Translate

terça-feira, 11 de setembro de 2012

SEMPRE DÓI COMO A PRIMEIRA VEZ...

★★★★★★★★
Título: Namorados Para Sempre (Blue Valentine)
Ano: 2010
Gênero: Drama, Romance
Classificação: 16 anos
Direção: Derek Ciafrance
Elenco: Michelle Williams, Ryan Gosling
País: Estados Unidos
Duração: 112 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Sobre um casal que tenta sobreviver e manter um relacionamento falido, fracassado por anos de falta de compreensão e entendimento.

O QUE TENHO A DIZER...
Já vimos a traição e suas consequências em Fim de Caso (The Enf Of The Affair, 1999) e no desesperador Infidelidade (Unfaithful, 2002); o nascimento da paixão e do amor como em Antes do Amanhecer (Befor Sunrise, 1995) e Antes do Pôr do Sol (Before Sunset, 2004); a aceitação das diferenças em 2 Dias Em Paris (2 Days In Paris, 2007); o amor e o peso da rejeição em Amantes (Two Lovers, 2008); ou até mesmo a angustiante tentativa de reconstrurir uma vida após o fim de uma relação no mais recente Lola Versus (2012). O amor, a traição, o desejo e a separação. Desde sua forma mais pura até a mais trágica ou banal possível, pelo ponto de vista cômico ou dramático. O romance já foi visto e revisto de todas as formas possíveis no cinema em uma lista indefinível, e o sofrimento nunca é novidade, mas mesmo assim dói como se fosse a primeira vez.

Nesse filme dirigido e escrito por Derek Ciafrance, a história não poderia ser diferente, e mesmo moderna, não foge daquilo tudo que já conhecemos, até mesmo porque é baseado em experiências pessoais do próprio diretor, que trabalhou no filme durante 12 anos, desde o primeiro roteiro escrito até a pós-produção e distribuição.

Namorados Para Sempre foi lançado no Brasil no final de semana do Dia Dos Namorados de 2011. Digamos que foi uma tática bastante enganosa e traiçoeira da distribuidora na tentativa de vender o filme no país, sendo divulgado como um romance típico para essa data. Com certeza fez muitos casais novos sairem engolindo seco do cinema, ou casais em situações parecidas chegarem a um fim de fato, pois está longe de ser um romance leve e seu título em português tem absolutamente nada a ver nem com a proposta e muito menos com a resolução da tragetória dos personagens Dean (Ryan Gosling) e Cindy (Michelle Williams). Com o custo de apenas US$1 milhão recebido como prêmio por seu roteiro ter ganho um concurso em 2006, acabou arrecadando mais de US$12 milhões no mundo. Chamou modestamente a atenção da mídia, e conseguiu até uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz para Michelle Williams.

Com certeza é uma grande história de amor, mas a parte romântica, bonita e muitas vezes utópica se mostra apenas como uma vaga lembrança nas memórias de um casal que, no presente, vive um drama cujos níveis de tolerância atingiram o ápice da falta de comunicação e agora caminham para a inevitável dissolução. Freud dizia que os filhos tendem a reproduzir os erros dos pais e que há uma perpetuação de ações e conseqüencias por conta disso de maneira inconsciente. Isso é notável na história quando Cindy, em uma conversa com sua avó, confessa seus desejos de que ela não seja como seus próprios pais, que vivem um casamento sem respeito e com um amor que não existe mais. Logo seguida vemos o presente dos personagens princiais, frio e despido de qualquer sentimento por parte de Cindy.

A distinção da instituição familiar entre o tempos antigo e contemporâneo fica explícito no filme neste paradoxo. Enquanto seus pais viveram juntos na tristeza e na felicidade, na doença e na saúde, na riqueza ou na pobreza até que a morte os separassem, Dean e Cindy viveram juntos por apenas 5 anos, tempo suficiente para todo o amor despertado, o companheirismo e a felicidade do início secarem e desaparecerem pelo acúmulo de problemas e da constante falta de soluções. Segundo o filme, essa bola de neve é o comodismo e a consideração diária que se transformam naturalmente em hábitos do cotidiano, a falta de paciência, de honestidade e compreensão, como se fossemos obrigados a conhecer um ao outro em sua plenitude para satisfazer desejos e vontades sem mais a necessidade do respeito, apenas do convívio e das obrigações, interrompendo o ciclo do aprendizado e do conhecimento mútuo, tornado-se algo automático e insensível, uma tortura diária que poderia ter sido evitada com pequenas atitudes, em algum momento, em alguma época.

A instituição familiar hoje em dia é considerada falida justamente pela exposição desses defeitos perpetuados e que hoje se tornaram intoleráveis e se transformaram em gritos de liberdade para muitos. Mas se essa quebra de paradigmas também será responsável pela transformação dos padrões e da reincidência dos erros dos pais pelos filhos, isso já é uma dúvida deixada pela história quando Cindy diz ter tomado esta decisão pensando em sua filha, de que ela prefere o fim ao invés de optar por vê-la crescer em um ambiente hostil.

O filme consegue ter semelhanças com as comédias românticas de Richard Linklater e Julie Delpy por seguir essa tendência realista e questionadora em diálogos e situações improvisadas, mas por um ponto de vista mais dramático e fatalista. Ryan Gosling e Michelle Williams atuam de maneira convincente como exemplos reais graças não apenas à competência dramática, mas também pelo laboratório desenvolvido pelos dois e pela direção de Derek Ciafrance.

Durante o período de filmagem, ambos alugaram uma casa na qual conviveram e viveram juntos por um mês, mantendo e se alimentando com a mesma renda que os personagens viveriam na história, agindo como se o casal fictício fosse real. Como não existia uma relação de fato entre eles, as situações de conflito naturalmente surgiam com facilidade. Ciafrance dava orientações contraditórias a cada um dos atores sem que eles soubessem, na intenção de catalisar esses conflitos. Para Williams, orientou que ela sempre tentasse manter distância e se livrar de Ryan Gosling, seja deixando o cômodo onde estivessem ou quebrando argumentos, como a fugir das situações. Para Ryan Gosling o diretor instruiu o contrário, para que ele sempre argumentasse a favor de ambos e a mantesse perto a todo custo. O diretor também chegou a dizer que houve uma situação em que ele insistiu para de Gosling entrasse no quarto onde Williams estava e insistisse que ambos fizessem sexo. Williams recusou e o expulsou do quarto, em uma atitude repreensiva e impassível tal qual sua personagem. O resultado não podia ser melhor, e essa relação difícil e desastrosa acaba soando bastante familiar com casos reais que constantemente presenciamos, ou até mesmo vivemos, sendo um choque com a realidade, nos levando a refletir sobre aquilo que almejamos, o que é a cumplicidade e o que é que acontece dentro de nós que não conseguimos impedir os mesmos erros e evitar a catarse.

CONCLUSÃO...
Ao contrário do que pode parecer, não é uma comédia romântica e muito menos um filme para ser visto por casais que não conseguiriam manter discussões saudáveis sobre os temas abordados. Pelo contrário, é um filme denso sobre as realidades e divergências amorosas que poderiam ser reorganizadas e tratadas, mas por razões indefinidas não conseguimos.

Nenhum comentário:

Add to Flipboard Magazine.