Translate

domingo, 23 de março de 2014

CONDUZINDO MRS. TRAVERS...

★★★★
Título: Walt Nos Bastidores de Mary Poppins (Saving Mr. Banks)
Ano: 2013
Gênero: Comédia, Drama
Classificação: Livre
Direção: John Lee Hancock
Elenco: Emma Thompson, Tom Hanks, Colin Farrell, Paul Gimatti
País: Estados Unidos, Reino Unido, Austrália
Duração: 120 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Sobre a dificuldade de Walt Disney em conseguir adaptar a obra escrita por P. L. Travers.

O QUE TENHO A DIZER...
O filme é dirigido por John Lee Hancock, o mesmo do filme Um Sonho Possível (The Blind Side, 2009), responsável por dar o Oscar de Melhor Atriz a Sandra Bullock, que foi um sucesso mais pelo seu tema baseado em fatos reais e em pessoas reais ainda vivas do que por outras qualidades. Filme que peca no excesso do melodrama cliché e que, sim, passa uma mensagem bonita e inspiradora, mas por várias vezes faz um copo de açúcar nunca parecer doce o bastante.

Neste filme o diretor peca nas mesmas coisas: a falta de uma direção mais refinada e coerente com a realidade da época. Assim como seu filme anterior, este parece um tanto desatualizado, com alguns enquadramentos antiquados, exagero na caricatura dos personagens e uma tentativa frustrada de contar a história do surgimento de uma das ficções mais apreciadas tanto na literatura quanto no cinema de uma forma lúdica que nunca, nunca convence. Sua direção tenta ser tão segura e correta que erra justamente por ser feita exatamente dentro dos padrões corretos e imaginados, como que seguidos em uma cartilha para novos diretores.

Talvez muito disso tenha sido por conta de ser uma produção da Walt Disney falando de uma história sobre o Walt Disney, mas com todos os pudores e recatos necessários para que seja um filme familiar e publicitário para as novas gerações sobre o quão bom e visionário Walt Disney era como homem e produtor, mas nunca como um homem manipulador, fedido de cigarro, com uma tosse grossa de puro catarro e poderoso o suficiente para conseguir tudo o que materialmente sempre quis.

A verdade é que o filme é irritante... intragável! A figura de P. L. Travers criada por Emma Thompson, além de toda sua história desenvolvida entre eventos presentes e flashbacks, é o de uma personagem esquisita e caricata, cheia de manias e caretas que, além de beirar o insuportável, se torna antiquada na tela e no propósito do filme, tanto que no começo Emma tenta até presenteá-la com algum tique nervoso que não funcionou, e mais ao fim ela tenta utilizar outros que igualmente mais constrangem do que fazem efeito.

A impressão que se tem é que Travers era uma mulher tão excêntrica, tradicionalista, neurótica e difícil de se relacionar que, para se tornar simpática na tela e atrair a empatia do público que fosse assistir o filme seria necessário pintá-la como uma caricatura tal qual foi feita, regada de momentos apelativamente lúdicos e de excesso sentimental para amolecer uma persona e uma história que não parece ter sido tão "levada nas coxas" quanto é demonstrada pelo filme. É como se a própria Disney quisesse recontar a história à sua maneira, deixando a história de verdade de lado para vir à tona uma fantasia criada por ela mesma, de forma idêntica a qual foi feita com Mary Poppins, bonita na tela, mas bastante diferente do que é nos livros.

Pelas informações que é possível encontrar em pesquisas breves sobre a pré-produção do filme, já se descobre que Travers era uma pessoa de personalidade irrefutável, de decisões irreversíveis, que foi responsável por atrasar a produção em dois anos apenas para o desenvolvimento do roteiro, já que uma das cláusulas da venda dos direitos incluia sua participação e aprovação no desenvolvimento da adaptação, ou seja, não entraria uma letra no roteiro que ela não aprovasse. Isso gerou uma grande crise nos bastidores por conta de constantes discussões e desavenças com Walt Disney que em várias situações ameaçaram impedir de uma vez por todas o filme de ser feito.

Não se sabe ao certo como Disney conseguiu dobrar as constantes relutâncias de Travers ao ponto dela assinar a venda dos direitos, mesmo que não concordando com tantas mudanças que a obra sofreu para sua adaptação (incluindo a inclusão de algumas canções dos irmãos Sherman e até mesmo a sequencia de animação), tanto é que a Disney não possui os direitos dos demais 7 livros da série, bem como os livros estão proibidos para qualquer adaptação cinematográfica segundo cláusulas de seu próprio testamento que, até hoje, tem partes de seu conteúdo não divulgado para a mídia, tão forte e pesado que devem ser as requisições.

Tudo bem que a bem da verdade é que nenhum outro estúdio se preocuparia em contar uma história de bastidores que envolvesse Walt Disney, bem como o que o presidente Alan Horn afirmou de que qualquer outro estúdio além da Disney poderia causar grandes danos à imagem e a marca da empresa é compreensível, mas que o filme é uma desnecessária produção... isso é fato.

Não entendo até agora qual foi a inteção dos flashbacks no filme, pois eles só atrapalham mais ainda a história, pois pouco acrescenta ou fundamenta as razões e motivos de Travers ser como é ou as referências que ela tirou da sua vida para colocar em suas obras. Ok, as figuras principais aparecem e são óbvias, mas nada é aprofundado o suficiente, tudo é muito superficial e banal para apelar situações sentimentais ao invés de ser uma biografia verossímil.

Talvez nada mais banal e contraditório quanto a personagem de Emma Thompson afirmar categoricamente que aboliu a cor vermelha de sua vida, enquanto utiliza batom e esmaltes carmin, ou as partes mais interessantes do filme ser entre ela e o chofer vivido por Paul Giamati, o que o nome do filme seria melhor se chamasse Conduzindo Mrs. Travers. E nada mais marketeiro como o "grande confronto" final entre Mary Poppins e Mickey Mouse, em um discurso pra lá de político e disneylândico de Tom Hanks (que está com cara e jeito de "tio da gente", como disse Rubens Ewald). Como se Walt Disney tivesse certeza absoluta naquela época de que Mary Poppins seria tão grandioso e uma referência imediata de várias gerações.

Será mesmo que ele sabia? Pra mim isso é apenas um discurso oportunista que coube bem no propósito do filme.

CONCLUSÃO...
Filme ruim, esquecível, cheio de interpretações caricatas e cafonas, se é que cafonice existe definição. Uma história amenizada que faria Pamela Travers, se estivesse viva, ter tanta vergonha quanto tinha da adaptação de Mary Poppins.

Nenhum comentário:

Add to Flipboard Magazine.