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sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

VOVÔ SHERLOCK...

★★★★★★
Título: Sr. Holmes (Mr. Holmes)
Ano: 2015
Gênero: Drama
Classificação: 12 anos
Direção: Bill Condon
Elenco: Ian McKellen, Milo Parker, Laura Linney, Hiroyuki Sanada, Hattie Morahan, Patrick Kennedy
País: Reino Unido, Estados Unidos
Duração: 102 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Já idoso e aposentado, Sherlock Holmes tenta retardar a demência que o está fazendo perder a memória progressivamente e incapacitando-o de terminar um livro sobre um caso que o assombra há 35 anos, sendo incentivado pelo filho de sua Governanta, do qual se torna grande amigo.

O QUE TENHO A DIZER...
Esqueça o Sherlock Holmes de Robert Downey Jr., de Benedict Cumberbatch ou de Johnny Lee Miller, porque embora o filme aborde uma visão bastante diferente e interessante daquela que já temos construída do detetive, para quem espera uma trama de intenso mistério e suspense irá se decepcionar neste filme de Bill Condon, baseado no livro Sr. Sherlock Holmes (A Slight Trick Of Mind, 2005), de Mitch Cullin.

Condon e McKellen já trabalharam juntos no magnífico Deuses e Monstros (Gods And Monsters, 1998), no qual Condon chegou a levar o Oscar de Melhor Roteiro Adaptado, e McKellen concorreu como Melhor Ator.

Aqui, Holmes (Ian McKellen) está senil e com dificuldades de locomoção. Que volta para sua casa de campo no sul da Inglaterra para esperar a morte chegar enquanto se divide entre cuidar de seu apiário e dar continuidade aos seus experimentos caseiros na intenção de retardar a demência que progride, e que tenta esconder de todos.

Nesta versão ele é um detetive que se tornou uma personalidade conhecida por também ser um personagem de uma série de livros policiais que Watson escreveu, baseados nos famosos casos que investigaram juntos, livros os quais faz sempre questão de dizer que são mais frutos da exagerada imaginação literária de seu falecido amigo do que próximas dos fatos reais. Mas o desfecho fictício de um deles o deixa especialmente insatisfeito, já que é baseado no último caso que tentou resolver, e que foi a razão de ter se aposentado e buscado a reclusão (ou exílio, como ele diz). Para consertar o equívoco, há anos Holmes tenta reescrevê-lo, mas encalhou em um ponto porque, devido a sua sanidade mental comprometida, não consegue mais se lembrar com exatidão dos fatos, misturando a realidade com a versão de Watson.  A única coisa que ele se lembra é da dor e da culpa pelo caso não ter sido resolvido (talvez o único não resolvido, e por isso tão marcante), mas sua memória não consegue encontrar as evidências disso.

Então surge Roger (Milo Parker), filho da Sra. Munro (Laura Linney), governanta responsável por Holmes. O garoto insiste para que ele termine a história, e entre uma situação e outra, Roger consegue provocar Holmes ao ponto de fazê-lo puxar, aos poucos, memórias que se apagaram, mas não sumiram. E conforme a história é relembrada, o mistério em torno dela é revelado. O mistério é até bem montado, mas tudo muito leve e nada impactante demais.

É inegável que a grande atração é Ian McKellen, um daqueles tipos de atores que não se discute a qualidade até mesmo em filmes ruins (embora não me lembre de algum filme ruim com ele). Aqui ele brilha da mesma forma como Meryl Streep em A Dama de Ferro (The Iron Lady, 2011), principalmente por ser um idoso interpretando um idoso mais idoso que ele mesmo de uma forma tão convincente que só com os flashbacks durante o filme para sentir o alívio de saber que o vigor do ator de 76 anos ainda é o mesmo. E por ser convincente também é triste, porque o tempo não perdoa nem mesmo Sherlock Holmes. Milo Parker também impressiona com tanta naturalidade quando comparado com outros atores de sua idade que nitidamente representam da mesma forma que decoram, e juntando a experiência e técnica de um ator como McKellen, junto com a naturalidade quase espontânea de Parker, a química e relação entre eles se torna muito forte e verdadeira, emocionante até, porque Roger é, ao mesmo tempo, a infância que Holmes vê de si mesmo e o vislumbre daquilo que é agora.

Mas infelizmente o filme desanda em algumas partes que acabam diminuindo bastante sua qualidade como um todo, como a personagem mau desenvolvida de Laura Linney, que desde o princípio do filme se mostra sentimentalmente perturbada, inquieta, sempre desconfiada de alguma coisa que nunca sabemos de fato o que é. Existe uma complexidade nela que não se encaixa na história, deixando-a perdida e uma figura gratuitamente incômoda. O que sabemos é que ela está insatisfeita trabalhando para Holmes, mas seu comportamento exagera no tom. Sem falar da conclusão da relação entre os dois, depois que Holmes diz que seu testamento será designado a ela e Roger. Não foi uma decisão forçada, mas foi colocada em um momento errado, que fez a relação entre eles soar conveniente e oportunista.

Outra situação desnecessária é a viagem de Holmes ao Japão e sua relação com Tamiki Umezaki, que talvez tenha sido inserida para criar algum paralelo, ou alguma simbologia que nada agrega na história. E apesar de McKellen fazer uma memorável interpretação, nem seu personagem escapa de derrapadas, como o fato de Holmes estar com a memória comprometida, esquecer de fatos importantes da vida e de pessoas, mas lembrar com exatidão de nomes científicos sem nem ao menos engasgar. Ou até mesmo na parte final, em que demora pra ele descobrir o que realmente aconteceu com Roger, obviamente um momento de suspense criado para dar o ápice final à história, mas que não condiz com a perspicácia e observação do detetive, principalmente em um caso que, para ele, seria de resolução absolutamente simples.

Para compensar há essa interessante metainformação criada de que a imagem que temos de Sherlock Holmes é devido aos livros populares de Watson. E mesmo que Watson não apareça diretamente na história, é interessante a forma respeitosa como sua amizade e companheirismo é colocada. Confesso que foi o momento que mais me emocionei porque concluiu a relação e a admiração incondicional de ambos de forma muito simples, um dos raros momentos que o roteiro é certeiro.

Arrisco a dizer que, apesar de ser um filme mediano, McKellen desenvolve um trabalho excepcional que merece ser assistido e não decepciona, e que valeria presença em premiações. Mas somente por isso, porque se não fosse ele, o filme seria realmente ruim.

CONCLUSÃO...
Diferente da imagem aventureira e heróica de Sherlock Holmes, aqui pairamos um pouco sobre alguns de seus dramas e, principalmente, de um Holmes idoso e doente, que busca compreender o motivo de uma vida solitária, mas que não consegue por conta de uma memória que agora falha. Uma história interessante, porém mal desenvolvida, com algumas incoerências que deixamos até passar, mas que diminuem o resultado final e transforma o filme apenas em um espetáculo particular de Ian McKellen, e até do ator mirim Milo Parker, em algumas boas cenas entre eles.

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