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quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

NÃO DESCE NEM COM GRAVIDADE...

★★★★
Título: Interestelar (Interstellar)
Ano: 2014
Gênero: Drama, Ficção Científica
Classificação: 14 anos
Direção: Christopher Nolan
Elenco: Matthew McConaughey, Anne Hathaway, David Oyelowo, Michael Caine, Matt Damon, Jessica Chastain
País: Estados Unidos
Duração: 169 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
A Terra se voltou contra os próprios humanos, as plantações morrem e tudo está sendo tomado pela poeira. A única alternativa para preservar a vida humana é enviar um aposentado piloto da NASA para sua última missão espacial que não terá qualquer perspectiva de volta.

O QUE TENHO A DIZER...
"O universo é cheio de fatos facinantes. Cheio de coisas impressionantes para contemplar como, por exemplo, o tamanho de nossa Galaxia. A luz viaja a 300.000km/s e mesmo assim demora 100.000 anos para um simples feixe atravessar toda a Via Lactea. Nossa Galaxia, como bem disse Carl Sagan, é apenas uma entre bilhões e bilhões. A imensidão do espaço é inimaginável".

Esse trecho acima, de outro comentário publicado sobre o filme, resume muito do que Interestelar deixa de ser. Toda a imensidão do universo e suas belezas admiráveis são coadjuvantes. É como ter Sex And The City sem Nova York, Ginger Rogers sem Fred Astaire, ou Gravidade sem Sandra Bullock.

Dirigido, escrito e produzido por Christopher Nolan. O roteiro é em parceria com seu irmão Jonathan. É uma ficção científica dramática espacial que discutirá, dentre várias coisas, viagem no tempo, física quântica, dimensões paralelas e o futuro da exploração espacial. O diretor acabou incluindo o físico teórico Kip Thorne na produção para servir como consultor sobre o tempo espacial, já que é o tema mais recorrente no filme. Dessa forma ele manteria as reproduções sobre o Buraco Negro ou sobre o Buraco de Minhoca os mais próximos possíveis daquilo deduzido na intenção de serem criados e mostrados no filme com base na ciência e não na imaginação dos roteiristas.

Assim como Nolan fez em seus filmes anteriores, como na trilogia Cavaleiro das Trevas e no superestimado A Origem (2010), há referências bastante diretas de outros filmes, como Wall-E (2008), Contato (Contact, 1997), Alien (1979), e claro, 2001 (1968), que evidentemente é uma regra referencial em toda ficção científica que se preze.

O que os roteiristas fazem é pegar os elementos mais importante de cada um desses filmes (e outros também), juntar tudo em uma coisa só e dar uma nova roupagem. É exatamente o mesmo processo criativo que Nolan utilizou em A Origem, que na verdade é uma cópia bem modificada de Matrix (1999).

Toda a produção foi mantida em sigilo contratual, ninguém envolvido na produção poderia comentar sobre o filme. Essa é uma velha tática do cinema para aumentar aquilo chamado de "buzz" e superlotar as salas de cinema para arrecadar na bilheteria o valor mais próximo possível de seu orçamento logo na estréia. Tudo isso aconteceu, e as pessoas compraram muito bem toda a idéia um tanto desnorteada e sem a mesma desenvoltura narrativa da trilogia do diretor sobre o homem morcego. Tanto que Interestelar tem hoje uma pontuação média de 8.6 no IMDb, com mais de 430 mil avaliações. Como bem disse Rubens Ewald: "O espectador ocasional é que decretará a sentença (do filme ser bom ou ruim). Preguiçoso como ele costuma ser". E a preguiça é no fato do público leigo ou ocasional pouco se importar em analisar os pormenores daquilo que assiste e também pelos fãs se deixarem levar pela extrema parcialidade. Essa pontuação é (pasmem) maior que de seu antecessor mais próximo, Gravidade, no qual Interestelar tenta ser visual e tecnicamente bastante similar, mas está anos luz de ter o mesmo grandioso impacto e ser o mesmo grandioso espetáculo.

O filme começa muito bem e muito ruim ao mesmo tempo. Inicia num tom meio documentado por conta de alguns depoimentos que deixam um suspense meio obscuro no ar, além de toda a ambientação rural norteamericana e as casas vulneráveis nos milharais ajudarem na ambientação distópica e um tanto sinistra. Essa atmosfera inicial é muito parecida com a que M. Night Shyamalan fez em Sinais (Signs, 2002), naquela sensação de que parece que os personagens estão sendo observados o tempo todo, de que algo está próximo, mas não se vê. Até a trilha sonora com poucas variações, baixa e constante ao fundo pra deixar a atenção do espectador mais desperta é utilizada da mesma maneira. Mas nada incomoda, tudo é feito muito bem e se fosse pra ser um filme de terror, ele teria começado de forma brilhante.

