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quinta-feira, 25 de junho de 2015

RETROSPECTIVA: THE WALKING DEAD

★★★★★★★
Título: The Walking Dead
Ano: 2010
Gênero: Drama, Horror, Suspense, Ação
Classificação: 14 anos
Direção: Vários
Elenco: Andrew Lincoln, Chandler Riggs, Steven Yeun, Norman Reedus, Melissa McBride, Lauren Cohan, Danai Gurira
País: Estados Unidos
Duração: 47 min.

SOBRE O QUE É O SERIADO?
Um policial acorda de um coma e vê o mundo em completo caos. Tudo está diferente de como ele lembrava, incluindo sua própria família e ele mesmo. Agora ele terá que sobreviver no meio de uma guerra que não parece ter fim, e quanto mais se buscam soluções, mais difícil e inóspito o mundo se torna.

O QUE TENHO A DIZER...
Há alguns meses antes da estréia da sexta temporada, achei interessante fazer uma retrospectiva.

Lançada em 2010 e criada por Frank Darabont, é baseada em uma série gráfica homônima criada por Robert Kirkman e ilustrada por Tony Moore, publicada originalmente em 2003.

A primeira temporada foi limitada a apenas seis episódios para testar a audiência, discreta e dentro dos 5 milhões de pessoas. Número aceitável para garantir os treze episódios da segunda temporada que superou as expectativas da primeira. E o mesmo aconteceu nas temporadas seguintes, que agora possuem 16 episódios.

Com o espantoso e recorrente aumento da audiência, a quinta temporada chegou ao impressionante número de 17 milhões de pessoas, um recorde absoluto na história dos canais à cabo e que definitivamente posicionou a série no topo das produções mais comentadas no mundo, o que tem garantido sua renovação ano após ano, ao ponto de David Alpert, produtor executivo, afirmar que já sabem que rumos dar às temporadas 11 e 12, caso tenham a sorte de chegar lá.

Que a adaptação desbravou o horror na televisão, isso é verdade. Tanto que, após sua consolidação, diversas outras emissoras investiram no gênero, mas é ingenuidade acreditar que o material seja original, tanto da adaptação, quanto do material gráfico. Ambos bebem de fontes já conhecidas do cinema, como a Hexologia dos Mortos, de George Romero, ou dos filmes Extermínio (28 Days Later, 2002), de Danny Boyle, e sua continuação muito bem sucedida e elogiada, dirigida por Juan Carlos Fresnadillo. Tanto é assim que Danny Boyle ainda cogita na possibilidade de uma terceira continuação, mas evita falar sobre isso pois tem medo do seriado utilizar qualquer idéia que escape, já que fazem isso o tempo todo.

A história de Rick Grimes, que acorda de um coma em meio a uma pandemia, não é nova. Qualquer semelhança com Extermínio, não é mera coincidência. A diferença é que no filme de Boyle não são zumbis, mas pessoas contaminadas com um tipo de raiva humana.

Rick é um policial casado com Lori, com quem tem um filho chamado Carl, uma criança que se espelha totalmente em seu pai ao mesmo tempo que se conflita com ele, numa relação mais freudiana e previsível possível. Há até uma tentativa de Carl em cometer um fatricídio, mas que felizmente não se concretiza, pois é esse o gancho dramático que tem que existir entre eles. Assim como o eixo dramático com Lori será a relação paralela que ela tem com Shane, o melhor amigo de Rick.

Carl vê em seu pai o exemplo de herói invencível e absoluto por conta de símbolos que ele carrega, como o chapéu, a estrela do distintivo e a arma, objetos que representam com bastante força a seriedade, o senso de justiça, a autoridade e o poder não apenas em Rick como um policial, mas também como figura paterna. Rick, por sua vez, se esforça para passar essa imagem segura a sua família. Por conta disso, Carl irá se conflitar constantemente com Rick porque tentará a todo momento prová-lo de que também consegue ser tudo isso, naquele constante esforço infantil de realizar atitudes grandiosas e ser reconhecido por elas. Por serem atitudes prematuras e inexperientes, muitas vezes colocam a vida de sua família, além da sua própria, em risco, gerando mais motivos para repreensões do que orgulho. Junta-se a isso o ambiente hostil e ameaçador, e Carl desenvolve no decorrer das temporadas uma personalidade mais fria e violenta, com leves traços de uma psicopatia que não sabemos se será desenvolvida pelos roteiristas, já que é um tema bastante complexo e que foi abordado com muita rapidez em uma personagem na quarta temporada, durante a fuga de Carol e Tyreese da Prisão.

