudo é falso e fabricado, sem alma ou definição. Assim, toda vez que o espectador assistir um novo episódio, a função da abertura está lá, de relembrá-lo que tudo é uma farsa.

O Parque de Westworld, moderno, em um futuro qualquer, agora tem um nível muito maior de interação do que no seu início, sendo um gigantesco jogo com tramas, subtramas e missões a serem completadas para o ganho de recompensas ou bonus, tal como um jogo de video game no estilo chamado "mundo aberto" (open world), onde o jogador pode interagir ou não com os personagens e concluir missões de acordo com seu interesse, sem precisar seguir uma ordem pré-estabelecida. A diferença é que, em Westworld, o jogador é o visitante do Parque em pessoa, e os anfitriões são os personagens do jogo, cada um exercendo sua função na história, que precisa ser engatilhada com um comando assim que uma ação se reinicia (looping), como pegar a lata do chão todas as vezes que Dolores a derrubar, ou ajudar o pobre velho todas as vezes que ele cair da carroça.

Para os amantes de video game, por muitas vezes assistí-lo será como estar no cenário de jogos Western como Red Dead Redemption (nos consoles), ou Six Guns (nos celulares). Jonathan realmente pegou as principais estruturas dos jogos desse gênero e transferiu para a linguagem cinematográfica de maneira acessível, mas bastante simplória quando comparada com a experiência que David Chronemberg oferece em seu filme eXistenZ (1999), muito mais completa e detalhista.

A série, ao contrário, não detalha tanto as ações que diferenciam humanos de andróides porque ela quer que o espectador esqueça disso e acredite que todos sejam uma coisa só, pois a intenção do seriado é enganar até que se prove o contrário. E enganar nem sempre é a mesma coisa que surpreender, algo que muito acontece ao longo dos episódios.

O desenvolvimento da história extrapola os limites do necessário quando o roteiro desconstrói a narrativa apenas para demonstrar um nível de complexidade que a história não tem.

A temporada de estréia já começa confusa demais logo no primeiro episódio, com incógnitas desnecessária aos montes. Os roteiristas não querem dar nenhuma resposta, só perguntas. Perguntas que ficarão suspensas para nos manter assistindo. Elementos enganosos para distrair o espectador, fazendo-o perder tempo à toa para tentar compreender uma complexidade exagerada que nada significa. O que fazem com o roteiro é um artifício manjado para entreter. É pegar uma história linear e inverter ordens dos fatos. Para o espectador comum, essa construção pode parecer genial, mas não é. Na verdade, esse tipo de narrativa muitas vezes é como mágica barata, e você só acredita que é bem feita porque não prestou atenção.

Algumas tramas só começam a fazer um pouco de sentido lá pelo quarto episódio, quando já estamos um tanto cansados de idas e vindas, e nem mais assistimos porque estamos curiosos, mas porque queremos simplesmente chegar ao fim.

Depois de muita masturbação mental desnecessária, finalmente descobrirmos como certas coisas funcionam na história. Aí, sim, Westworld entretém e se transforma em uma série apreciável, com personagens interessantes, até mesmo aqueles que não pareciam ser. Quando a história relaxa dos absurdos e da desconstrução, as tramas e subtramas finalmente aparecem com consistência, como é o caso das histórias da prostituta Maeve, do diretor Bernard e do empresário William. Este último, uma das histórias mais interessantes, mas que no meio de tanto entroncamento e confusão, infelizmente não oferece o impacto que deveria ter.

É evidente o quanto as histórias se arrastam desnecessariamente para um último capítulo que só existe para ser um monólogo explicativo, um manual de instrução tardio de todos os episódios anteriores que deixaram espectadores com cara de paisagem no ar. O final, entre filosofias "nolanescas" e algumas frases de efeito, foi como um "OU SEJA" na história: dar uma nova explicação para aquilo que foi mal explicado antes. E no começo da série, quando tudo tentava nos convencer de que o fim seria espetacular, nem surpreende tanto assim.

Bagunçar algo que é simples fez os roteiristas perderem o foco e a história perder seu enredo principal. A idéia é boa, mas a execução é infeliz. E ao invés de assistirmos um jogo de sobrevivência e descobertas, parece que vemos um jogo de plataformas do Atari, subindo escadas sem chegar a lugar algum. Há um momento na história que cogitam a possibilidade de reformularem as atrações do parque porque tudo está complexo demais para visitantes que procuram algo mais simples. É exatamente a sensação que o seriado passa, algo complexo demais para espectadores que precisavam de algo mais simples. 

Apesar de tudo, ainda é algo para ser consumido sem grandes expectativas. E se o espectador for despretencioso o suficiente, irá se divertir porque o nível de produção é impecável, e conquista pelos olhos, como toda produção da HBO é. Westworld não fica nenhum pouco atrás de Game Of Thrones nesse quesito, nem nos cenários, nem no design. A trilha sonora original, de Ramin Djawadi (o mesmo de Game) eleva uma atmosfera fictícia tão eficiente quanto a dos filmes já citados e que tratam do mesmo tema, engrandecendo cenas e intensificando propósitos de algumas sequências.

Amando ou odiando Westworld, é impossível não deixar de fantasiar com tudo. Assim como imaginar o que fazer sozinho em um Shopping Center, muita gente ficará presa na fantasia do que iria fazer em um Parque onde o limite é sua própria vontade. Uma pena que o seriado não abraça ou conquista essa idéia com seu público, e essa sensação fantasiosa demora alguns pares de episódios para brotar no imaginário. Se os roteiristas tivessem se preocupado mais em primeiro conquistar o público, trazendo-o para dentro desse universo, do que já querer impressionar logo de cara com uma enxurrada de eventos sem sentido, a apreciação seria diferente. Deveriamos ter sido apresentados ao Parque, às suas atrações, aos personagens que fazem parte dele, e assim entrar nessa fantasia ao ponto de querermos fazer parte daquilo. Aí, sim, a história seria mais impressionante e assustadora do que tenta ser, e as tramas tomariam uma forma muito mais consistente.

Seria um começo similar ao de Parque dos Dinossauros, mais adequado e menos caótico, já que, no fim, a moral dos dois trabalhos de Crichton é a mesma.

CONCLUSÃO...
Nem sempre complicar e desconstruir um roteiro ou uma história oferece resultado inteligente, apenas dá uma falsa impressão de grandiosidade e complexidade. É o que acontece com Westworld, que é uma produção impecável e apreciável, mas poderia ter sido melhor desenvolvida caso tivesse seguido uma construção mais simples. Os mistérios teriam continuado o mesmo, o suspense teria sido eficaz da mesma forma, e no fim nada teria sido tão detalhadamente explicado como foi.

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