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terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

COMO O OSCAR CONSEGUE SER CONSTRANGEDOR...

Nas previsões que realizei nas categorias principais, só errei no prêmio de Melhor Diretor. Ao invés de ter ido para Spielberg, o prêmio foi com grande surpresa a Ang Lee. Foi um choque, pois a predileção era Spielberg na falta de Ben Affleck na categoria.
 
Mas o que falar do show do Oscar?
 
A cada ano que passa ela se torna uma festa mais degradante. O último grande sopro de novidade aconteceu em 2007, seis anos atrás, quando Ellen Degeneres foi convidada para ser apresentadora do evento. Tentando sair do óbvio e fazer da festa algo interessante e glamuroso sem precisar ser quadrado, ela ousou dentro dos limites, conseguindo ser engraçada, delicada e genuína, deixando de lado a grosseira ou o excesso de sarcasmo, da autodepreciação e do constrangimento alheio, coisas demasiadamente absurdas que viraram marcas registrada daquilo que eles consideram "o maior evento do cinema mundial".
 
2008 tentou ser interessante com Jon Stewart, que foi um pouco mais político, alfinetando aquilo que deveria, mas dentro de seu senso de humor ácido. Hugh Jackman, em 2009, foi um verdadeiro host, um lord, mas os exageros da Academia deixaram a festa mais cafona do que já ousou um dia ser ao extrapolarem na medida de provar que Jackman é um homem multitalentoso. Depois tivemos Alec Baldwin com Steve Martin (ahn?!), James Franco e Anne Hathaway (o pior dos piores anos), Billy Crystal (chato e cansativo como sempre), e quando achamos que nada poderia ficar pior, tivemos Seth MacFarlane.
 
MacFarlane, um desconhecido comediante pra grande maioria, ficou famoso por ter escrito e dirigido o filme mais politicamente incorreto dos últimos anos, Ted (2012). E foi com essa presunção em mente que ele achou que iria conquistar o público de igual forma. A diferença é que ele não imaginou que quem é engraçado é o personagem de boca suja que bebe, fuma, arrota e fala palavrão, e não ele.
 
A cerimônia já começou constrangedora. MacFarlane atirou para todos os lados e não poupou esforços em ser desagradável com piadas desnecessárias, que ultrapassavam o politicamente incorreto no humor americano mais baixo, gratuito, vazio e grosseiro que pudesse existir. Pintou um personagem de si próprio que precisaria descobrir a fórmula perfeita para receber a aprovação do público, ironizando o tempo todo. Se autocriticou incansavelmente, minou ele mesmo e reverteu qualquer futura crítica negativa em piada, uma boa jogada para ter liberdade de fazer tudo que é ruim sem ser apedreijado, como até mesmo cantar uma música chamada "We Saw Your Boobs" (Nós Vimos Seus Peitos) em altos brados, numa das esquetes musicais mais vergonhosas de todos os 85 anos da premiação. Na música o (dito) "comediante" dizia que todos nós já vimos os peitos de diversas atrizes, citando várias delas que estavam na platéia, bem como os filmes em que isso acontece. Eles fizeram uma montagem que fingia o constrangimento de Naomi Watts e Charlize Theron, mas isso não deve ter sido mentira com as demais, frente a recepção fria que a platéia teve.
 