Em torno disso há os personagens coadjuvantes que servem para dar consistência em uma história que não poderia simplesmente acontecer em torno de uma família. E durante a peregrinação de Atlanta para Georgia, Rick conhecerá dezenas de pessoas, das quais algumas se tornarão aliadas imprescindíveis para derrotar a extensa lista de inimigos que ele colecionará durante sua jornada de sobrevivência.

Muitos personagens entram e saem da história, às vezes, de maneira bastante aleatória. Alguns a morte já estava prevista na série gráfica, mas os roteiristas passaram a utilizar esse elemento com muita frequencia para dar espaço a personagens novos na errônea idéia de que renovar a série é trocar constantemente o elenco, mesmo que os dramas se repitam.

E repetem muito.

Essa recorrente substituição de personagens deixa de ser um fator surpresa para se transformar em algo previsível e por vezes revoltante, porque quando esses personagens passam a ganhar uma maior densidade, eles são retirados da história sem grandes justificativas. Portanto, quando personagens novos são apresentados, pode ter certeza de que alguns que já estavam na história irão desaparecer por algum motivo. Essa previsibilidade é, talvez, um dos pontos mais negativos.

No filme Extermínio 2 (28 Weeks Later, 2007), a história é construída de forma a criar empatias do espectador com personagens que morrem prematuramente na história e efetivamente nos dão a mesma sensação de perda e desespero que os protagonistas sentem, e que não há possibilidades para o fortalecimento de laços frente aos perigos constantes e da imprevisibilidade da perda. Mas em Walking Dead, ao invés das mortes causarem este impacto dramático, elas passam a clara oportunidade da produção em liberar espaço no elenco para que o orçamento não estoure e os roteiristas consigam articular tramas mais facilmente. Essa situação é ainda mais feia com os personagens negros que, até a terceira temporada, sempre foram poucos e mal chegavam aos 10% do elenco. Quando um personagem negro era apresentado, era certo de que algum dos únicos dois que já estavam presentes na trama iria morrer. Foi uma situação tão feia que talvez seja por isso que, a partir da quarta temporada, o número de personagens negros aumentou consideravelmente. Mas ainda sim essas substituições são bem óbvias, como acontece também na quinta temporada, em que personagens morreram de forma até absurda simplesmente porque não tinham mais onde serem encaixados.

Como um todo, os personagens principais (ou que se tornaram principais no decorrer das temporadas) sempre agradam mais alguns do que outros, mas é bastante óbvio que Rick perdeu com o tempo seu senso de justiça e liderança, se tornando um personagem irritante, egocêntrico e paranóico por conta de tantas contradições entre aquilo que diz e aquilo que faz, principalmente sobre decisões extremas. Como é dito na quinta temporada, ele é um personagem que se importa com seus colegas, mas sempre coloca a vida deles em risco. Rick tem surtos e toma decisões erradas. Está tudo bem ele decidir matar alguns prisioneiros que ele desconhece numa atitude preventiva, mas ele friamente condena Carol quando esta tem uma atitude preventiva muito mais importante durante o surto de gripe na quarta temporada. Aliás, uma das reviravoltas dramáticas mais desnecessárias que o seriado teve, que não somente serviu para justificar um sumiço temporário da personagem para focarem em outras subtramas, mas também para desafogar o excesso de elenco, porque se o número de personagens aumenta drasticamente, um massacre na história é bem vindo.

Depois que a morte de mais da metade do elenco (recorrentes ou de apoio) foi justificada pela doença, o surto de gripe saiu da trama da mesma forma como entrou, e nunca mais falaram sobre isso.

Em contraponto, personagens que começaram fracos, como a prória Carol, ou aqueles que causavam desconfiança e desconforto, como Daryl e Michonne, se transformaram nos mais fortes e melhores construídos. Uma pena que Andrea teve um arco dramático muito mal desenvolvido na terceira temporada, e a sua relação com o Governador chegou a ser fraca, beirando o ridículo. Não foi nada convincente vê-la voltar para os braços do vilão mesmo depois de descobrir todo o lado perverso dele, ou simplesmente não encontrar uma forma de fugir de Woodbury e efetivamente ajudar seu grupo na Prisão. A personagem foi completamente destruída por grandes erros do roteiro quando ela era uma das que mais poderiam ter se destacado no futuro tanto quanto se destacou na segunda temporada.

