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segunda-feira, 8 de agosto de 2016

ESTUPIDEZ SEM LIMITE...

Título: Esquadrão Suicida (Suicide Squad)
Ano: 2016
Gênero: Ação, Super Herói, Comédia
Classificação: 12 anos
Direção: David Ayer
Elenco: Margot Robbie, Will Smith, Viola Davis, Jared Leto, Cara Delavigne
País: Estados Unidos
Duração: 125 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Um grupo formado pelos maiores criminosos e psicóticos do país são recrutados secretamente para tentar impedir um desastre de proporções mundiais. 

O QUE TENHO A DIZER...
A Marvel criou no cinema uma fórmula que deu certo. E dentro de um planejamento de 10 anos, divididos em três fases, concretizou seu Universo Cinemático. Nada do que ela fez dentro desse período foi decidido da noite para o dia. Foi um planejamento de longa data, moldado e adaptado conforme o interesse do público e dos fãs, até encontrar seu tom. Tudo muito sutil, mas feito com cuidado e uma filosofia única em foco: lucrar respeitando o próprio legado.

Demorou para a DC/Warner resolver fazer o mesmo no cinema, já que nos video-games e na televisão, por exemplo, essa universo já existe e é sólido, como os jogos Injustice e DC Universe, e com seriados como Arrow, The Flash e Supergirl. A diferença é que a DC se atrasou demais no processo de expansão desse universo para o cinema, e por isso tem colocado os pés na frente das mãos. 

Mesmo Homem de Aço (Man Of Steel, 2013), de Zack Snyder, ter sido um fracasso de crítica, a Warner se aproveitou do razoável sucesso de público para tão logo divulgar sua continuação direta, e de última hora fazê-la o grito de largada do seu universo cinemático próprio. Os erros de Homem de Aço poderiam ter sido usados como experiências do que não devia ter sido feito em Batman vs. Superman, como manter Zack Snyder na direção, por exemplo. Mas ele não apenas foi mantido e cometeu os mesmos equívocos, como também irá dirigir A Liga da Justiça, o maior investimento do estúdio e a principal razão de existência de todo esse universo que ela tenta criar a tropeços e solavancos. Por isso que tem valido a máxima "errar uma vez é humano, contratar Zack Snyder de novo foi burrice, e mantê-lo será suicídio".

O prematuro Universo da DC no cinema tem sido marcado por decisões sem foco, levando essa investida da Warner a um caminho sem rumo, eira ou beira, restando a Esquadrão Suicida e ao aguardadíssimo filme solo de Mulher-Maravilha, a tentativa de capturar um novo fôlego e reacender o interesse de um público que já está desinteressado, mesmo que ainda preencha as salas de cinema por pura curiosidade e minguadas expectativas.

Nada seria mais interessante do que uma história em que grandes criminosos sejam recrutados para missões que heróis deveriam ser poupados. O nome da equipe não seria mais apropriado, e a DC a mais coerente a ter uma equipe assim, já que o selo é marcado por vilões cujas personalidades psicóticas tendem a ser muito mais interessantes do que a de seus heróis.

Aqui a história já entra na proposta do universo, com início a partir dos eventos de Batman vs. Superman, no qual Amanda Waller (Viola Davis) discursa sobre a vulnerabilidade de todos após a suposta morte de Superman. Com a ajuda de Batman e de meta-humanos, como The Flash, conseguiu capturar alguns dos maiores criminosos do país, pois pretende recrutá-los para um programa secreto de segurança do Governo, no qual ela é responsável.

Linear e apresentando brevemente a história de cada um dos recrutados, a introdução é um pouco longa e cansativa, e após isso um tanto repetitiva, já que por várias vezes temos que passar pelo ponto de vista de cada personagem sobre alguma determinada coisa no decorrer da trama. De qualquer forma, o filme acaba e continuamos sabendo nada muito relevante a respeito de ninguém. Ou seja, superficial, pois caso não fosse, estaria na memória.

Mas a impressão maior que se tem com Esquadrão é uma coisa meio óbvia: a de ter sido feita às pressas, assim como aconteceu com Lanterna Verde (Green Lantern, 2011). Sabe-se também que, depois das pesadas críticas negativas que Batman vs. Superman recebeu, o estúdio pressionou para que o filme fosse editado de forma a amenizar o tom violento e não sofrer com a classificação etária. Não é à toa que dezenas de cenas foram deletadas, e muito do palavriado jocoso que poderia ser usado para o bem do contexto dos personagens foi igualmente censurado pelo estúdio. É nessas horas que admiramos Deadpool (2016), sua violência explícita, a boca aberta do anti-herói e suas piadas sujas, outra lição que a Warner deveria ter aprendido, dessa vez, com a Marvel.