Suas piadas foram um fiasco, apenas uma meia dúzia de gargalhadas forçadas eram ouvidas e as palmas da platéia vinham justamente de um meio centro apropriadamente ensaiado para enganar o espectador caseiro. Tudo isso para posteriormente ele vestir uma imagem de apresentador comum e que não conseguiu nem ao menos ser carismático. Ou seja, parece não existir mais um grande entertainer para a festa como um dia já existiu, ou textos inteligentes o bastante para serem engraçados, ou até mesmo situações irônicas sem a necessidade de pisar nos dedos de ninguém ou chamar o espectador de imbecil, porque é essa a impressão que eu tenho nos últimos 10 anos que venho assistindo. Uma sucessão de erros que todos enxergam, mas não fazem questão de mudar.
Uma das maiores reclamações da cerimônia sempre (e SEMPRE) foi sua interminável duração, tanto que há aproximadamante 10 anos (ou um pouco mais) as apresentações musicais foram gradualmente cortadas, pois eram exaustivas, principalmente na época em que Disney enchia seus desenhos de canções e dominava o gênero. Esse ano resolveram esquecer de tudo isso, e sem uma razão muito óbvia resolveram homenagear e enaltecer os musicais modernos (apenas os poucos três mais relevantes dos últimos 10 anos), com direito a reapresentação de alguma cenas memoráveis nos palcos pelos atores que as fizeram nas telas, incluindo o repeteco desnecessário de Catherine Zeta-Jones no seu já esgotado All That Jazz, de Chicago (2002). Ao todo foram umas 10 apresentações musicais, e o Oscar, que agora mais parece um MTV Awards de gala, resolveu vestir uma fantasia Grammy, tentando explorar a popularidade de Adele e o sucesso de um tema de James Bond que não se tinha desde... nem eu sei quando! E o mais engraçado é que, tudo isso, numa época em que ninguém mais se interessa por musicais no cinema. Então... qual o motivo de tudo isso? Falta de idéias? Onde está a coerência?
 
Uma lástima.
 
Mas, se por um lado foi um show mais uma vez cansativo, longo, chato e constrangedor, por outro tivemos grandes surpresas como a apresentação arrebatadora de Shirley Bassey, que aos 73 anos ofereceu uma performance aplaudida em pé, colocando Adele no seu devido lugar, que mesmo ganhando o prêmio de Melhor Canção da noite por Skyfall (e que nem merecia tanto assim) não recebeu mais do que medianos aplausos em um misto de lágrimas e desdém. Ela nem sequer ousou agradecer as demais divas que ocuparam o mesmo lugar nesses 50 anos de existência do espião, e que, como Rubens Ewald disse, se tornou uma marca da série e um estilo de música próprio: "as músicas de James Bond". Também tivemos outras coisas boas como Barbra Streisand e um discurso breve e emocionante de Christopher Plummer às atrizes coadjuvantes.
 
Foi um ano competitivo como há muito não se via, onde não houve favoritismo a ninguém e os prêmios foram muito bem divididos entre os filmes. Também não houve grandes injustiças como em anos anteriores, com excessão da predileção de Jennifer Lawrence ao invés da francesa Emmanuele Riva. Não que a jovem atriz não merecesse, mas o histórico e o grande desempenho da atriz francesa merecia uma melhor consideração, uma consideração que ela mesma pareceu não conseguir entender em não ter tido.
 
No mais tudo seguiu como planejado tal qual Anne Hatthaway receber o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante, ou a Primeira Dama Michelle Obama participar da entrega do prêmio de Melhor Filme naquilo que eu já havia dito e de certa forma previsto em posts anteriores sobre a atual necessidade da cultura norte-americana se enaltecer com pouco, numa época em que essa nação está às mínguas, e em um ano em que o cinema e os interesses políticos nunca estiveram numa polêmica tão forte. De um lado tinhamos A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty, 2012), que colocou em risco a imagem e a dignidade do serviço de inteligência do governo dos EUA. Por outro lado tinhamos Argo (2012), que pintava uma imagem excitante e patriotista do mesmo país. Houve também a surpresa da premiação de Ang Lee receber como Melhor Diretor, quando ele era o menos cotado a receber o prêmio em um ano que tinha tudo para ser de Spielberg se não fosse de Ben Affleck.
 
Novamente não foi um ano em que foi possível dizer que passar 4 horas assistindo uma premiação foi a melhor programação da noite de um domingo, mas foi um ano competitivo e de certa forma um dos mais ecléticos pelo ponto de vista da premiação, a grande pena é que nada disso caminhou com coerência em um espetáculo mais uma vez constrangedor e que mais irritou do que entreteve.
 
Para ver a lista completa de vencedores, clique AQUI.


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