Mas felizmente Daryl e Michonne conseguiram despertar uma empatia tão forte que se algum deles for morto em alguma temporada futura, será o suicídio do seriado. O trabalho desenvolvido pela atriz Danai Gurira é excepcional, e a lenta descoberta de seu passado doloroso causa a mesma sensação de surpresa e compaixão que é tida pelos personagens. O relacionamento que ela desenvolve com Carl e o vínculo de fidelidade que ela cria com Rick são verdadeiros, e não há melhores momentos do que aqueles em que ela dialoga ou está feliz, raras situações que quebram completamente sua imagem pesada, muda e solitária, onde podemos ver que embaixo de várias camadas emocionais fortes que a protegem da dura realidade que enfrenta, há uma pessoa bastante solidária, fiel, delicada e até mesmo engraçada. É sempre emocionante vê-la em situações de impactos mistos, pois a atriz consegue elaborar toda essa complexa construção sem exageros ou apelo cliché. E Daryl, interpretado por Norman Reedus, se sucede da mesma forma, embora o conflito que ele tenha seja maior com ele mesmo do que com qualquer outro.

Também é interessante a mudança de comportamento dos personagens no decorrer dos episódios, como Carol, Maggie ou Sasha, que se embrutecem e encouraçam suas personalidades conforme veem amigos e parentes morrerem um a um, ou quando percebem que os vivos são muito mais perigosos que os mortos. O massacre que ocorre na Igreja, durante a quinta temporada, é a definição mais próxima de como a constante exposição a ambientes hostis podem liberar os lados mais obscuros das pessoas a favor da sobrevivência.

Em hipótese alguma podemos negar qualidade na produção. Desde a primeira temporada, em que o orçamento era muito mais limitado, Frank Darabont conseguiu desenvolver um projeto ousado com um nível de qualidade cinematográfico, e mesmo depois que ele foi demitido por divergências criativas, o mesmo nível foi mantido. Os pontos altos seguem para as equipes visuais e sonoras porque, tanto quanto as histórias ou os personagens em si, o impacto do seriado e o interesse por ele não poderiam ser construídos sem esses quesitos técnicos que criam toda a atmosfera desse universo. A sensação apocalíptica chega a ser brutal e delirante, mas recheado de um certo exagero fictício às vezes difícil de engolir.

Todos os eventos entre a primeira e quinta temporada acontecem em um período de aproximadamente dois anos, o que não é um tempo suficiente para prédios, ruas e cidades inteiras estarem em ruínas. Um tempo muito curto para um cenário apocalíptico tão abrangente. São mortos vivos, não é um cometa que atingiu a Terra. Há falta água, de energia e de comida, mas nunca de munição. Durante a terceira temporada o que mais se ouve é que a munição está escassa, mas ela nunca acaba. Risos, risos.

Há também aqueles momentos em que situações são usadas aleatoriamente para tapar buracos evidentes na narrativa ou elementos usados pelos roteiristas simplesmente quando eles julgam necessários, sem levarem em conta o impacto que isso causa dentro do contexto, como Michonne utilizar os próprios zumbis para se disfarçar entre eles, ou posteriormente, quando descobre por acidente que coberta pelas entranhas dos mortos o resultado é o mesmo. Essa camuflagem simplesmente é esquecida na história, só lembrada novamente quando Carol retorna para atacar o Santuário. Nas outras situações, principalmente quando estão a caminho de Washington, os personagens se tornam burros demais ao preferirem enfrentar hordas de zumbis do que simplesmente usarem a camuflagem. Claro, se esse elemento fosse utilizado o tempo todo na história, o seriado não teria graça. Então melhor se a idéia nunca tivesse sido inserida, certo? Ou fosse aproveitada de alguma forma em situações como essa.

Para quem prestar atenção nesses detalhes e encontrar esses erros clássicos e clichés, irá nitidamente perceber potenciais desperdiçados. Novamente são erros de roteiro e incoerências que extrapolam os exageros aceitáveis, e apesar de tanto cuidado, no fim tudo impressiona, mas sempre naquela sensação de que a inteligência do espectador é subestimada. 