O didatismo simplista do roteiro chega a níveis abusivos porque a grande falha, como sempre, é amenizar a carga dramática e a personalidade violenta ou insana dos personagens, deixando tudo politicamente correto. No começo até tentam dar alguma densidade, só que sempre que alguma cena tenta ultrapassar o limite, ela é cortada abruptamente. O maníqueísmo simplista de Hollywood (bem como de boa parte da mídia de entretenimento) parte do princípio de que os espectadores não podem se identificar com vilões ou anti-heróis. Pelo ponto de vista religioso, isso induziria ao mal, já que o mal é relativo ao inferno, e o bem ao paraíso. Por isso que nenhum vilão é bem sucedido. Ou ele morre pelas mãos de um herói e vai para o inferno, ou tem que se redimir de suas atitudes diabólicas para subir aos céus. Essa é a justificativa para existir os momentos clichés de redenção dos vilões ou bandidos, pois assim os espectadores não se sentem culpados por se identificarem com eles, ou simplesmente os acharem mais interessantes do que os heróis ou mocinhos. Por isso que mostram Deadshot (Will Smith) pensar em sua filha constantemente, ou Diablo (Jay Hernandez) ser uma pessoa constantemente arrependida e Arlequina (Margot Robbie) sofrendo de amor como uma donzela virgem e solitária no alto de uma torre. Clichés da redenção para dar motivos fáceis aos espectadores de que o lado humano dos vilões é mais forte.

Esquadrão Suicida surgiu nos quadrinhos para justamente ir contra esse pensamento de que apenas heróis seriam capazes de realizar atitudes heroicas. Foi uma oportunidade que a DC encontrou de fazer com que seus vilões pudessem ser admirados como os heróis, mas sem nunca esquecermos de que eles não são pessoas de boa índole. Por isso, são obrigados a prestarem esses serviços, sofrendo constantemente ameaças e chantagens da impiedosa Amanda Waller. Essa justificativa é o que deixa evidente que, não importa o que façam, eles nunca serão bonzinhos.

Só que isso é algo que não vemos acontecer de fato nessa adaptação, e o resultado é um filme inerte, que falha em todos os aspectos possíveis, pisando em ovos para não ser chocante ou infantil demais, caindo numa cafonice intragável que sobrevive na gambiarra dos péssimos efeitos especiais e da trilha sonora para cobrir os buracos emotivos de cenas apáticas. Nota-se que os efeitos especiais não interagem de maneira convincente com as cenas, sendo tão ruins quanto a maquiagem de Crocodilo. Resultados da pressa, já que todo o processo demorou um ano, desde a pré até a pós produção. Um período de tempo muito curto para uma adaptação como essa ter qualidade.

Não é um filme divertido, sequer empolgante ou engraçado, sem ritmo ou coerência. Em nenhum momento oferece a sensação de que o grupo é formado por aqueles que deveriam estar entre os maiores vilões e criminosos do Universo DC. Ao invés disso, nos passa a impressão de que escolheram aleatoriamente um bando de ladrões de galinha que não terão a mínima idéia do que fazer em um campo de guerra. Então imagine como será quando descobrirem que terão de impedir uma entidade diabólica de destruir o planeta: "vamos explodir uma bomba", pensam eles. Porque é óbvio, é a solução mais prática.

David Ayer, diretor e roteirista, foi responsável por filmes como Corações de Ferro (Fury, 2015) e Marcados Para Morrer (End Of Watch, 2012), o primeiro sobre a Segunda Guerra, e o segundo sobre a violência nas ruas. Dois filmes que receberam críticas positivias, levando a perceber como ele está igualmente deslocado nessa empreitada. Esses personagens poderiam ter sido muito melhor aproveitados em tramas das quais Ayer já estivesse familiarizado, em coisas mais palpáveis até, e condizente com os talentos de cada um, como uma ação política, uma guerra iminente, ou simplesmente sendo obrigados a confrontar outros vilões de igual nível criminoso. Fiquei pensando como poderia ter sido interessante impedirem uma conspiração do Coringa, por exemplo, e como isso teria abalado a relação entre ele e Arlequina e as consequências disso, o que é sempre uma bomba prestes a ser detonada.

Mas não, preferiram dar uma missão fantástica e sobrenatural, como se eles fossem Os Vingadores. Percebe-se aí a intenção barata de atrair o público pelo exagero e não pela qualidade e coerência, errando feio mais uma vez.

É um filme sofrível que causa bocejos em cadeia no cinema. A falta de reação do público constrangia como um grande vazio durante os diálogos sofríveis. Há um momento em que um dos personagens repreende Arlequina, dizendo que ela sempre cria discussões no meio das conversas. Mas que conversas? Que discussões? Não havia tido nenhuma até então, principalmente ela. E por que não discussões? São todos vilões! Enfim, não há diálogo sequer para criar vículos entre eles ou com o público. O que se tem, do início ao fim, são  frases de efeitos para a câmera, como piadas prontas ou bordões. Imediatas como memes de internet que aguardam gargalhadas, mas nunca conseguem.

