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segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

ATENÇÃO: CONTEÚDO RECICLADO...

★★★★★★
Título: Guerra Nas Estrelas: O Despertar da Força (Star Wars: The Force Awakens)
Ano: 2015
Gênero: Ação, Ficção, Fantasia
Classificação: 12 anos
Direção: J.J. Abrams
Elenco: Adam Driver, Daisy Ridley, John Boyega, Harrison Ford, Carrie Fisher, Mark Hamill
País: Estados Unidos
Duração: 135 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
30 anos depois da morte de Vader e da destruição da Estrela da Morte, uma nova aliança do lado Negro surge para dar continuidade no domínio da Galáxia.

O QUE TENHO A DIZER...
George Lucas pode ser um dos piores diretores do cinema, mas ele é responsável por criar uma das sagas mais importantes, cultuadas e interativas da cultura pop de todos os tempos. A trilogia original deu certo muito mais por resultado de um sonho e de uma vontade que ele cultivava desde a infância do que simplesmente um produto comercial vazio como foi a pré-trilogia (os três episódios que antecedem a história da trilogia original). É inegável que o que Lucas criou possui uma diversidade infinita que ganhou vida própria, de quase domínio público, já que boa parte de sua expansão se deve pelas ferramentas que Lucas ofereceu às pessoas para que elas mesmas pudessem imaginar suas próprias histórias dentro desse universo, tanto que a saga é a que mais possui fanfictions (contos escritos por fãs) em todo o mundo.

A trilogia original cativa por diversos motivos, principalmente por defeitos e improvisos exigidos pelo baixo orçamento que os incentivaram a criar o visual com poucos recursos e que, sem querer, se tornou a identidade máxima e única da saga, elevando o status daquilo que conhecíamos sobre o cinema e sua capacidade de nos levar para mundos inimagináveis. E hoje ela é, com toda propriedade, referência em tudo relacionado ao gênero e ao entretenimento.

Lucas conseguiu juntar todos os clichés possíveis dentro de um enredo tipicamente maniqueista, e caracterizou em dois personagens principais o bem e o mal, sendo Darth Vader o lado negro e Luke Skywalker o iluminado da força. Ainda assim conseguiu surpreender com pouco, tanto que o momento em que Luke descobre que Leia é sua irmã gêmea à beira de cometer um incesto, ou que Darth Vader é seu pai à beira de cometer um patricídio são, ainda hoje, considerados umas das maiores revelações do cinema, por mais banais e absurdas que pudessem parecer em outras situações. Não é à toa que a saga é considerada uma novela espacial, pois é recheada de momentos escandalosos, personagens caricatos e reviravoltas típicas de literatura de banca, mas que deixaram o público perplexo justamente por terem sido elementos óbvios, mas inesperados. 

Agora a intenção é dar continuidade à cronologia original da série, cuja pré-trilogia se tornou algo praticamente esquecível quando resolveram abolir animatronics, cenários, maquetes e miniaturas na elaboração de efeitos especiais. Lucas afirmou na época que o futuro do cinema seria sua completa digitalização, e assim ele o fez, evidenciando mais ainda sua incompetência como diretor por escolher o caminho mais simples e fácil, ao invés do mais trabalhoso e tradicional. Soma-se a isso o roteiro raso, personagens irritantes e insossos (como Jar Jar Binks e o próprio Anakin Skywalker), além da incapacidade de Lucas em dirigir seus atores. Tanto que Natalie Portman chegou a afirmar que participar da pré-trilogia quase arruinou sua carreira porque depois dele nenhum diretor queria contratá-la por conta da péssima repercussão que teve.

É difícil, por vezes, aceitar que Star Wars seja agora uma sequência de filmes que não terá fim, porque aquilo que outrora foi um produto do acaso e que se expandiu espontaneamente na cultura popular, agora é um mero caça níqueis que necessita colocar o produto, a marca, em rotação no mercado. Foi por isso que, em 2012, Lucas finalmente resolveu vender seu legado à Disney porque, a grosso modo, se convenceu de que seria incapaz de dar continuidade a ele, como ficou claro com a pré-trilogia. E em menos de seis meses a Disney já tinha um cronograma para todos os principais lançamentos de sequências e spinoffs da marca para os próximos 10 anos e os profissinais anexados a eles. Ou seja, produção industrial em massa.

