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terça-feira, 31 de janeiro de 2012

FIQUEM COM A VERSÃO SUECA!

★★★
Título: Os Homens Que Não Amavam As Mulheres (The Girl With The Dragon Tattoo)
Ano: 2011
Gênero: Drama, Policial, Suspense
Classificação: 16 anos
Direção: David Fincher
Elenco: Daniel Craig, Rooney Mara, Christopher Plummer, Robin Wright, Stellan Skarsgard
País: Estados Unidos
Duração: 156 min.

SOBRE O QUE É O FILME?
Sobre um jornalista que, ao ser contratado para investigar o desaparecimento de uma mulher há 40 anos, acaba se deparando e sendo auxiliado por uma hacker introspectiva e anti-social que não apenas sabe muito mais do que ele imagina como também tem segredos e um passado violento.

APENAS UM PARÊNTESES...
Para aqueles que não sabem, este filme é uma adaptação norte-americana da primeira parte da trilogia de livros sueca, Millennium, do autor Stieg Larsson. A trilogia já foi adaptada para o cinema pelos diretores suecos Niels Arden Oplev e Daniel Alfredson em 2009, o que faz dessa versão também um remake. A trilogia de livros fez muito sucesso no mundo, e os filmes principalmente na Suécia. Mas o autor não pode presenciar isso, já que ele veio a falecer por problemas cardíacos pouco tempo depois de ter finalizado o terceiro livro. A intenção de Stieg Larsson era de que Millennium fosse uma série de livros muito maior e não apenas uma trilogia, tanto que, após sua morte, foram encontradas anotações e esboços de histórias seguintes, parece até que o quarto livro já havia sido começado. A trilogia original sueca, após ter sido lançada no cinema, foi relançada como mini-série televisiva com as versões extendidas dos filmes, contendo cenas e seqüencias que ficaram fora das versões que passaram nos cinemas. Para se ter uma idéia, a versão extendida do original sueco deste filme possui 182 minutos. Stieg chegou a afirmar que a personagem principal da trilogia, a heroína Lisbeth Salander, foi inspirada em uma garota, também chamada Lisbeth, que ele viu ser violentada e morta quando pequeno e, sem poder ter feito nada, aquela memória ficou muito presente em sua vida. Foi então que não apenas a personagem nasceu, mas também os livros.

O QUE TENHO A DIZER...
A versão norte-americana saiu exatamente como eu esperava desde quando publicaram a notícia de que ele estava em produção. A versão de David Fincher sem dúvida é mais leve, limpa e bonita do que a versão sueca de Niels Arden Oplev, e essa é a gigante diferença entre as duas produções, e também é a gigante diferença entre o que é produzido em Hollywood e o que é produzido fora de lá.

Meus comentários sobre o filme é APENAS sobre o filme em si e não como uma adaptação, então não importa no momento qual foi a adaptação mais fiel ao livro ou não, mas ao invés disso, qual deles tem um melhor desenvolvimento já que os dois usam exatamente a mesma fonte. E para ser sincero, eu poderia escrever um livro ou uma tese de mestrado só pontuando os defeitos da versão norte-americana, mas vou tentar não ser tão duro quando eu deveria.

Infelizmente este não é um caso como, por exemplo, do filme Capote (2005) e o similiar Confidencial (Infamous, 2006), no qual ambos contam a mesma história, mas sobre pontos de vista diferentes, já que esses dois filmes contam a respeito do mesmo período em que Truman Capote escrevia sua grande obra, A Sangue Frio. No caso, este remake norte-americano nada mais é que apenas e unicamente mais um dispensável produto, assim como dezenas de outras adaptações hollywoodianas de filmes estrangeiros muito melhores nas suas versões originais.

Admiro muito David Fincher, sinceramente. Ele fez excelentes trabalhos que se transformaram em referência. Deu também outra dimensão a um gênero que estava estagnado, recriando de certa forma a fórmula de serial killers, fazendo a palavra "suspense" ganhar outra profundidade em filmes como Se7en (1995), Clube Da Luta (Fight Club, 1999) e até mesmo O Quarto Do Pânico (Panic Room, 2002), filmes que mudaram a forma como o gênero passou a ser produzido desde então. Por essa razão, fazer uma versão americana do livro de Stieg Larsson (ou um remake da versão sueca, como preferir) ficou um pouco vago nas mãos habilidosas de David Fincher. Talvez o motivo para isso seja pelo fato de este ser o único suspense policial realmente interessante a ter surgido após Se7en e ser tão bom quanto ele (se não for melhor).

Não há grandes diferenças no desenvolvimento da história entre ambos, mas há uma grande diferença técnica. É impossível evitar comparações porque não é simplesmente uma disputa entre um filme de baixo orçamento versus um filme de grande orçamento, estamos falando de arte e da capacidade de transformar um livro complexo em um filme que não soe banal. Em uma mão temos a versão sueca que, apesar de seu baixo orçamento (custou em torno de US$13 milhões), é parte de uma bem escrita, produzida e dirigida trilogia de sucesso (arrecadou mais de US$100 milhões no mundo). Na outra mão temos apenas uma garrafa de água cara (custou US$90 milhões e arrecadou US$232 milhões no mundo, sem descontar os gastos de promoção).

