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segunda-feira, 19 de novembro de 2012

"AS LOIRAS SÃO AS MELHORES VÍTIMAS"

★★★★★
Título: The Girl
Ano: 2012
Gênero: Biografia, Drama
Classificação: 14 anos
Direção: Julian Jarrold
Elenco: Toby Jones, Sienna Miller, Imelda Staunton, Penelope Wilton
País: Reino Unido
Duração: 90 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Conta a história da relação obsessiva que Hitchcock desenvolveu com e a atriz Tippi Hedren, sua última garota loira.
O QUE TENHO A DIZER...
Por alguma razão 2012 é o ano de Alfred Hitchcock, já que dois filmes sobre o famoso mestre do suspense foram produzidos: The Girl e Hitchcock.

The Girl conta a história da relação obsessiva que Hitchcock desenvolveu com Tippi Hedren, protagonista de Os Pássaros (The Birds, 1963) e Marnie, Confissões de Uma Ladra (Marnie, 1964).

Hitchcock será lançado em dezembro nos cinemas e contará a história dos bastidores de um de seus maiores e mais relembrados clássicos, Psicose (Psycho, 1960).
Mas The Girl é um daqueles filmes que perdem uma grande oportunidade de ter um roteiro melhor desenvolvido e uma produção mais caprichada para ser lançado nos cinemas e, por isso, são lançados diretamente para a TV, pois a excentricidade de Hitchcock deixou de ser uma grande lenda para se tornar um fato real que ainda espera oportunidade para ser dignamente adaptada.
A história do filme é baseada no livro Spellbound by Beauty: Alfred Hitchcock and His Leading Ladies (2008), do biógrafo Donald Spoto, em que o autor conta a importância das mulheres loiras nos filmes do diretor e suas relações com ela ao longo de sua carreira. Atrizes que desempenharam muito mais do que papéis de protagonistas de seus filmes, mas de heroínas complexas e fatais que se tornaram musas do cinema em suas mãos, tal qual foram Ingrid Berman, Grace Kelly, Kim Novak, Janet Leigh e Tippi Hedren, apenas para citar algumas, e que Hitchcock nunca escondeu sua paixão por elas e de que foi ele o responsável pelo ícone que elas se tornaram.
Para quem conhece apenas as obras desse grande diretor e pouco (ou nada) sobre sua vida, ficará um tanto surpreso ao ver nesse filme que por trás daquela imagem icônica podia existir um homem perturbado em suas obsessões sádicas e misóginas, segundo os relatos de Tippi. "Um gênio incomum, mal e desviante, quase ao ponto perigoso por causa do efeito que ele poderia ter sobre as pessoas", como ela mesma afirmou esse ano em uma entrevista, e que, mesmo aos 82 anos, ainda acusa o falecido diretor de assédio sexual (algo que ela veio a fazer apenas há alguns anos, depois que qualquer provável testemunha já havia falecido).
O filme começa com a frase clássica de Hitch: "As loiras são as melhores vítimas. Elas são como pegadas de sangue reveladas na neve virgem", e logo na cena seguinte percebe-se que o filme será salvo de qualquer desgraça pela interpretação de Toby Jones. E infelizmente o ator mais uma vez perde a oportunidade de ter seu talento reconhecido como se deve. Em 2006 sua performance no filme Confidencial (Infamous) no papel do escritor Trumpan Capote foi praticamente ignorada por conta do filme ter sido lançado posteriormente ao ovacionado Capote (2005), produção que tratava do mesmo tema e pelo qual Philip Seymour Hoffman ganhou o Oscar de Melhor Ator, além de inúmeros outros prêmios, enquanto Toby nem ao menos fora citado em resenhas (eu, particularmente, considero Confidencial muito mais interessante). Novamente Toby Jones cai na mesma armadilha, interpretando brilhantemente Hitchcock, mas que será ignorado por ser um filme barato e feito para a televisão, enquanto Anthony Hopkins com certeza colherá os louros por sua interpretação no filme a ser lançado em dezembro nos cinemas.
Irreconhecível por conta de uma maquiagem forçada, mas compensada por uma caracterização sólida, Jones não apenas convence ao ponto de esquecermos que é uma atuação, mas também transpõe de forma bastante eficiente todos os maneirismos e excentricidades da figura manipuladora, pequena e forte de Hitchcock e que posteriormente se transformou na caricatura que hoje conhecemos. Tudo é válido, já que Toby é uma figura pequena, franzina e frágil na vida real. Sienna Miller também desempenha um papel importante na qualidade do filme, já que a biografia da atriz também se assemelha bastante com a de Tippi Hedren, da modelo que se tornou atriz e conseguiu provar o contrário do que o esteriótipo pré concede. Não que ambas sejam excelentes, mas funcionam quando bem dirigidas. O fato aqui é que não houve boa direção, e o pouco que funciona é por responsabilidade dos próprios atores.