Deprimente querer transformar um personagem tão cruel como Crocodilo em um piadista estúpido, ou quase arrancarem uma lágrima de Deadshot quando este recebe a notícia que Arlequina morreu (e isso não é um spoiler). Inclusive, não consegui entender até o momento a razão de Will Smith no elenco. Assim como vi alguém dizer, parecia que estava lá para poder pagar o aluguel do mês.

E no meio de tanto desperdício, nem mesmo a caracterização dos atores se salva. Jared Leto ficou longe de conseguir criar uma caricatura mais atual e memorável do Coringa, ele estava mais para um personagem teatral que solta grunhidos estranhos do que para alguém mentalmente perturbado como foram as versões de Jack Nicholson e Heath Ledger. Leto não precisava ser tão exagerado no meio de tanta informação visual, e o resultado foi um bolo de noiva: decoradíssimo por fora, mas sem qualquer sabor ou conteúdo. Até porque sua participação no filme é infame, para não dizer "sem qualquer motivo" além de atrair público e mostrar seu vínculo com Arlequina, esta que, por sinal, poderia ter sido melhor aproveitada.

Margot Robbie tinha uma grande oportunidade de fazer com que a personagem fosse memorável, mas é desperdiçada não porque foi incompetente, mas porque o péssimo roteiro que não soube aproveitar seus potenciais. Quero dizer: ela é o grande destaque, mas isso só é possível porque os demais foram pessimamente desenvolvidos. O filme se preocupa muito mais com sua imagem sexista do que com aquilo que ela poderia oferecer de fato. Não é raro os momentos que aparecem os demais personagens masculinos perdendo o foco em suas curvas, e a câmera parece fazer o mesmo, perdida e sem saber onde ir toda vez que ela aparece. Excesso de planos fechados quando seria mais fácil vê-los aproveitarem melhor os cenários e terem espaço para o improviso e brincarem com suas caricaturas.

Arlequina é um tipo que leva desastres na brincadeira e brinca fazendo desastre. Em nenhum momento, por exemplo, vemos ela pulando e cantarolando enquanto esmaga cabeças com seu porrete e faz piada dos miolos que voam, já que seu nível de perversidade consegue ser maior que o de Coringa. A relação amorosa que criam entre os dois é tão púbere quanto aquelas que vemos em Malhação, enquanto nos quadrinhos é muito mais complexa, destrutiva e psicótica do que se imagina. Coringa faz dela gato e sapato. Arlequina, assim como o filme mostra, era uma psiquiatra que, de tão fascinada pela sua mente criminosa, apaixona-se por ele. De fato, ela elouquece de amor obsessivo enquanto Coringa se aproveita disso, manipulando-a como um brinquedo o tempo todo. Tanto que Arlequina é constantemente violentada por ele. Ela apanha, é humilhada, ameaçada e repudiada, mas continua junto, firme e forte, porque acredita que assim conseguirá receber a aprovação que tanto espera, ou que seja dessa forma como ele corresponde seu amor por ela.

Ao contrário dessa relação doentia, vemos um casal que escorre sacarina toda vez que aparece, dando azia até em Sonrisal quando demonstram suas loucuras de amor um pelo outro, rendendo várias cenas românticas com direito a música de fundo e tudo. Há uma cena sobre eles que só não foi mais ridícula porque tudo que podia ser feito para ela ser melodramática, foi feito. Aliás, amor aqui é justificativa para tudo. Todo mundo morre por amor, todo mundo mata por amor e todo mundo sofre de amor. E todo mundo é vilão por isso. Nada poderia ter sido mais simples e fácil, ou nada poderia ter sido tão pior do que Deadshot receber um abraço de felicidade. O que era pra ser engraçado, não foi. Foi imbecil.

Tudo é um erro fatal, que desperdiçou a possibilidade de ser o melhor filme de super heróis sem ser de heróis. Já que tinha intenções e foi promovido desde o princípio como algo despretencioso, ousado e diferente tal como foi Deadpool, na realidade conseguiu ser o pior de todos eles. Apelar para o humor barato e na amenização do tom fez aquilo que é o erro número um de adaptações: não ser fiel ao material original. David Ayer tinha mil caminhos a seguir para ser fiel sem sofrer o talhe da censura do estúdio. Sim, era possível o filme até manter um tom mais leve e humorado, mas não precisava ser estúpido e vazio. Ao invés disso, Ayer seguiu para um caminho mais fantástico para impressionar, dando para Esquadrão Suicida uma missão que caberia à Liga da Justiça.

CONCLUSÃO...
Aquele que poderia ter sido um dos melhores filmes do gênero, tanto quanto foi com Deadpool, consegue ser o pior de todos eles por justamente pegar personagens politicamente incorretos e darem a todos eles um gandre banho de moral. O resultado é um filme inerte e estúpido, que não consegue sequer fazer o mais simples: divertir.

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