A proposta de Frank Darabont com a série era ser um drama apocaliptico, com elementos de horror e tramas centradas nas relações entre personagens e os esforços para sobreviverem em limites extremos. Com sua saída, tudo tomou um rumo diferente. Claro que alguns dramas pessoais e humanos ainda são importantes, mas hoje em dia, na idéia de que o mais sempre é mais, em que tanto o cinema e a televisão abusam do sensacionalismo para atrair a atenção, é perceptível como o seriado se tornou cada vez mais violento e gore com o passar dos anos, algo de fazer O Albergue (Hostel, 2005), de Eli Roth, parecer filme de comédia perto do suco de sangue da quarta e quinta temporada, as mais vista na história da televisão à cabo e as mais aclamadas. E é por isso que já podemos imaginar que os anos seguintes tentarão sempre superar o nível de violência dos anteriores, não importa se as histórias se repetirão ou se as fórmulas serão recicladas.

Não falo da explícita e brutal violência como se eu acreditasse que ela possa influenciar pessoas. Não acredito nisso. A preocupação é unica e exclusivamente sobre o produto. Quando um filme ou seriado tem suas potenciais qualidades ofuscadas pelo excesso de cenas brutais para atrair facilmente a audiência, há perda até mesmo do entretenimento para dar espaço à banalidade. Preocupante também quando as pessoas dão preferência por esse abuso gratuito do que a um roteiro mais relevante, sólido e melhor construído. Essa troca da qualidade pelo mero impacto visual leva a alienação.

É nítido que Walking Dead agoniza com seu próprio sucesso. A expectativa de fãs levam os produtores a exigirem que o seriado sempre se supere de alguma forma. Ele ainda consegue ser um excelente entretenimento por conta de suas qualidades visuais e quesitos técnicos que, para um programa de televisão, são de cair o queixo. Mas tem que ter paciência. A repetitividade de tramas paralelas, como as constantes crises de Rick sobre a educação de Carl, ou nas decisões conflitantes que colocam à prova sua liderança, chegam a ser cansativas. Muitos personagens se tornam chatos e irritantes por conta desse vai e vem de situações que se concluem, mas voltam a se repetir em algum momento. Às vezes é recorrente desejar que a história mate esses personagens logo, e ao invés de ser empolgante, isso é desanimador porque fica óbvio que eles deixaram de funcionar.

O grupo foge, é atacado. O grupo se abriga, e é ameaçado. Há sempre um grande vilão que quer encarcerá-los ou matá-los de alguma forma. O episódio na Fazenda, o ataque ao Presídio, a invasão a Woodbury, a guerra do Governador, o Santuário... todas são, no fundo, histórias que se repetem e só recebem um diferente acabamento a cada nova temporada, virando uma coisa manjada tanto quanto zumbis aparecerem de repente em uma janela ou atrás de alguém (situações que já até perdi as contas de quantas vezes acontecem).

A quinta temporada tentou retomar um pouco da essência da primeira e segunda, jogando os heróis novamente na estrada até se depararem com uma dúvida chamada Alexandria. Foi bom ver a história desacelerar por alguns episódios, vê-los bem instalados, com roupas limpas e respirando aliviados finalmente. Mas a sensação de que Rick irá sabotar tudo isso em algum momento por alguma decisão impositiva é constante. E sabemos que é assim que será.

Mas até quando isso irá funcionar, não sabemos.

CONCLUSÃO...
Walking Dead surgiu com uma proposta que mudou alguns conceitos na televisão, abrindo espaço para produções do gênero de terror. Há cinco temporadas os espectadores tem feito parte da vida de um grupo de pessoas que lutam para sobreviver em um mundo hostil em meio a mortos e vivos, transformando a vida e a personalidade de cada um deles tão profundamente ao ponto de esquecerem de como eram quando o mundo ainda não havia sido tomado por um vírus que liberou a pior essência de cada um. Personagens morrem conforme novos personagens entram, dramas se repetem e alguns conflitos parecem nunca se resolverem. Quanto mais longeva for a produção, mais do mesmo será feito, apenas com uma diferente roupagem. Há possibilidades para mudanças de rumo que agora se mostram necessárias, e a quinta temporada demonstrou bastante isso, com histórias mais consistentes e erros menos graves do que os que aconteceram na terceira e quarta temporada. Ainda diverte, assusta e causa tensão, grande parte disso por conta da efetividade técnica, do capricho na produção visual e de alguns poucos personagens bastante consistentes que conseguiram ganhar maiores densidades e destaques do que os próprios personagens principais. Até quando os clichés e a repetitividade irá funcionar sem deixar aquele gosto de comida requentada é uma incógnita, mas é possível aproveitar bastante até lá.

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