Mesmo reproduzindo algumas cenas clássicas de Os Pássaros e Marnie por um ponto de vista de bastidores, o filme peca na falta de uma fotografia ou uma produção de arte caprichada e que nos transportasse realmente para a década de 60, em um excesso de tomadas internas e que limitam os cenários para poupar o filme de detalhes. Ele também não entra muito em questões que justifiquem o comportamento obsessivo de Hitch além de justificá-lo subliminarmente como um amor mal correspondido ou uma tentativa de sutilmente vitimizá-lo como um homem inteligente, mas não atraente.
Esse lado mais obscuro do diretor inglês é um assunto recente bastante contraditório e polêmico. Muita gente tem dificuldade em aceitar pela falta de testemunhos e por conta de inúmeros documentários que apenas o retrataram como um homem de humor negro e um gênio do cinema esnobado pela Academia de Hollywood, e por isso os defeitos do filme surgem quando a história adentra na obsessão psicológica e sexual do diretor por Tippi. Se há verossimilhança ou não, a pequena polêmica que esse filme gerou foi de comentários que expressam o fato de que Tippi nunca perdoou Hitchcock por ter "destruído" sua carreira de atriz como retaliação por ela recusar seus assédios, já que o diretor era bastante influente na indústria e, posteriormente a Marnie, Tippi foi praticamente esquecida. No filme há um momento em que o diálogo de Hitchcock a ela é exatamente sobre o fato de que ele foi o responsável pelo sucesso e reconhecimento que ela alcançou, e  por isso ela deveria ser conivente com qualquer situação. O que acho perverso é que, nos comentários leigos sobre o filme, as pessoas têm usado isso como justificativa, como se isso desse razão a qualquer abuso que ela tenha ou não sofrido, o que pra mim é um verdadeiro absurdo tal qual tentar convencer que uma mulher consente um estupro.
Portanto, certamente o filme falta de uma pesquisa mais sólida, já que a própria atriz Tippi Hedren afirmou que em nenhum momento foi consultada pelo diretor Julian Jarrold durante a produção do filme, e que toda a pesquisa sobre sua pessoa foi feita espontanemanete pela atriz Sienna Miller. Além disso também há a relação pouco explorada entre Hitch e sua mulher, Alma, que foi uma figura bastante importante na carreira do diretor. Inclusive, a participação das excelentes atrizes Imelda Staunton e Penelope Wilton é completamente ignorada em personagens que nem deveriam ter existido se fossem pra ser mal colocadas como nesse roteiro bastante esburacado.

A questão é que não há uma pessoa viva para contestar ou afirmar que a história de Tippi seja verdadeira, e o filme se transforma em um boato mal feito, o que é uma pena, já que ele conta com excelentes atuações, mas é vago e bastante superficial perto de situações complexas pelas quais Hitchcock aparentava submeter ou manipular as pessoas ao seu redor.
CONCLUSÃO...
Se não fosse pelas atuações, além de um filme para a televisão, também seria esquecível. Mesmo assim é um material interessante como uma introdução à complexidade de idéias e sensações que era Alfred Hitchcock, surpreendendo sem chocar, sendo talvez essa a inteção, mas que resulta em tom superficial e subaproveitado que ao invés de convencer soa como uma mentira mal contada.

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