O Despertar da Força é resultado disso, além do esforço de resgatar o prestígio da franquia (que foi perdido com a pré-trilogia) ao mesmo tempo que tenta reapresentá-lo para as gerações atuais. Claro que também deve-se dizer que é um aguardado agrado aos mais devotos fãs, ou apenas um nostálgico momento para aqueles que cresceram tendo a tripulação da Millennium Falcon como seus heróis de infância. Mas por ser agora um produto da Disney, lembre-se de que tudo será mais bonitinho, e nem haverá mais espaço para qualquer alienígena de três peitos, como houve no passado.

A responsabilidade do filme foi dada ao diretor J.J. Abrams, que também produziu e dividiu o roteiro com Lawrence Kasdan e Michael Arndt. A título de curiosidade, Kasdan também foi responsável pelo roteiro dos episódios V (1980) e VI (1983) da franquia, além dos dois primeiros filmes de Indiana Jones. Portanto, é óbvio que sua escolha é providencial, mas questionável porque ele deve ter atuado apenas como consultor, e não como um roteirista de fato.

O filme começa trinta anos após os incidentes do último episódio, quando a Estrela da Morte foi destruída. Luke está desaparecido, e com o que restou do Império, formou-se a Primeira Ordem, cujas intenções são descobrir o paradeiro de Luke e destruí-lo junto com a República para que o lado Negro domine a Galáxia muito-muito distante.

Não há como não se emocionar com a antológica abertura liderada pela trilha sonora clássica de John Williams. Mas é logo nas primeiras cenas que percebemos como George Lucas estava redondamente enganado ao afirmar que o futuro do cinema seria sua completa digitalização. Não existe nada que substitua a sensação de ver um objeto real em cena, ou atores interagindo com um cenário verdadeiro, nem mesmo a mais alta tecnologia. Foi pensando nisso que Abrams fez questão de usar a computação gráfica (CG) apenas para o estritamente necessário, dando ênfase no uso de elementos clássicos na produção dos efeitos especiais justamente para tentar manter a mesma estética da trilogia original. O resultado disso são cenas limpas, cenários claros, ricos em detalhes que apenas o trabalho mais braçal seria capaz de proporcionar. O uso dos efeitos especiais é usado de forma tão correta e determinada que por vezes é difícil saber o que é digitalizado ou não, e até mesmo quando alguns raros personagens inteiramente feitos em CG aparecem (como a personagem Maz Kanata), eles não incomodam porque não são constantes e também porque interagem perfeitamente com os demais de diferentes espécies, tendo espaço até para a volta daqueles que parecem feitos de massinha de modelar.

Mas se a produção acertou em cheio na composição de cenários e cenas, a história acaba não sendo tão intensa ou bem construída como deveria. A sensação que se tem é que assistimos um remake em forma de resumo da trilogia original. Toda a história desenvolvida neste universo parte, desde o princípio, da unidade familiar construída (ou destruída) por Anakin Skywalker e da relação antagônica e patricida de Luke com Vader, e é claro que neste filme a abordagem partiria do mesmo ponto, mas seu desenvolvimento acaba se tornando uma repetição do mesmo tema com personagens diferentes. É até interessante a forma como indiretamente inserem a situação de que os herdeiros reproduzem os erros de seus antepassados, mas trazer à tona uma situação parecida novamente tem apenas a intenção reciclar uma mesma história para que a geração atual possa acompanhar facilmente, enquanto os demais não terão a verdadeira impressão de que três décadas se passaram e muita coisa mudou desde então.

Aquele misto de ação e alívio cômico da trilogia original também está longe de ser resgatado aqui, com excessão de um ou outro personagem que acaba fazendo alguma diferença, como o jeito canastrão de Hans Solo (Harrison Ford) e a literalidade de Chewbacca, sem dúvida a dupla é a única coisa que realmente dá uma elevada no tradicional humor da série. Tem também a expressividade de BB-8 que, por sinal, muito parecida com a de Wall-E. Mas a tentativa de fazer de Finn (John Boyega) um personagem cômico, talvez uma reprise de Lando, é decepcionante, sua histeria, excesso de piadinhas prontas e um falso heroísmo pra impressionar a garota deixam ele mais próximo da chatice de Jar Jar Binks do que qualquer outra coisa. Uma pena.

