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terça-feira, 19 de agosto de 2014

VIRA VILÃ, VIRA HEROÍNA...

★★★★★
Título: Malévola (Maleficent)
Ano: 2014
Gênero: Fantasia
Classificação: Livre
Direção: Robert Stromberg
Elenco: Angelina Jolie, Elle Faning, Sharlto Copley, Lesley Manville, Imelda Stauton, Juno Temple, Sam Riley
País: Estados Unidos, Reino Unido
Duração: 97 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Uma variação da história de A Bela Adormecida, dessa vez mostrada pelo ponto de vista da fada má, conhecida como Malévola.

O QUE TENHO A DIZER...
Malévola é o primeiro filme dirigido por Robert Stromberg, que já chegou a ganhar dois Oscars em Melhor Direção de Arte por Alice (Alice In Wonderland, 2010) e Avatar (2009).

O filme vai contar a história da Bela Adormecida pelo ponto de vista da fada má conhecida como Malévola, e se tem alguém que ainda não conhece esse conto de fadas da Disney é porque ainda não nasceu.

O que pouca gente sabe é que a versão que conhecemos é apenas mais uma variação de diversas versões e variações que a história sofreu durante os séculos. A primeira versão publicada é datada de 1528 e, da mesma forma, acredita-se que seja mais uma variação herdada de contos populares de origens desconhecidas. As versões mais famosas, além da versão da Disney, são as dos irmãos Grimm e a de Charles Perrault.

Tanto as histórias dos irmãos Grimm (sim, eles mesmos fizeram várias versões) quanto a versão de Perrault, são muito mais obscuras do que o conto de fadas adaptado pela Disney. Na versão de Perrault, a princesa chega até a ser estuprada por um rei, a engravidar e dar a luz, tudo durante o seu sono eterno que apenas é interrompido quando tem seu indicador chupado pela sua filha pequena, que suga a maldição injetada pela agulha da roca de fiar.

Não é possível ignorar o fato de que, mesmo tardio, o filme tenta pegar carona no sucesso de Branca de Neve e o Caçador (Snow White And The Huntsman, 2012) e pela rainha má do filme, vivida por Charlize Theron, ter chamado mais atenção do que a própria heroína e a história (lamentáveis por sinal). E é claro que depois de Shrek (2001/2004/2007) é impossível levar um conto de fadas a sério novamente e por essa razão a história mostrada aqui sofreu novas mudanças para se afastar da já conhecida e batida história da Disney, o que fica claro que Malévola é mais uma variação de diversas outras variações, sendo esta a pior delas, sem dúvida alguma.

A idéia principal é até interessante, e o alvoroço sobre o "retorno triunfal" de Angelina Jolie depois de quatro anos conseguiu alavancar o sucesso de bilheteria. Mas a verdade é que não há muita coisa que salve o filme de sua qualidade mediana, nem mesmo a própria atriz.

O filme começa com Malévola sendo apresentada como a fada das fadas, a única com as características que ela tem. Uma garota alegre, feliz, que mora em Moor, um território mágico e colorido almejado pelos homens comuns por conta de riquezas que o lugar esconde. Ela desconhece completamente a maldadade até se apaixonar por Stefan, um jovem plebeu do reino dos homens que a conhece quando criança e a beija pela primeira vez na adolescência, sumindo por anos depois disso. Com a promessa do rei de se tornar seu sucessor aquele que matar Malévola e o reino mágico ser conquistado, Stefan volta para a terra de Moors e, incapaz de assassina-la, arranca suas asas para provar ao rei sua vitória. Enganada, traída e usada, Malévola conhece o ódio pela primeira vez. É por esse ódio que toma conta que ela se torna a vilã que conhecemos. Bom... até certo ponto.

Malévola sempre foi, dentro do conto de fada da Disney, uma vilã sem passado para que julguemos que sua maldade seja uma característica nata. Dar um passado a ela agora deveria ter sido o foco principal e não apenas uma breve introdução. Por conta disso o filme já começa incoerente na forma como esse background doce e inocente do passado da personagem é apresentado, primeiro porque, sem qualquer razão de ser, ela é uma fada boa que possui fisionomia demoníaca e um nome que já carrega em si o significado da maldade. É a mesma coisa que ir pro céu e o anfitrião dizer "Bom dia, meu nome é Satanás". Ou seja, não cola. Não dentro do mundo perfeito e dicotômico da Disney. Frente a tantas mudanças estruturais que a história sofreu, teria sido mais coerente se a imagem da personagem tivesse passado por uma transformação resultante dessa força obscura que lhe tomou conta, e Malévola um pseudônimo adotado para representar toda mudança de caráter. 

Essa insistente mania de Hollywood em vitimizar vilões ou antagonistas para provar que a maldade pode ser transformada e assim morais sejam pregadas, exemplos negativos sejam evitados e apelações dramáticas existam, são os grandes inimigos de qualquer história quando utilizados de forma tão banal como é aqui, porque para Malévola ser personagem principal de um filme ela precisa ser uma heroína, mas como fazer isso com alguém que classicamente é uma das maiores e mais relembradas vilãs dos contos de fada? Dêem a ela o remorso e o arrependimento e assim de vilã ela vira heroína, o mais velho brinquedo da Disney.

A inabilidade do diretor, bem como o roteiro bem aéreo, não souberam ser hábeis o suficiente para dar uma maior percepção de passagem de tempo e profundidade na história, além de outras situações esquisitas como o reino humano e o reino mágico viverem em constante conflito, mas quando princesa Aurora nasce, mesmo sabendo que Malévola ainda vive, o rei Stefen não apenas convida as fadas de Moor para a festa como elas são incumbidas de cuidarem da criança. Ok, isso faz parte dos contos que conhecemos, mas é encaixado com esforço no meio dessa história. Esse é talvez o maior e mais incoerente buraco.

Realmente faltou uma evidente atenção no roteiro, isso porque ele foi escrito por Linda Wooverton, que no passado escreveu os excelentes A Bela e a Fera (Beauty And The Beast, 1991) e O Rei Leão (The Lion King, 1994), ambos da Disney. Explorar a imagem da atriz pode ter ajudado o filme, e a atenção visual dada pessoalmente por ela durante a produção também fizeram grandes diferenças na personificação da vilã, mas isso apenas não basta, até porque a presença de Angelina é sempre muito forte, mas ela nunca foi mais atriz do que estrela. Nem mesmo houve cuidado com os efeitos especiais que mais parecem uma animação mal feita em muitas vezes do que algo grandiosamente competente, como visto em O Senhor dos Anéis, por exemplo. Isso porque uma das experiências profissionais no currículo do diretor é como Supervisor de Efeitos Visuais.

Poderia ter sido um filme memorável e muito mais grandioso do que é caso não tivesse sucumbido às hoje antiquadas filosofias da Disney sobre suas produções, além de ainda acreditarem que a imagem de Jolie compensa um roteiro mal acabado. O resultado de tudo é apenas uma oportunidade para a atriz novamente ser caricata, usar seu horroroso e falso sotaque britânico e mostrar que o que ela realmente gosta é de personagens sombrias.

CONCLUSÃO...
Não vai fazer diferença para o público infantil, mas se a intenção foi de também conquistar o público adulto, ele falha com muita certeza. Apenas os fãs da atriz serão capazes de inventar qualidades para o filme que, em sua essência, pode até ter um ou outro momento, mas não cheira e nem fede, além de estar longe de ser uma variação relevante de um dos contos mais famosos do mundo.

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