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sábado, 14 de junho de 2014

MENOS PODERIA SER MAIS...

★★★★★★★
Título: Em Segredo (In Secret)
Ano: 2013
Gênero: Drama, Suspense
Classificação: 14 anos
Direção: Charlie Stratton
Elenco: Elizabeth Olsen, Jessica Lange, Tom Felton, Oscar Isaac
País: Estados Unidos
Duração: 107 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Therese é casada com seu primo, filho de sua tia, irmã de seu pai. Ela vive infeliz amorosa e sexualmente até conhecer Laurent, amigo de infância de seu marido.

O QUE TENHO A DIZER...
O filme é dirigido e escrito por Charlie Stratton, sendo esta sua estréia em longas metragens, e baseado no livro Thérèse Raquin (1897), de Émile Zola. A obra foi repudiada pela crítica da época devido a seus elementos naturalistas, estilo que radicaliza ainda mais o realismo, abordando temas verdadeiros e recorrentes - porém ocultos - na sociedade, como o sexo, a loucura, o concubinato, e demais outros em que os personagens fossem dominados por instintos e desejos naturais de forma erotizada, agressiva e até mesmo violenta.

Portanto, a história tanto do livro quanto do filme vai se desenvolver em torno da personagem princial, chamada Thereze (Elizabeth Olsen), que foi deixada por seu pai, ainda menina, aos cuidados de sua tia paterna (Jessica Lange). Seu pai a deixou com uma determinada quantia de dinheiro destinada apenas a ela caso necessário. Ela cresceu cuidando de seu primo doente, Camille (Tom Felton), e auxiliando sua tia nos deveres domésticos até atingir a maioridade e aceitar o fato de que seu pai nunca mais voltaria. Sua tia então decide casá-la com seu primo, para que o dote deixado pelo pai de Thereze possa ser usurpado por eles. Eles se mudam para Paris, e seu casamento entediante e infeliz a afunda cada vez mais em uma grande frustração amorosa e sexual até conhecer Laurant (Oscar Isaac), amigo de infância de Camille. Obviamente ambos se tornam amantes e as coisas tendem a complicar quando decidem por fim à vida de Camille para darem continuidade ao romance proibido.

Embora a tentativa seja válida, o filme ainda sofre de grandes problemas comuns de adaptações literarias, principalmente quando estas são de clássicos como esse. Mas ao contrário do que se pode imaginar, nesse filme os problemas não são nem pela falta, mas pelo excesso. Mesmo que a narrativa tente muitas vezes ser bem construída e o desenvolvimento de toda a trama até convincente, se não soubessemos que se trata de uma adaptação de uma obra naturalista de Zola dificilmente nos atentaríamos às características do estilo, e isso acontece principalmente pela falta de uma abordagem com mais nuances e delicadezas por parte do diretor.

A literatura naturalista exige que as ações sejam cruas e diretas, mas essa reprodução exata em uma adaptação cinematográfica chega a ser até abusiva e incoerente já que uma mínima ação se torna grande demais na lente de uma câmera, inumeras vezes maior do que uma sucinta frase em um livro. O diretor segue à risca o estilo na adaptação, mas sua falta de sutileza na construção das cenas oferece um resultado mais forçado do que verdadeiramente real, como o estilo pede. Isso faz com que, de uma adaptação de um clássico sobre uma época específica, o filme se torne contemporâneo como qualquer outro, chegando a causar um impacto menos verdadeiro até mesmo quando comparado a filmes como Infidelidade (Unfaithful, 2002), ou a adaptação da obra de Graham Greene, Fim de Caso (The End Of The Affair, 1999), filmes contemporâneos, mas que abusam da sutileza mais clássica para desenvolver um clima realista e que convença de fato o espectador sobre aquilo que é narrado.

Os diálogos são curtos e diretos, e os personagens definitivamente são produtos do meio em que vivem. Todos são evidentemente figuras que se enquadram dentro do microcosmo social exigido pelo estilo, mas as relações de interesse apenas são explícitas entre Therese, sua tia e Laurant. Observamos a tentativa de sobrevivência dos mais fortes e a opressão dos mais fracos, mas uma das cenas mais interessantes é quando todo o fervor sexual entre os personagens é interrompido por Madame Raquin que pergunta se o barulho que ela ouve é novamente o gato tossindo as bolas de pelo, que, propositalmente ou não por parte do diretor e roteirista, é a referência direta àquilo conhecido como animalização dos personagens, pois são eles agindo na sua forma mais primitiva e instintiva, outra importantíssima característica do estilo.

No livro, o interesse de Laurant por Thereze a princípio é apenas por ele não ter dinheiro para pagar prostitutas (o que não fica claro no filme) e a idéia de matar Camille partiu da própria Therese, e não de Laurant. Mas essas sutis mudanças não pesam muito na trama pois foram bem balanceadas e o grau de vitimização da personagem se mantém o mesmo.

Portanto, mesmo o diretor ter pecado na falta de sutileza, impedindo o espectador de ser convencido da realidade de toda a situação (que é um dos elementos principais do estilo naturalista), consegue ser uma adaptação enxuta e atenta a demais outros detalhes que demonstram os grandes interesses do diretor e roteirista em tentar transpor para a tela um estilo que, mesmo clássico, não envelhece ao tempo, mas também não cabe ter uma linguagem moderna demais.

Não dá pra deixar de notar o talento crescente de Elizabeth Olsen (irmã das sem-talento gêmeas Mary-Kate e Ashley Olsen), que ganhou destaque com o independente Martha, Marcy, May, Marlene (2011) e aos poucos demonstra ser uma das mais importantes de sua geração.

CONCLUSÃO...
Um filme tenso, mas que mesmo baseado em uma obra naturalista e com muitas das características, está longe de ser considerado um filme desse estilo, muito disso por falta da sutileza do diretor e na sua falta de habilidade em manipular essas características, deixando o filme muito mais moderno do que uma adaptação de uma época específica de um clássico, a velha história de que, neste caso, menos poderia seria mais.

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