Mas aí algumas gafes começam a aparecer logo nos primeiros vinte minutos de filme, como o personagem de Matthew McConaughey ter diversas colheitadeiras gigantes e automáticas, mas sem qualquer explicação (nenhuma mesmo), elas deixam de realizar o trabalho programamado para terem vontade própria, como um poltergeist, só pra causar um frisson paranormal que não existe. Depois disso o protagonista descobre uma base ultra secreta que ninguém poderia achar. Ninguém! Ele pergunta o que é tudo aquilo mesmo com uma bandeira gigantesca escrita em letras garrafais "NASA", bem do seu lado direito. Outro problema é que o filme se passa em um futuro onde a tecnologia é tão evoluída que o protagonista consegue invadir o sistema de um drone militar e dominá-lo com apenas um touchpad, mas um dos integrantes da equipe da NASA custa a acreditar que alguém pudesse encontrar a base ultra secreta situada ao ar livre no meio de uma planície. Então pra este caso vamos julgar (apenas julgar) que o Google Earth ainda não tivesse sido inventado no futuro do filme. Aí tem a NASA, que dispõe de umas caixas de fósforo gigantes que eles chamam de robôs, que se locomovem como se estivessem sobre muletas quando um par de rodinhas podia ter facilitado muito a vida dessas máquinas e da equipe de efeitos especiais porque é pra isso que a roda foi inventada. Mais engraçado é que, quando o personagem se apresenta, todos da equipe sabem que ele foi um antigo piloto da NASA, mas todo mundo faz boquinha de siri e trata ele como um meliante só pra ter aquele momento "TE PEGUEI EM HOLLYWOOD, VAMOS PARA O ESPAÇO".

Sério, tudo isso em menos de 20 minutos...

Para um filme que quis ser muito sisudo, todas essas pequenas faltas de atenção chegam a ser ultrajantes, diminuindo bastante sua credibilidade pra quem é mais atento, e toda a excelente ambientação do início é logo esquecida. A partir daí o filme deixa a atmosfera Shyamalan de lado pra entrar na ficção científica de fato, o que é sempre um grande desafio.

Há um risco muito grande em falar sobre algo que se desconhece. Sobre o que desconhecemos, ou deduzimos com bases científicas, ou inventamos com base na imaginação. No caso desse filme, Nolan deduz e se baseia em teorias científicas apenas quando o filme precisa apertar o passo pra se resolver, e inventa a maioria das coisas na maior parte do tempo com muita pouca coerência com a realidade para preencher minutos extras. Inventa e inventa feio! Inventa rude com explicações que explicam nada porque ninguém vai entender metade do que eles teorizam em cena. Quando o roteiro para de inventar, ele cai no melodrama, como na cena em que o protagonista discute com a personagem de Anne Hathaway qual a melhor decisão tomar entre os planos A e B. Outra coisa que se percebe é que, como dito acima, toda essa imensidão do universo é desperdiçada em subtramas paralelas que se passam na Terra para evidentemente encomizar nos efeitos especiais e dar saltos temporais na ambientação espacial.

Tudo se torna uma bagunça que pode ter algum certo fundamento para os aspirantes a físicos quânticos espalhados por aí, mas para a audiência leiga é tudo simplesmente um festival impressionante de "qualquer coisa no espaço". 

Os personagens muitas vezes não fazem sentido, como a rebeldia interminável da filha do protagonista, a resolução extremamente banal do personagem de Matt Damon que entra e sai do filme como se tivesse no início de carreira, ou a incrível determinação do protagonista em querer salvar a humanidade a qualquer custo (a figura do "pai herói", também sempre explorada nos filmes de Shyamalan). Se o fim do mundo fosse inevitável e você tivesse que escolher entre salvar a humanidade ou passar o resto desses dias com o que resta de sua família, o que você faria? É uma pergunta bastante complexa que o protagonista em momento algum pensa a respeito.

Acredito que nada dói tanto quanto os exageros espaciais e clichés do gênero como as viagens que eles fazem entre um planeta e outro como se fosse algo do tipo "OK, vamos dar uma paradinha lá no shopping". E claro... o combustível que sempre está no fim no trajeto da volta. O momento "let it go", bem similar ao de Gravidade também deixa nítido que, direta ou indiretamente, a produção tenta pegar carona no sucesso do colega. Mas nada é tão impressionante como tudo ser resolvido e descoberto no último minuto, até as mais absurdas e inacreditáveis coisas, como as feitas pela personagem de Jessica Chastain.  E mais... se os humanos do futuro ficam tão poderosos ao ponto de conseguirem controlar o poder da gravidade como cordas de piano entre as diferentes dimensões, como é que não fizeram isso para evitar a Terra de se voltar contra os humanos do passado? Pensando nas teorias que o próprio filme mostra, seria tudo super simples assim, não é? Pois é... mas Nolan prefere complicar pra enganar tonto. E é por essas razões que eu passei a maior parte do filme me questionando: "Isso é sério mesmo?"

Na narrativa confusa, nos altos e baixos dramáticos pra tentar manter o espectador atento e um final bastante sentimental do jeito que o cinema Hollywoodiano está acostumado a fazer, muita gente vai terminar o filme com lágrimas e sem ar, igual quando Titanic foi lançado, mas depois de alguns dias é muito provável que a ficha caia no fato de que ele é uma das grandes bobagens de 2014.

De qualquer forma é um filme com algumas concepções visuais bem interessantes, mas a nuvem congelada... olha... aquilo é a gota d'agua, principalmente em um filme que fala incansavelmente sobre a física e a gravidade. Só não parei de assistir neste momento porque eu queria ver até onde a desgraça ia.

E foi longe. Nolan literalmente se perdeu nas idéias e acreditou no maravilhoso potencial da ignorância alheia de consumir bem qualquer coisa. O resultado é um filme desagradável, longo demais, que mais se perde do que se encontra, e desperdiça conceitos interessantes para divagar no absurdo para o bem do drama espacial e da redundancia.

CONCLUSÃO...
Christopher Nolan tem se especializado em dar grande complexidade desnecessária a seus filmes para enganar gratuitamente o espectador e faze-lo ter a sensação de que o assunto é realmente muito sério e complexo. 

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