Diálogos também não ajudam, a maioria são frases óbvias ou sem qualquer conteúdo para preencher vácuo em cena e justificar a presença do ator, não há um diálogo que realmente seja consistente, nem mesmo entre Hans e Kylo (Adam Driver), o momento ápice do filme. O diálogo entre Leia (Carrie Fisher) e Hans também chega a ser desconfortável. Quando os dois aparecem em cena pela primeira vez é emocionante pois é automática a lembrança que temos de dois personagens que fizeram parte de uma épica batalha espacial enquanto desenvolviam uma calorosa relação em meio a flertes e alfinetadas, mas o que vemos é simplesmente um bate-papo de dois sexagenários que nem parecem se conhecer mais. O absurdo desses diálogos chega ao cúmulo de uma nave ser atingida por um míssil em meio a um ataque, e logo em seguida um dos pilotos diz ao outro "CUIDADO COM OS ANTIAÉREOS". Bom... é óbvio, não é? Qualquer piloto de um caça deve ter cuidado com antiaéreos, principalmente em meio a uma guerra. Mas isso na verdade se chama EXTENSÃO DE PIADA.

Na tentativa de insistir que um grupo da audiência entenda uma piada, é necessário extendê-la. Algumas piadas já são visualmente explícitas, mas caso alguém tenha perdido a deixa, algum personagem tem que fazer algum comentário sobre ela, como a exigir a gargalhada da platéia. É sempre horrível quando isso acontece, diferente da trilogia original, onde muitas vezes apenas o olhar de Hans já dizia mil coisas engraçadas. Até porque quando extensão de piada acontece, significa que a piada não é boa.

Logo, diálogos tão forçados quanto as relações construídas entre os personagens. Se no Episódio IV demora praticamente o filme todo para que Luke consiga conquistar a confiança de Hans, neste filme basta um sorriso camarada para ser amigo e parceiro de qualquer um. Se você tiver boa mira, então, já é praticamente irmão! Como acontece entre Poe (Oscar Isaac) e Finn logo nos primeiros minutos.

Não adianta. Para uma franquia que voltou com força total e sem previsão para fim, tudo acontece numa rapidez desnecessária. Nem mesmo a heroína consegue escapar desse desenvolvimento expresso, aprendendo em poucos instantes tudo o que Luke demorou três filmes para amadurecer com Obi Wan. O que acaba fazendo dela até uma metáfora da juventude de hoje, que consome tudo com tanta pressa que nem há tempo para digerir.

Digam o que disserem, mas nada disso é convincente, apenas forçado.

Talvez a intenção de Abrams tenha sido querer agradar todo mundo, o que pode valer para os fãs mais invictos, mas não aqueles que realmente esperavam uma verdadeira continuação e não uma reciclagem de idéias anteriores. Na trilogia original Lucas conseguiu fazer bom uso de situações clichés e tramas folhetinescas, mas aqui o uso dessa mesma fórmula ficou redundante e desatualizada. Não é erro dele como diretor, mas como roteirista, até porque Abrams é muito correto na condução. Quem assistiu seus filmes anteriores como Super 8 (2011) ou Star Trek (2009) sabe que ele bebe muito do mesmo copo de Spielberg, tanto que em vários momentos a impressão que se tem é de ver um filme de Spielberg pela constância de objetividade ou de ênfase nas tomadas, das quais muitas chegam a ser até idênticas a de alguns filmes do outro diretor. Claro que isso não chega a ser um defeito, mas acaba se tornando um filme padrão, com pouca personalidade.

Não é um filme ruim, mas poderia ser mais consistente, e isso é o que o impede de ser um grande despertar da franquia. É apenas divertido, nostálgico e mais um para preencher a prateleira de souvenirs especiais porque todos os elementos do universo criado por Lucas estão respeitosamente em seus devidos lugares. Há batalhas, muitas perseguições espaciais, explosões e sabres de luz. O que desagrada em consistência, agrada em conteúdo. Visualmente é aquilo que a pré-trilogia deveria ter sido, e se caso tivesse sido, seria memorável.

De qualquer forma é início de uma nova era que talvez amadureça e se engrandeça sozinha novamente. Será necessário esperar.

Menção honrosa: Aquele canhão gigante que destrói planetas e que rouba a energia do Sol... Uau! E todos ainda preocupados com a existência de um Jedi.

CONCLUSÃO...
Respeitoso e nostálgico, mas longe de ser consistente com tanta reprise de situações e uma rapidez desnecessária nos acontecimentos. Podia ter tido um roteiro melhor trabalhado, com diálogos mais polidos. De qualquer forma, os esforços de J.J. Abrams para resgatar a estética da trilogia original realmente funcionaram. Não é perfeito, mas pode ser um início para algo maior no futuro.

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