A versão sueca não teve medo de ser chocante, e como disse antes, a versão americana é mais leve, acessível e também mais didática, feita para aqueles que não gostam de pensar muito enquanto assistem um filme com uma temática um pouco mais complexa, como disse um comentário que li sobre o filme: Hollywood emburrece as coisas, fazendo tudo ser mais acessível e de fácil digestão para uma criança de 10 anos.

O filme original é muito mais elaborado, dando atenção apenas aos fatos mais importantes do livro, conectando as diferentes tramas existentes de forma eficiente do começo ao fim em uma história redonda que se desenvolve sem esforços em um roteiro bem elaborado e detalhado, uma edição precisa e uma direção que entendeu perfeitamente a fonte do trabalho e o que fazer. Da mesma forma sobre as atuações. Rooney Mara e Daniel Craig fizeram um bom trabalho, ambos são os mais próximos daquilo que teríamos de Lisbeth e Mikael caso Noomi Rapace e Michael Nyqvist, da versão sueca, nunca tivessem existido. Rapace e Nyqvist mostram uma química que nunca acontece entre Craig e Mara na versão norte-americana.

A cena de abertura da versão de David Fincher é incrívelmente desnecessária e que nos dá a falsa impressão de que o filme será tudo o que não é. Ele chegou a afirmar que a abertura é justamente a forma como ele conseguiu expressar o que se passa dentro da cabeça de Lisbeth, o que é bastante efetivo para um video clip da versão de Trent Reznor e Karen O de "Imigrant Song", do Led Zepellin. Para mim a abertura foi simplesmente uma forma de complementar e desculpar a audiência da falta da chocante audacidade, crueza e realismo de uma personagem que foi muito bem explorada na versão sueca. Até mesmo a tatuagem dela está mais sutil, ou melhor dizendo, esquecível. A imagem de Lisbeth na versão sueca é incômoda, suja, fedida a cigarro e que desperta preconceitos porque contém nela todos os elementos da agressividade da cultura punk e é essa a forma como a personagem se comunica. Na versão norte-americana isso só acontece na apresentação da personagem, no resto do filme isso é descartado e ela simplesmente se transforma em uma mocinha mal vestida com um cabelo mal cortado.

Fincher também chegou a dizer várias vezes que ele não assistiu a versão sueca, mas há cenas tão similares entre os dois filmes que chamá-las de IDÊNTICAS não seria exatamente uma ofensa. Parece que Fincher fez algumas mudanças aqui e alí apenas para dizer que é diferente e chamar aquilo de seu. Ok, então vamos acreditar que o que ele afirmou é verdade, neste caso ele deveria ter assistido a versão sueca para saber como o filme deveria ter sido feito de verdade.

Enquanto a versão de Niels Oplev é tensa e mantém a atenção do começo ao fim por eventos e subtramas que estão amarradas de forma brilhante e nunca esquecendo da importância dos dois personagens, a versão de Fincher é tediosa e a cronologia da trama é disconexa. A forma como ele mostra como Lisbeth e Mikael se conectam um com o outro é muito superficial e parece tão sem importância que se há algo ele conseguiu fazer muito bem nesse filme foi transformar Lisbeth em uma coadjuvante qualquer, além do fato dele revelar todos os detalhes errados em todos os momentos errados, efetivamente destruindo qualquer mistério ou suspense da história. Há uma cena em particular na qual Lisbeth e Mikael fazem sexo. A forma como isso acontece na versão sueca é muito mais dura, seca e direta, em um lugar sujo e desconfortável. Na versão norte-americana rola até uma troca de olhares, uma paquera, um sorriso e uma paixão numa cama macia com lençóis de algodão. É uma das cenas mais simbólicas descritas no livro, já que é o momento que vemos quem Lisbeth realmente é e o que sente, e definitivamente quando ela resolve agir e pensar como um homem. Ficou evidente que Fincher não sabia o que estava fazendo.

Os dois filmes também são muito longos, mas a narrativa e a dinâmica da versão sueca prende a atenção ao ponto de não perceber que o filme dura 2 1/2 horas, enquanto na versão norte-americana, quando você dá graças a deus por ter acabado, não acabou, tem ainda um bom pedaço pela frente.

Fiquei completamente desapontado com a versão de Fincher, principalmente porque vem recebendo mais atenção que a versão original. Não havia razões para a existência desse remake já que não há algum grande ou relevante ponto de vista em momento algum. Uma grande perda de tempo e dinheiro, uma vergonhosa e mal feita cópia da versão sueca. O mais revoltante é que a versão de Fincher será mais popular e ainda chamada de original, acredite.

Aqueles que estão chamando o filme de "maravilhosa adaptação" ou "o melhor filme do ano", certamente não assistiram a trilogia sueca, ou não se importaram com isso. Esse filme só me fez pensar em como o remake de Psicose (Psycho, 1998), de Gus Van Sant, agora parece tão bom.

CONCLUSÃO...
Se eu visse alguém na locadora segurando esse filme, eu tiraria na hora, e colocaria a versão sueca no lugar.

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