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domingo, 14 de outubro de 2018

DESPERDÍCIO DE TUDO...

★★★★☆
Título: Oito Mulheres e Um Segredo (Ocean's Eight)
Ano: 2018
Gênero: Ação, Comédia
Classificação: 14 anos
Direção: Gary Ross
Elenco: Sandra Bullock, Cate Blanchett, Helena Bonham Carter, Anne Hathaway
País: Estados Unidos
Duração: 110 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Após receber liberdade condicional, uma ladra profissional resolve dar continuidade ao talento familiar quando planeja o furto de um colar de US$150 milhões durante um dos eventos de moda mais conhecidos do mundo.

O QUE TENHO A DIZER...
Steven Soderbergh pode ter se dado muito bem ao fazer o remake de Onze Homens e Um Segredo (Ocean's Eleven, 2001), transformando-o numa franquia de sucesso. Embora Doze Homens (Ocean's Twelve, 2004) tenha sido lançado naquele momento em que o diretor se sentia o rei de Hollywood, fazendo do filme uma reunião particular de amigos, cheio de piadas internas e nada, absolutamente nada interessante para o resto dos espectadores do mundo, ele conseguiu se redimir disso com 13 Homens (Ocean's Thirteen, 2007), que foi exatamente naquela época em que Hollywood começava a dar as costas a ele, mostrando que aquela coroazinha que ele tanto achou que tinha não era mais que um adorno de chocolate que foi bom enquanto não derreteu.

Tanto que hoje Soderbergh é apenas uma mera lembrança de Hollywood. Tentou armar um griteiro em 2014 dizendo que iria se aposentar porque o cinema norte-americano não tinha mais nada a lhe oferecer, ou algo do tipo. Mas voltou atrás ao novamente trabalhar com Channing Tatum em Logan Lucky (2017), e depois com Sharon Stone na fracassada série para a HBO, Mosaic (2017).

Entregando a direção a Gary Ross, ele agora só assina a produção dessa continuação direta de sua franquia, ao mesmo tempo que também é um reboot feminino da série, antes composta em sua maioria por homens famosos e engravatados como George Clooney, Brad Pitt e Matt Damon.

Produzir o filme também não garante as qualidades que Soderbergh tem, pelo contrário, é nítido que seu nome apenas aparece nos créditos para tentar dar ao filme todos os créditos que nele faltam.

A princípio tudo parecia interessante. A proposta do filme com um elenco principal predominantemente feminino, liderado por Sandra Bullock no papel de Debbie Ocean, irmã de Danny Ocean (George Clooney nos filmes anteriores) vinha a calhar numa época em que o movimento feminista no cinema estava a todo vapor.

O problema principal do filme, assim como de sua intenção, é se perder nas situações familiares e politicamente corretas. Isso o fez cair na mesmice de sempre, e tudo aquilo que poderia ser um excelente filme de ação e roubo (o gênero chamado heist), tal qual foram 11 e 13 Homens, se tornou um filme monótono dentro de um cenário feminino comum e batido.

Oras, se dentre várias revindicações femininas, uma delas era o protagonismo de filmes que outrora seriam protagonizados por homens, o filme falha quando novamente as insere em situações típicas da cultura social feminina e do senso comum até machista de que mulheres são movidas por futilidades.

Maquiagens, roupas caras, cabelos estilizados e impecáveis. Marcas famosas e andar de passarela. Escrito por Gary Ross e Olivia Milch, essa é a visão que os roteiristas tem sobre as 8 heroínas da história. A impressão é que assistimos uma versão turbinada de Sex And The City, onde Carrie Bradshaw armaria um grande esquema de vingança contra Mr. Big por tê-la traído.

Mas como se não bastasse tanta esnobação e glamour, o enredo principal, no qual qual Debbie planeja roubar o colar mais caro do mundo do pescoço de uma das mais famosas atrizes durante o Met Gala, aquele famoso evento anual fashionista e beneficente criado por Anna Wintour, a tão temida editora chefe da revista Vogue, se torna apenas uma ironia daquilo que as próprias mulheres tem tanto lutado para se desvincular: a de que os diamantes são sempre seus melhores amigos.

Ok, o cenário e o comportamento comum poderiam não importar caso todo o resto funcionasse. Mas não é o caso. Ao contrário do que aconteceu na franquia de Soderbergh, aqui não existe uma química convincente entre o elenco. As atrizes falham todo instante ao tentar mostrar uma intimidade que não existe, e o roteiro tropeça admiravelmente ao dar uma resolução sentimental, baseada numa vingança amorosa, além de diálogos monossilábicos e onomatopéicos apenas para justificar a presença irrelevante de alguns nomes famosos, como é o caso de Rihanna (péssima como sempre), ou Helena Bonham Carter, que aqui repete o papel da típica esquisitona que costuma ser na vida real, dando a sensação que mais aceitou o papel para pagar as contas do que por verdadeiro engajamento. E essa situação um tanto desconfortável que vemos na tela cria, sem querer, uma competitividade entre as atrizes que não cabe.

As situações desconexas não convencem que aquele bando de personagens desajustadas conseguiriam dar conta de realizar um dos maiores golpes em meio a um evento tão conhecido e segurado por tecnologia de ponta e equipes altamente treinadas. Tudo bem que pouco importaria o plano, ou pouco importaria a forma de realizá-lo, ou que ignorar os absurdos é quase uma obrigação na série, mas enquanto Soderbergh conseguia distrair o espectador dos defeitos dando ênfase no charme natural do elenco, na química entre eles e no bom humor quase que improvisado, aqui Gary Ross se importa apenas na ênfase da beleza maquiada, acentuando a monotonia e abolindo qualquer resquício de graça ou irreverência que qualquer atriz pudesse ter.

Embora Bullock e Cate Blanchett sempre roubem as cenas por, sem dúvida, serem os maiores nomes do elenco e terem uma presença naturalmente imponente frente as câmeras, é impossível deixar de acreditar que seja o filme mais fraco da carreira de ambas quando os créditos finais aparecem. Estão visualmente desinspiradas, um tanto decepcionadas entre aquilo que parecia uma excelente proposta com aquilo que se tornou o filme de fato, mas que tiveram que seguir até o fim por questões contratuais.

Se ao menos a edição fosse um pouco mais dinâmica, como são os filmes de Soderbergh, se o mesmo formato narrativo com sobreposição e recortes de imagem tivesse sido usado, e o tempo do filme não fosse tão errado, talvez nada soasse tão arrastado ou uma mera tentativa de alguma coisa como ele é.

É aquela sensação de sabotagem que vez ou outra temos, uma impressão de que algo propositalmente errado sempre é feito no meio daquilo que poderia dar muito certo para que o filme seja vendável, mas não se torne memorável para não fortalecer uma idéia.

No caso, a idéia de que um elenco feminino poderia ter feito algo definitivamente melhor.

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